terça-feira, 30 de setembro de 2008

JOGO DE FORTUNA E AZAR

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 03-06-2008
Processo: 421/08-1
Relator: JOÃO GOMES DE SOUSA

Sumário:

Existe fundamento ético-social para o sancionamento penal do jogo de azar.
Os critérios da “sorte” (que deve ser restritivamente interpretado) e da “oferta ao público” não servem para a delimitação dos tipos penal e contra-ordenacional de jogo.
O que está em causa nos “jogos de fortuna ou azar” é a aposta, o ganho, o prémio. A perspectiva de, apostando pouco, ganhar muito. Por isso se chamam “jogos de fortuna ou azar”. Fortuna para o ganho (existência de prémio). Azar para a perda (ausência de prémio).
A distinção entre os ilícitos deve fazer-se com recurso aos critérios da “natureza do prémio” atribuído ou atribuível e, também, da “natureza do jogo” praticado.
A natureza da máquina utilizada é irrelevante enquanto critério jurídico distintivo e reduz-se à sua natureza de “facto” determinante para apurar da natureza do prémio atribuído ou atribuível e para saber se o tema por ela desenvolvido se insere na previsão do artigo 4º do diploma, isto é, para apurar os factos pertinentes ao critério da natureza do jogo.

Concurso/Penas Suspensas/Penas Extintas/Período de suspensão já findo/Lei mais favorável: aplicação retroactiva

Acórdão do S.T.J., de 25-09-2008
Processo: 08P2818
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SANTOS CARVALHO
Nº do Documento: SJ200809250028185


Sumário :
I - No concurso superveniente de crimes (art.º 78.º do CP), nada impede que na formação da pena única entrem penas de prisão efectiva e penas de prisão suspensa, decidindo o tribunal do cúmulo se, reavaliados em conjunto os factos e a personalidade do arguido, a pena única deve ou não ficar suspensa na sua execução.

II - As penas suspensas anteriores que já tiverem sido declaradas extintas nos termos do art.º 57.º, n.º 1, do CP, não são de considerar na formulação da pena única, sem prejuízo de desconto de prisão preventiva neles eventualmente sofrida (art.º 78.º, n.º 1, do CP).

III - O período de suspensão tem hoje (após a Lei 59/2007), duração igual à da pena de prisão determinada na sentença, mas nunca inferior a um ano, a contar do trânsito em julgado da decisão (art.º 50.º, n.º 5, do CP).

IV - Por força do art.º 2.º, n.º 4, do CP é de aplicar retroactivamente a lei penal mais favorável para o arguido, caso o período de suspensão fixado anteriormente exceda o previsto agora como limite máximo.

V - Não são de considerar no cúmulo superveniente de penas as que tenham sido suspensas e cujo período de suspensão já tenha decorrido, salvo se a suspensão já tiver sido revogada.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Lei n.º 45/04, de 19.08 - Certificação de óbito, autópsias ...

"...SECÇÃO II
Exames e perícias no âmbito da tanatologia forense

Artigo 14.º
Verificação e certificação dos óbitos

A verificação e certificação dos óbitos é da competência dos médicos, nos termos da lei.

Artigo 15.º
Óbito verificado em instituições de saúde

1 - Nas situações de morte violenta ou de suspeita de morte violenta, bem como nas mortes de causa ignorada e quando o óbito for verificado em instituições públicas de saúde ou em instituições privadas de saúde, deve o seu director ou director clínico:

a) Comunicar o facto, no mais curto prazo, à autoridade judiciária competente, remetendo-lhe, devidamente preenchido, o boletim de informação clínica aprovado por portaria conjunta dos Ministros da Justiça e da Saúde, bem como qualquer outra informação relevante para a averiguação da causa e das circunstâncias da morte;

b) Assegurar a permanência do corpo em local apropriado e providenciar pela preservação dos vestígios que importe examinar.

2 - Compete ao conselho directivo do Instituto propor alterações ao modelo do boletim de informação clínica a que se refere a alínea a) do n.º 1.

3 - Nos casos em que seja ordenada a realização de autópsia médico-legal, a autoridade judiciária envia ao serviço médico-legal ou ao médico contratado que a vai realizar, juntamente com o despacho que a ordena, cópia do boletim de informação clínica.

Artigo 16.º
Óbito verificado fora de instituições de saúde

1 - Em situações de morte violenta ou de causa ignorada, e quando o óbito for verificado fora de instituições de saúde, deve a autoridade policial:

a) Inspeccionar e preservar o local;

b) Comunicar o facto, no mais curto prazo, à autoridade judiciária competente, relatando-lhe os dados relevantes para averiguação da causa e das circunstâncias da morte que tiver apurado;

c) Providenciar, nos casos de crime doloso ou em que haja suspeita de tal, pela comparência do perito médico da delegação do Instituto ou do gabinete médico-legal que se encontre em serviço de escala para as perícias médico-legais urgentes, o qual procede à verificação do óbito, se nenhum outro médico tiver comparecido previamente, bem assim como ao exame do local, sem prejuízo das competências legais da autoridade policial à qual competir a investigação.

2 - Quando haja lugar ao exame do local, nos termos da alínea c) do número anterior, é elaborada informação pelo perito médico, a enviar à autoridade judiciária.

3 - No caso das restantes situações de morte violenta ou de causa ignorada e das referidas na alínea c) do n.º 1, que se verifiquem em comarcas não compreendidas na área de actuação das delegações do Instituto ou de gabinetes médico-legais em funcionamento, compete à autoridade de saúde da área onde tiver sido encontrado o corpo proceder à verificação do óbito, se nenhum outro médico tiver comparecido previamente e, se detectada a presença de vestígios que possam fazer suspeitar de crime doloso, providenciar pela comunicação imediata do facto à autoridade judiciária.

4 - O disposto no número anterior aplica-se também perante a manifesta impossibilidade de contactar o perito médico em serviço de escala.

5 - O transporte do perito médico ou da autoridade de saúde ao local é assegurado pela autoridade policial que tiver tomado conta da ocorrência.

6 - Em todas as situações em que não haja certeza do óbito, as autoridades policiais ou os bombeiros devem conduzir as pessoas com a máxima brevidade ao serviço de urgência hospitalar mais próximo.

7 - Na situação referida no n.º 1, compete às autoridades policiais promover a remoção dos cadáveres, consoante o local em que se tiver verificado o óbito, para a casa mortuária do serviço médico-legal da área ou, na sua inexistência, para a do hospital ou do cemitério mais próximos:

a) Após a verificação do óbito e a realização do exame de vestígios nos casos referidos na alínea c) do n.º 1; ou

b) Por determinação da autoridade judiciária competente.

8 - Excepcionalmente, perante a manifesta impossibilidade de contactar o perito médico em serviço de escala, a autoridade de saúde ou a autoridade judiciária competente, e existindo substanciais prejuízos decorrentes da permanência do corpo no local, pode a autoridade policial determinar e proceder à sua remoção para os locais referidos no número anterior, observando-se com as necessárias adaptações o disposto no n.º 3 do presente artigo.

9 - Para o efeito do disposto nos dois números anteriores, as autoridades policiais podem requisitar a colaboração dos bombeiros, dos serviços médico-legais, dos serviços de saúde ou de agências funerárias.

10 - Nas situações previstas nos números anteriores em que existam dados identificativos, compete, ainda, às autoridades policiais promover a comunicação do óbito às famílias.

11 - As despesas inerentes às situações previstas nos números anteriores são satisfeitas pelo Cofre Geral dos Tribunais, através da sua delegação junto do tribunal territorialmente competente, e são consideradas custas do processo.

12 - As disposições previstas nos números anteriores aplicam-se, com as devidas adaptações, em todas as situações de morte de pessoas detidas em estabelecimentos prisionais, esquadras ou postos de autoridades policiais ou outras forças de segurança.

13 - Os cadáveres que derem entrada nos serviços médico-legais devem ser sujeitos a um exame pericial do hábito externo, cujo resultado será comunicado por escrito no mais curto prazo à autoridade judiciária competente, tendo em vista o estipulado no n.º 1 do artigo 18.º

Artigo 17.º
Intervenção das autoridades judiciárias

O disposto nos artigos anteriores não dispensa a intervenção pessoal da autoridade judiciária competente que se demonstre necessária a garantir os direitos dos cidadãos e às exigências da investigação criminal.

Artigo 18.º
Autópsia médico-legal

1 - A autópsia médico-legal tem lugar em situações de morte violenta ou de causa ignorada, salvo se existirem informações clínicas suficientes que associadas aos demais elementos permitam concluir, com segurança, pela inexistência de suspeita de crime, admitindo-se, neste caso, a possibilidade da dispensa de autópsia.

2 - Tal dispensa nunca se poderá verificar em situações de morte violenta atribuível a acidente de trabalho ou acidente de viação dos quais tenha resultado morte imediata.

3 - A autópsia médico-legal pode, ainda, ser dispensada nos casos em que a sua realização pressupõe o contacto com factores de risco particularmente significativo susceptíveis de comprometer de forma grave as condições de salubridade ou afectar a saúde pública.

4 - Compete ao presidente do conselho directivo do Instituto autorizar a dispensa da realização de autópsia médico-legal nos casos previstos no número anterior, mediante comunicação escrita do facto, no mais curto prazo, à entidade judiciária competente.

5 - A autópsia médico-legal pode ser realizada após a constatação de sinais de certeza de morte, competindo a sua marcação, com a possível brevidade, ao serviço médico-legal ou à autoridade judiciária nas comarcas não compreendidas na área de actuação das delegações do Instituto ou de gabinetes médico-legais em funcionamento, de acordo com a capacidade do serviço.

6 - Compete à autoridade judiciária autorizar a remoção dos corpos com vista à realização da autópsia médico-legal, bem como assegurar a sua adequada preservação nos casos em que os mesmos não sejam removidos para as delegações ou gabinetes médico-legais.

7 - As remoções efectuadas nas condições previstas no número anterior não estão sujeitas a averbamento nos assentos de óbito nem a licenças ou a taxas especiais..."

Conflito de deveres

No sentido de que o dever legal de entregar ao Estado o imposto retido ou liquidado é superior ao dever de pagar os salários dos trabalhadores, ou seja, o conflito de deveres tem de ser resolvido favoravelmente ao Estado:

- AcSTJ, de 18.06.03;
- AcTRP, de 15.12.04;
- AcTRG, de 14.03.05;
- AcTRL, de 19.12.06;
- AcTRP, de 05.12.07;
- AcTRP, de 30.01.08;

disponíveis em http://www.dgsi.pt/

Tribunal Constitucional - art. 105, n.º 4, al. b), do R.G.I.T.

Acórdão n.º 409/2008, D.R. n.º 185, Série II
Tribunal Constitucional
Não julga inconstitucional a norma constante do artigo 105.º, n.º 4, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, na redacção dada pelo artigo 95.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, interpretado no sentido de que pode o tribunal de julgamento determinar a notificação aí prevista

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Regime processual civil de natureza experimental

Decreto-Lei n.º 187/2008, D.R. n.º 184, Série I de 2008-09-23
Ministério da Justiça
Primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 108/2006, de 8 de Junho, que procede à criação de um regime processual civil de natureza experimental

Decreto-Lei n.º 108/2006. DR 111 SÉRIE I-A de 2006-06-08
Ministério da Justiça
Procede à criação de um regime processual civil de natureza experimental, aplicável às acções declarativas entradas, a partir de 16 de Outubro de 2006, em tribunais a determinar por portaria do Ministro da Justiça

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Redução Oficiosa do Prazo de Suspensão da Execução da Pena

Acórdão da Relação do Porto, de 17-09-2008
Processo: 0813224
JTRP00041630
Relator: LUÍS TEIXEIRA
RP200809170813224

Acórdão da Relação do Porto: 17-09-2008

Processo: 0843027
Nº Convencional: JTRP00041623
Relator: MARIA ELISA MARQUES
Nº do Documento: RP200809170843027

No mesmo sentido:
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 30 de Abril de 2008, no processo n.º 55/03.6TAMMV-B, no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 7 de Maio de 2008 (relator: Inácio Monteiro; processo: 428/05.0PBFIG.A.C1) e no Acórdão da Relação de Coimbra, de 09.07.2008 ( processo 205/03.2TAFIG-A.C1, relatorAlberto Mira).


Sumário:

Tendo sido decidido, por sentença transitada em julgado, suspender a execução da pena de prisão por período superior à medida da pena, por aplicação do nº 5 do art. 50º do Código Penal na redacção anterior à vigência da Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro, pode o juiz, após a entrada em vigor deste diploma, reduzir oficiosamente o período de suspensão, aplicando o nº 5 do art. 50º na actual redacção.

Consultar também:

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto,
de 21.01.2009

Processo: 0815156

Nº Convencional: JTRP00042084
Relator: LUÍS RAMOS

Descritores: REGIME CONCRETAMENTE MAIS FAVORÁVEL
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO

Nº do Documento: RP200901210815156
Data do Acordão: 21-01-2009

Sumário:
Tendo o arguido sido condenado na pena de 7 meses de prisão com a execução suspensa pelo período de 2 anos, no âmbito da anterior versão do art. 50º do Código Penal, pode o juiz oficiosamente reduzir para 1 ano o período de suspensão da execução da pena, aplicando, ao abrigo do art. 2º, nº 4, do mesmo código, o nº 5 daquele art. 50º, na versão resultante da Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

MANDADOS DE DETENÇÃO FORA DE FLAGRANTE DELITO

= MANDADOS DE DETENÇÃO =


---- O MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA COMARCA DE …, ordena a qualquer agente de autoridade, que, ao abrigo do disposto nos arts. 257º, nº 1, e 254º, n.º 1, al. a), do C. P. Penal, PROCEDA À DETENÇÃO de A…, solteira, filha de … e de …, titular do bilhete de identidade n.º …, nascida a …, em …, e residente na Rua …, em …, por haver fortes indícios de que seja autora de crimes de …, a fim se ser presente ao Juiz de Instrução para PRIMEIRO INTERROGATÓRIO JUDICIAL E APLICAÇÃO DE UMA MEDIDA DE COACÇÃO, dada a existência de fundadas razões para considerar que a visada se não apresentará espontaneamente perante autoridade judiciária( cf. art. 204º, al. a), do Cód. Proc. Penal). --------------------------------CUMPRA-SE, com observância das formalidades legais.-----------------------------------

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Local, Data


O MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO


A TÉCNICA DE JUSTIÇA-ADJUNTA

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Pagamento da Pena de Multa em Prestações

Acórdão da Relação do Porto de 10-09-2008
Processo: 0843469
N.º Convencional:JTRP00041615
Relator:LUÍS GOMINHO
Nº do Documento: RP200809100843469

Sumário:
O pagamento da multa em prestações tem de ser requerido até ao termo do prazo previsto no nº 2 do art. 489º do Código de Processo Penal.


Transcrição parcial:

“…Teve lugar a conferência.
III - 1.) Tal como decorre das conclusões apresentadas, consabidamente definidoras do respectivo objecto, a questão central convocada pelo recurso interposto pelo arguido B………….., consiste em saber se existe, ou não, um prazo para o pedido de pagamento da pena de multa em prestações.
III - 2.) Vejamos primeiro, o teor do despacho aqui controvertido:
«O arguido B…………….. foi condenado, em cúmulo jurídico, pela prática de dois crimes de ameaça, p. e p. pelo art. 153.°, n.º 2 e de um crime de injúria agravado, p. e p. pelo art. 181.°, n.º 1, 184.º e 132.°, n.º 2, al. h) do Código Penal, na pena de 300 dias de multa, à taxa diária de €5,00, o que perfaz a quantia de € 1500,00.
Instaurada a execução para pagamento de tal quantia, liquidou-se a quantia de €12 (doze euros).
O Ministério Público a fls. 268 promoveu que fosse convertida a multa em que o arguido foi condenado em prisão subsidiária, nos termos do n.º 1 do art. 49.° do Código Penal e a consequente passagem de mandados de detenção para cumprimento da pena de prisão subsidiária a aplicar.
O arguido B……………., a fls. 275, veio referir que pretende pagar o montante em que foi condenado, sendo que se encontra há uns meses a esta parte desempregado, vivendo de ajuda de familiares. Requereu que caso a multa não pudesse ser substituída por trabalho a favor da comunidade, seja deferido o pagamento da mesma em prestações ou que seja concedido um prazo de 30 dias, a fim de pagar o montante da pena, socorrendo-se de um empréstimo de familiares.
Cumpre apreciar.
Até à presente data, o arguido não procedeu ao pagamento voluntário da pena de multa em que foi condenado, tendo sido coercivamente obtida apenas a quantia de €12,00, quantia que, nos termos do art. 511.º do Código de Processo Penal, sendo imputada no montante devido, perfaz ainda um remanescente de €1488 em dívida.
O arguido veio agora solicitar que lhe seja dada uma nova oportunidade de cumprimento voluntário da referida pena de multa.
Desde já, cumpre referir que o requerido carece de fundamento legal e se mostra extemporâneo, tal como defende o Ministério Público, a fls. 268.
Segundo o n.º 2 do art. 489.º do Código de Processo Penal, o prazo para o pagamento da multa é de 1 5 dias a contar da notificação a realizar para esse efeito, após o trânsito em julgado da decisão condenatória.
Refere, contudo, o n.° 3 do art. 47.° do Código Penal, dispondo que: "Sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal pode autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda um ano, ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação ".
A questão está em saber se existe um prazo para o pedido de pagamento da pena de multa em prestação.
O sentido jurisprudencial maioritário, que acompanhamos, tende a considerar que o referido pedido tem como horizonte temporal máximo o "terminus" do cumprimento voluntário da pena de multa.
Decidiu-se no Acórdão da Relação do Porto de 11.07.2007, Relator: Desembargador Guerra, in www.dgsi.pt:
"O pagamento da multa em prestações e a substituição da multa por dias de trabalho têm que ser requeridos dentro do prazo que a lei prevê para o pagamento voluntário da multa, sob pena de preclusão do respectivo direito."
De igual forma, exara-se no Acórdão da Relação do Porto de 28.05.2003, Relator: Desembargador Francisco Marcolino, in www.dgsi.pt:
"O prazo para requerer o pagamento da multa em prestações é o do pagamento voluntário (15 dias a contar da notificação para o efeito), jamais podendo ser requerido depois de instaurada a execução patrimonial.
Na fase executiva para cobrança da multa, o arguido apenas poderá requerer o pagamento em prestações na respectiva execução com o formalismo do artigo 882.º do Código de Processo Civil."
Assim se pronuncia igualmente o Acórdão da Rel. do Porto de 22 de Fevereiro de 2006, in Colectânea de Jurisprudência, Ano XXXI, Tomo I, pág. 216.
O legislador previu um sistema múltiplo, sucessivo e subsidiário para o cumprimento da pena de multa aplicada. Com efeito, em primeira instância haverá pagamento voluntário se o arguido no prazo de 15 dias a contar da notificação o realizar para esse efeito, após o trânsito em julgado da decisão condenatória (n.°s l e 2 do art. 489.° do Código de Processo Penal). Apenas no caso de, nesse prazo, o arguido o requerer, pode o pagamento ser diferido, por prazo que não exceda um ano, ou do pagamento em prestações, até ao limite de dois anos subsequentes à data do trânsito em julgado da decisão (art. 47°, n.º 3, do Código Penal). Finalmente e quando não se mostrar paga a quantia em que foi condenado o arguido e se não mostrar requerido, naquele prazo, a substituição da pena de multa pela pena de trabalho a favor da comunidade, se poderá partir para o pagamento coercivo, nos termos previstos e regulados nos arts. 491.°, n.ºs l e 2, do Código de Processo Penal e 116.° a 123.° do Código das Custas Judiciais. - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.03.2000, BMJ n.° 495, pág. 91.
A contrario, uma vez utilizado o mecanismo de cobrança coerciva, não pode o arguido requerer o pagamento da multa em prestações ou a substituição da mesma por pena de trabalho a favor da comunidade.
Com efeito, o arguido no prazo de pagamento voluntário da pena de multa não alegou qualquer incapacidade para o pagamento, designadamente por insuficiência económica, a qual alega, neste momento, após a tentativa de cobrança coerciva, não adscrevendo qualquer situação superveniente que não lhe permita proceder ao pagamento da mesma, ocorrida apenas nesta fase.
Aliás, no que à pena de prestação de trabalho a favor da comunidade concerne, refere o n.°1 do art. 490.° do Código de Processo Penal, que "o requerimento para a substituição da multa por dias de trabalho é apresentado no prazo previsto nos n.°s 2 e 3 do artigo anterior", ou seja:
1) em regra, o requerimento deve ser apresentado dentro do prazo do pagamento voluntário da multa;
2) se, contudo, o pagamento da multa tiver sido deferido ou autorizado em prestações, o requerimento pode ser apresentado no decurso do prazo concedido para o pagamento diferido ou em prestações, com referência ao valor ainda em dívida.
Entendemos, assim, que o prazo para pagamento da pena de multa e de substituição da mesma por pena de prestação de trabalho a favor da comunidade (art. 489.°, n.° 2, e 490.°, n.° l, do Código de Processo Penal) se mostra peremptório sendo que o decurso do mesmo extingue o direito de praticar o acto, nos termos do artigo 145.°, n.° 2 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi dos arts. 4.° e 104.°, n.º 1 do Código de Processo Penal.
A verdade é que "o condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa em que foi condenado" (cfr. art. 49°, n° 2, do Código Penal) e "sempre que, no momento da detenção para cumprimento da pena de prisão subsidiária, o arguido pretenda pagar a multa, mas não possa, sem grave inconveniente, efectuar o pagamento no tribunal, pode realizá-lo à entidade policial, contra entrega de recibo, aposto no triplicado do mandado" (cfr. art. 100°, n.° l, do Código das Custas Judiciais), o que evidencia que a prisão subsidiária é, na verdade, uma sanção penal de constrangimento tendente a obter a realização do efeito preferido e que consiste inequivocamente no pagamento da multa. - Jorge de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português - As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas -Editorial Notícias, Lisboa, 1993, pág. 147; Código Penal - Actas e Projecto da Comissão de Revisão, Ministério da Justiça, 1993, pág. 30).
Nada mais resta, in casu, do que lançar do constrangimento que a conversão da pena de multa em pena de pisão subsidiária pode operar.
Por mais indesejável que, de um ponto de vista político-criminal, se mostre o cumprimento de uma pena privativa de liberdade em vez de uma pena de multa, tal pode tornar-se absolutamente indispensável para preservar a necessária efectividade da pena de multa, face às finalidades que presidem à sua aplicação, sobretudo quando a esta se atribui um âmbito de aplicação tão vasto como o que lhe é conferido pelo nosso direito penal vigente. - Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português - As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas - Editorial Notícias, Lisboa, 1993, pág. 145.
O direito à liberdade do condenado tem que ser concatenado com a pretensão punitiva do Estado, porque se pressupõe que agregado a este existem valores ou bens jurídicos que se pretendem salvaguardar. - Acórdão da Relação do Porto de 15 de Junho de 2005, in www.dgsi.pt.
Da mesma forma "se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa por um período de l a 3 anos desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão subsidiária; se o forem, a pena é declarada extinta". - art. 49.º, n.º 3, do Código Penal.
Porém sublinhe-se que apenas no caso de ser convertida a pena de multa em pena de prisão subsidiária poderá a execução desta ser suspensa. - Acórdão da Relação de Coimbra, de 22 de Outubro de 2003, in www.dgsi.pt.
No entanto, deverá o arguido fazer prova cabal da não imputabilidade da frustração do pagamento, o que não fez.
Decidindo.
Nos termos do disposto no n.º l, do art. 49.°, do Código Penal, "[s]e a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando para o efeito, o limite mínimo dos dias de prisão constante no n.º1 do artigo 41".
Com efeito, o arguido não procedeu ao pagamento voluntário do montante de €1488, comportamento que manteve mesmo depois de notificado das consequências do seu incumprimento, nomeadamente da conversão em prisão subsidiária.
Não é viável a cobrança coerciva da quantia em dívida.
Deste modo, não resta outra alternativa ao tribunal senão aplicar pena de prisão subsidiária, que, no caso concreto é de 198 dias, depois de operada a redução a dois terços determinada pelo citado art. 49.°, n.º 1, sobre a pena de 298 dias de multa, ainda não paga, imputando-se já a quantia liquidada coercivamente de €12.
*
No entanto, resta ainda ao arguido a possibilidade de evitar a todo o tempo a execução da prisão subsidiária, pagando a multa a que foi condenado (cfr. n.º2 do art. 49°, Código Penal).
***
Pelo exposto, converto a pena de dias de multa na pena de 198 dias de prisão subsidiária, a cumprir pelo arguido B……………., nos termos do disposto no n.º l do art. 49.º do Código Penal.»

III – 3.1.) Em função do teor do despacho acabado de transcrever, só numa perspectiva muito compreensiva da natureza prejudicial da questão ora colocada se poderá autorizar a não rejeição imediata do recurso interposto.
É que, com efeito, analisado o respectivo conteúdo, tal como o anota o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, aquele despacho acaba por no fundo comportar duas decisões: a de denegação da pretensão do pagamento da multa em prestações que havia sido colocada de forma alternativa, e uma outra decorrente da conversão da multa, determinando o cumprimento da prisão subsidiária.
Ora convergindo a exclusividade da argumentação do arguido sobre aquele primeiro aspecto decisório, será legítimo questionar o sentido dessa impugnação quando se deixa incólume aquele último aspecto que obviamente sobreleva à do referido prazo do pagamento…
Ainda assim, em jeito conclusivo, adiantaremos que não vislumbramos qualquer razão para endereçar censura ao douto despacho recorrido.

III – 3.2.) Conforme decorre dos autos, por acórdão datado de 14 de Dezembro de 2006, em função dos crimes referidos, veio o arguido a ser condenado na já indicada pena de 300 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, ou seja, na multa global de € 1.500,00.
Foi notificado (aliás como o seu Ilustre Defensor), para efectuar o seu pagamento e bem assim as custas em dívida.
Não o tendo feito, seguiu-se o habitual pedido de averiguação de bens à competente entidade policial, que a tanto informou.
A questão da “necessidade” do arguido “ter de provar exaustivamente a sua incapacidade económica” não se coloca pois, já que no encadeado da actuação do Tribunal em relação a esta temática, está obviamente pressuposta tal debilidade.
Perante a insuficiência da execução instaurada para lograr o referido pagamento, o Ministério Público promoveu a conversão da multa em prisão subsidiária.
Ora é exactamente na sequência da notificação determinada em relação a esta promoção que surge então o requerimento aqui constante a fls. 36, apresentado em nome do arguido, em que aquele solicita, sucessivamente, a substituição da multa por trabalho, a não ser esta possível, o pagamento “da coima em prestações mensais”, ou se assim não se deferir, “um prazo de 30 dias, a fim de aquele pagar o montante da pena”, através de um empréstimo a contrair junto de familiares.
III – 3.3.) Tal como decorre dos preceitos atinentes à respectiva regulamentação, o cumprimento da pena de multa envolve um conjunto de etapas, normativamente concatenadas de forma sucessiva, no sentido de se alcançar o pagamento da quantia económica que traduz aquela forma de sanção e que podemos sintetizar nos seguintes “momentos”:
- Pagamento (que inclui a sua oblação voluntária no prazo geral e os pagamentos diferido e fraccionado);
- A modalidade especial da sua substituição por dias de trabalho;
- Execução patrimonial;
- Conversão da multa em prisão subsidiária.
Sobre o pagamento voluntário não existem dúvidas:
De harmonia com o preceituado nos art. 489.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Penal “A multa é paga após o trânsito em julgado da decisão que a impôs e pelo quantitativo nesta fixado, não podendo ser acrescida de quaisquer adicionais”, sendo que “O prazo de pagamento é de quinze dias a contar da notificação para o efeito".
Também é pagamento voluntário o pagamento diferido – o que tem lugar dentro de um prazo que não exceda um ano concorrendo autorização nesse sentido e o em prestações, pagamento fraccionado que não pode ir além dos dois anos contados sobre o trânsito em julgado - modalidades contempladas no art. 47.º, n.º 3, do Cód. Penal.
Segundo o Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – “As Consequências Jurídicas do Crime - Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág.ª 136), “a possibilidade de pagamento da multa a prazo ou em prestações encontra a sua razão de ser na necessidade de se operar a concordância prática de dois interesses conflituantes. É indiscutível que a regulamentação da multa deve conduzir à aplicação de penas suficientemente pesadas para que nelas encontrem integral realização as finalidades gerais das sanções criminais. As facilidades de pagamento devem pois obstar, por um lado, até ao limite do possível, a que a pena de multa não seja cumprida e a que entrem consequentemente em cena a execução de bens ou as sanções penais sucedâneas”.
É certo que não está expressamente referido qual é o prazo para se requerer aquele pagamento diferido ou em prestações.
Mas a isso responde a Jurisprudência, ao que julgamos uniforme deste Tribunal (cfr. os já mencionados acórdãos de 28/05/2003, no processo 0311915, de 22/02/2006, na CJ, Ano XXXI, Tomo 1, pág.ª 216 e de 11/07/2007, no processo 0712537), não ser necessária essa menção, já que é também o de 15 contados da notificação para o respectivo pagamento voluntário.

III – 3.4.) A razão de ser para este entendimento, radica basicamente na consideração de elementos de ordem sistemática que se prendem com a concatenação das fases acima referidas e no suporte normativo que lhe é emprestado por aspectos pontuais daquela mesma regulamentação.
Note-se com efeito, que mesmo para o pedido de substituição da multa por trabalho, que traduzindo uma manifestação inequívoca do condenado em multa às finalidades da sanção, não traduz enquanto tal, um pagamento, está claramente indicado no art. 490.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, que o respectivo pedido deverá ser “apresentado no prazo previsto nos n.ºs 2 e 3 do artigo anterior”, ou seja, é também de 15 dias.
A especialidade introduzida pelo art. 489, n.º 3, do Cód. Proc. Penal, segundo o qual “o disposto no número anterior não se aplica no caso de o pagamento da multa ter sido diferido ou autorizado pelo sistema de prestações”, não deixa aqui de ser também importante.
Prima facie, não se aterá ao momento em que tais possibilidades devem ser requeridas, mas à do prazo do respectivo pagamento, pois que forçosamente terá que ser superior a 15 dias.
Em todo o caso, como esta Relação o vem enfatizando, “a expressão “ter sido diferido ou autorizado” contém implícito o sentido de que o pagamento da multa em prestações deverá ser requerido até ao termo do prazo previsto no n.º 2, ou seja, até ao termo do prazo para o pagamento voluntário da multa”.
Fechada essa fase ou as suas incidências, passa-se à fase seguinte, ou na sugestiva referência do Professor Figueiredo Dias acima citada, “entram em cena a execução de bens ou as sanções penais sucedâneas”:
“Findo o prazo de pagamento da multa ou de alguma das prestações sem que o pagamento esteja efectuado, procede-se à execução patrimonial” (art. 491.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal), sendo que “tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas”(respectivo n.º 2).

III – 3.5.) Não significa isto, claro está, que de uma forma ou doutra, entrado o processo na fase executiva ou mesmo sequer na seguinte, fiquem cerceadas as vias processuais que permitem o pagamento da multa, já que esta é a finalidade última pretendida pela ordem jurídica penal.
Só que a faculdade de o fazer em prestações, é beneficio a que só poderá aceder, quem em tempo próprio manifestou o desejo de dele querer fazer uso.
E com isto não se alegue com o preceituado no art. 49.º, n.º 2, do Cód. Penal.
Não só como o refere o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto esta norma “disciplina um momento naturalmente posterior à decisão que determinou a aplicação da prisão subsidiária, motivo pela qual não serve de paralelo para um momento processual anterior, que é pressuposto do atingimento daquele, sob pena de jamais se lhe aceder”, como para nós é claro que o pagamento “em parte” que aí se previne, nada tem a ver com o pagamento em prestações pretendido pelo recorrente.
Nesta conformidade:

IV – Decisão:
Nos termos e como os fundamentos expostos, acorda-se pois em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido B……………….., confirmando-se a decisão recorrida.

Pelo seu decaimento ficará aquele sancionado em 3 (três) UCs de taxa de justiça, de harmonia com o preceituado nos art.ºs 513.º e 514.º do CPP e 87.º, n.º 1, al. b), do CCJ.
Elaborado em computador. Revisto pelo Relator, o 1.º signatário.
Porto, 10 de Setembro de 2008

Luís Eduardo B. de Almeida Gominho
Abílio Fialho Ramalho”

Não transcrição da pena no certificado de registo criminal

Vista:

**
A condenação dos autos foi a primeira que a arguida sofreu, de acordo com o certificado de registo criminal junto a fls. 11.
A pena aplicada foi de multa, a que acresceu a pena acessória.
A arguida pede agora a não transcrição da pena nos certificados a que aludem os arts. 11º e 12º da Lei n.º 57/98, de 18.08.
Tal, porém, é manifestamente desnecessário.
Na verdade, de acordo com o n.º 2 do art. 11º da Lei n.º 57/98, de 18.08, nos casos em que, por força da lei, se exija ausência de antecedentes criminais ou apenas de alguns para o exercício de determinada profissão ou actividade, os certificados são emitidos de acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 12º da mesma lei.
Ora, estatui a al. e) do n.º 2 do art. 12º da citada lei, que os certificados emitidos, ao abrigo do dito preceito legal, não podem conter informação relativa a condenações de delinquentes primários em pena não superior a seis meses de prisão.
A determinação no sentido de não ser transcrita a condenação, a que alude o n.º 1 do art. 17º do mesmo diploma legal, apenas aplicável aos certificados requeridos para efeitos dos arts. 11º e 12º, apenas tem sentido útil para quem não preencha qualquer das duas condições que são, por força da lei, causa de não transcrição, ou seja a quem: a) tenha sido condenado em pena igual ou superior a 6 meses de prisão; b) não seja delinquente primário.
Não é esse o caso dos autos.
Pelo exposto, promove-se o indeferimento do requerido.

**

Processei, imprimi, revi e assinei o texto, seguindo os versos em branco ( art. 94º, n.º 2, do CPP ).
…,…
O Procurador-Adjunto

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Critérios negativos para aplicação de vigilância electrónica

Para além dos critérios legais, costumam
ser apontados internacionalmente alguns
critérios negativos de elegibilidade para a
aplicação da vigilância electrónica.

Adaptando-os à realidade portuguesa,
sugerem-se os seguintes critérios negativos:

_ sem residência fixa

_ perigo intenso de fuga (no caso da
OPH)

_ quando o LVE é proporcionador da
continuação da actividade criminosa
(violência doméstica, tráfico de
estupefacientes em casa, etc.)

_ arguidos sem capacidade de autocontenção
em especial quando
inseridos em contextos sócio-familiares
anómicos, sem mecanismos de
controlo

_ estrangeiros, sem vínculos
significativos a Portugal

_ arguidos muito jovens quando
possuidores de acentuados traços
de imaturidade e percurso criminal,
especialmente quando em
confinamento permanente (no caso
da OPH)

_ contextos sócio-familiares de
grande perturbação, violência ou
disfuncionalidade familiares

_ toxicodependentes em fase activa
de consumo activo e/ou sem
tratamento

( extraído de brochura da D.G.R.S. )

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Convenção de Extradição entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

Resolução da Assembleia da República n.º 49/2008, D.R. n.º 178, Série I de 2008-09-15
Assembleia da República
Aprova a Convenção de Extradição entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Cidade da Praia em 23 de Novembro de 2005

Decreto do Presidente da República n.º 67/2008, D.R. n.º 178, Série I de 2008-09-15
Presidência da República
Ratifica a Convenção de Extradição entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Cidade da Praia em 23 de Novembro de 2005

Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

Resolução da Assembleia da República n.º 48/2008, D.R. n.º 178, Série I de 2008-09-15
Assembleia da República
Aprova a Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Praia, em 23 de Novembro de 2005

Decreto do Presidente da República n.º 66/2008, D.R. n.º 178, Série I de 2008-09-15
Presidência da República
Ratifica a Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Cidade da Praia em 23 de Novembro de 2005

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Acusação em Processo Abreviado

Inquérito n.º …

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Requisite o certificado de registo criminal do arguido.

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ACUSAÇÃO


O Ministério Público, nos termos dos arts. 391-A, n.º 3, al. b), e 391º-B, nº1, do Cód. Processo Penal, acusa em processo abreviado, para julgamento por tribunal de estrutura singular:

. Armando …, id. a fls. 6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais,

Porquanto:


No dia 02.06.08, pelas cerca das 11h25, o arguido foi constituído nessa qualidade e interrogado nos serviços do Ministério Público deste Tribunal Judicial de …, no âmbito da carta precatória n.º …, tendo sido expressamente advertido do dever de responder com verdade a respeito dos seus antecedentes criminais, tendo respondido que nunca tinha estado preso e que nunca tinha sido condenado.

Acontece, porém, que o arguido já havia sido condenado, por sentença transitada em julgado, no Comum Singular n.º … deste Tribunal, por crime de ofensa à integridade física por negligência cometido em 08.11.2007, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de 4 €, pena essa que foi declarada extinta pelo pagamento.

Agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

Cometeu, pelo exposto, o arguido, em autoria material, e na forma consumada:

- Um crime de falsidade de depoimento ou declaração, previsto e punível pelo artigo 359.º, n.º1 e 2, do Código Penal.

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Prova:

. documentos de fls. 1 a 15.

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Determino a sujeição do arguido a termo de identidade e residência ( art. 196º do Cód. Proc. Penal ).

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Proceda à formulação de pedido electrónico de nomeação de defensor ao arguido ao SINOA, atento o disposto no art. 64º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal e art. 2º da Portaria n.º 10/2008, de 03.01.


Comunique oportunamente, nos termos do art. 66º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, sendo ao arguido com a identificação do ilustre defensor e respectivo escritório.

Notifique o arguido de que fica obrigado, caso seja condenado, a pagar os honorários do defensor oficioso, salvo se lhe for concedido apoio judiciário, e que pode proceder à substituição do defensor mediante a constituição de advogado(a) ( cf. art. 64º, n.º 4, do Cód. Proc. Penal ).


Mais informe o arguido de que caso não solicite apoio judiciário na segurança social, será responsável pelo pagamento de 450 € a título de honorários à defensora ( o triplo do valor estabelecido no art. 36º, n.º 2, da Lei n.º 47/07, de 28.08, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08 ), atento o disposto no art. 36º, n.º 7, da Lei n.º 47/07, de 28.08, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08, e, caso o mesmo seja requerido e lhe seja indeferido, ficará sujeita ao pagamento de 150 € ( art. 39º, n.º 8, da Lei n.º 47/07, de 28.08, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08 ).

______________________________________________________________________


Cumpra o disposto no art. 283º, n.º 5, do Cód. Proc. Penal, solicitando ao OPC da área da respectiva residência a constituição formal como arguido e a entrega ao mesmo da declaração a que alude o art. 39º, n.º 3, da Lei n.º 34/04, de 29.07, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08, para que a envie a este inquérito, no prazo de 10 dias, o qual deverá ainda ser advertido de que:

- prestando falsas declarações na referida declaração, pagará 750 €, nos termos do art. 39º, n.º 8, da Lei n.º 34/04, de 29.07, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08;

- caso não junte aos autos a declaração e não constitua advogado nos autos, pagará 450 € a título de honorários ao defensor nomeado (art. 39º, n.º 9, da Lei n.º 34/04, de 29.07, na redacção da Lei n.º 47/07, de 28.08 ).

______________________________________________________________________


Comunique superiormente ( Ponto VI, n.º 3, da Circular n.º 06/02, de 11.03, da P.G.R. ).

______________________________________________________________________


Processei, imprimi, revi e assinei o texto, seguindo os versos em branco ( art. 94º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal ).


…,…


O Procurador-Adjunto



Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa

Resolução da Assembleia da República n.º 46/2008, D.R. n.º 177, Série I de 2008-09-12
Assembleia da República
Aprova a Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Cidade da Praia em 23 de Novembro de 2005
Presidência da República
Ratifica a Convenção de Auxílio Judiciário em Matéria Penal entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Cidade da Praia em 23 de Novembro de 2005

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Prisão preventiva. Requisitos do despacho que a aplica. Recurso. Manifesta improcedência.

ACÓRDÃOS DA RELAÇÃO DE LISBOA

Decisão sumária de 02-09-2008


I – O recurso de um despacho que, na sequência do 1º interrogatório judicial, impõe a prisão preventiva pode, em princípio, visar:
a)A declaração da nulidade desse despacho;
b)A revogação do despacho por:
a.Não estarem reunidas as condições gerais previstas no artigo 192º do CPP.
b.Não existir, em concreto, nenhum dos requisitos gerais de aplicação das medidas de coacção enunciados no artigo 204º do mesmo diploma e invocados no despacho recorrido;
c.Não se encontrarem preenchidos os pressupostos específicos da medida de coação aplicada, impugnação essa que pode pretender pôr em causa:
i.A existência (tendo em conta as provas atendíveis) de fortes indícios da prática dos factos que justificaram a imposição da medida;
ii.A qualificação jurídica desses factos;
iii.A subsunção do crime indiciado no elenco daqueles que são abrangidos pelas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 202º [esta última com referência às alíneas i), j) e m) do artigo 1º] e pelo n.º 2 do artigo 203º do Código de Processo Penal;
d.Terem sido incorrectamente aplicados os princípios que regem as medidas de coacção em geral e a prisão preventiva em particular.
II – Exigindo a lei que o despacho que aplica a medida de coacção contenha:
A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido;
A enunciação, salvo em casos excepcionais, dos elementos que indiciam os factos imputados;
A qualificação jurídica desses factos; e
A referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida;
e tendo o arguido, em princípio, acesso aos elementos de prova que fundamentaram a decisão, essa impugnação tem de acatar o formalismo imposto pelo artigo 412º do Código de Processo Penal, não se podendo limitar a fazer meras alusões vagas ao caso concreto e referências gerais às normas e princípios aplicáveis às medidas de coacção.
III – Para a interposição de um tal recurso é, pelo menos, necessário que o recorrente identifique os pontos concretos do despacho recorrido que pretende impugnar e os fundamentos específicos dessa mesma impugnação.
IV - É, assim, de rejeitar liminarmente, por manifesta improcedência, o recurso interposto pelo arguido do despacho que lhe aplica a medida coactiva de prisão preventiva se este, na respectiva motivação:
a) - Não identifica os pontos concretos do despacho recorrido que pretende impugnar e os fundamentos específicos dessa mesam impugnação;
b) Limita a sua motivação a meras alusões vagas ao caso concreto e a referências gerais às normas e princípios aplicáveis às medidas de coacção.
Proc. 6947/08 3ª Secção
- Desembargador: Carlos Almeida
Sumário elaborado por Carlos Almeida (Des.)

TITULAR DO DIREITO DE QUEIXA/VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO/CÔNJUGE

Acórdão da Relação do Porto de 14-07-2008
Processo: 0812103
Nº Convencional: JTRP00041547
Nº do Documento: RP200807140812103
Relator: LUÍS TEIXEIRA


Sumário:
Titulares do interesse protegido pelo crime de violação de domicílio, estando em causa a habitação de um casal, são ambos os cônjuges, ainda que um deles haja abandonado a casa há alguns meses, por desavenças com o outro.

Texto:
Acordam em conferência na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
I
- Assistente: B………. .
- Arguidas: C……….
e
D………., todos melhor ids. nos autos.
*
1. Nos autos nº …/07.7TAMAI, do .º juízo do Tribunal Judicial da Maia, em que se investigava a eventual prática pelas arguidas dos crimes de violação de domicílio e de introdução em lugar vedado ao público, findo o inquérito, pelo Ministério Público foi proferido despacho de arquivamento pelas razões e fundamentos transcritos no mesmo, a fls. 33 e 34.
2. Inconformado com o arquivamento dos autos, requereu o assistente a abertura de instrução pelos motivos que integram o seu requerimento de fls. 87 a 92, pugnando pela pronúncia das arguidas pela prática daqueles crimes: violação de domicílio e de introdução em lugar vedado ao público
3. Realizadas as diligências de instrução, procedeu-se ao debate instrutório – fls. 205 e 206 – e, findo este, foi proferida decisão - de fls. 190 a 204 - de não pronunciar as arguidas pela prática dos factos e qualificação jurídica imputados pelo assistente.
4. Desta decisão recorre agora o assistente, formulando as seguintes conclusões:
4.1. Com a ruptura do casamento e saída do lar conjugal, sem intenção de regresso, por parte da recorrida D………. como é unanimemente aceite pela doutrina e jurisprudência, não lhe é mais permitido que entre na habitação que não é sua.
4.2. Por maioria de razão, não pode fazer entrar ou permitir que permaneça na habitação, terceiro.
4.3. As co-recorridas sabiam de toda a factualidade, mormente a recorrida D………., de não habitar com o recorrente bem como da hostilidade recíproca entre o recorrente e a recorrida C………. e que, por isso, esta não era bem-vinda ao último reduto de intimidade e privacidade que constitui o domicílio do recorrente.
4.4. O agente não tem de conhecer a norma violada, bastando-lhe uma consciência da ilicitude matéria que, normalmente, se presume.
4.5. Em Portugal, aos olhos gerais, uma pessoa “convidada” a sair da habitação de outrem, mesmo que autorizada por um co-habitante, sai.
4.6. Entendendo-se o contrário é eternizar ”erros não censuráveis sobre a ilicitude” e o morador ficar sem o último reduto de intimidade.
4.7. As recorridas, no dia 25 de Dezembro de 2006, uma a permitir a entrada e permanência da outra, numa residência que não era de nenhuma das duas, tendo uma delas sido instada pelo residente para sair e respondendo que uma que “só saio a mal” e a outra “fica…a casa também é minha”, cometem um crime de violação de domicílio, previsto e punível pelo artigo 190º, nº 1, do Código Penal, pelo qual devem ser pronunciadas, pelo menos por este, em co-autoria.
5. O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, dizendo em síntese:
5.1. Dos elementos de prova coligidos em sede de inquérito e em sede de instrução, supra referidos, relacionados e conjugados entre si, resulta que, no presente caso, os indícios recolhidos não são, de todo, suficientes para a decisão de submeter a causa a julgamento.
5.2. Por não se indiciar, desde logo, o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do crime de violação de domicilio e de introdução em lugar vedado ao público, p. e p., respectivamente, pelos art.ºs 190° e 191° do Código Penal.
5.3. Em face do exposto deverá ser mantida a decisão, ora recorrida, de não pronúncia das arguidas D………. e C………. .
6. Nesta instância, o Exmº Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de que o recurso deve ser considerado manifestamente improcedente.
7. Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, o assistente veio responder, continuando a pugnar pela pronúncia das arguidas.
8. Foram colhidos os vistos.
II
Segundo o teor da motivação de recurso e respectivas conclusões, a única questão a apreciar traduz-se em saber se, com a conduta do dia 25 de Dezembro de 2006, as arguidas cometeram algum crime[1].
III
É o seguinte o teor da decisão instrutória na parte que releva para o objecto do recurso:
“Relativamente aos factos do dia 25 de Dezembro de 2006, o assistente alega que consentiu que a arguida D………. entrasse em sua casa, mas esta, contra a vontade expressa daquele, fez entrar a sua prima C………. e que esta convidada a sair, o declinou dizendo que só saia a mal. Sabiam ambas que a entrada e presença da C………. era contra a vontade do assistente, pelo que teve que chamar a PSP de ………. para retirar a arguida C………. de sua casa.
Ouvida a arguida C………., esta referiu que a casa em causa também é da arguida D………., e que no dia 25.12., o B………. já tinha aberto a porta e porque se encontrava entreaberta entraram. O assistente quando a viu disse “não és bem-vinda a esta casa e por isso vais sair”, a arguida pediu-lhe que deixasse entregar os presentes de Natal à menina e que a deixasse assistir à abertura, tendo-lhe o mesmo respondido que tinha de se ir embora, por não ser bem-vinda. A arguida respondeu-lhe que só saia a mal porque a casa também era da sua prima, ao que a prima e arguida D………. anuiu. Assim, ficou ali a assistir os presentes até que a determinada altura o assistente lhe disse “já que estás aqui podes sentar-te na cadeira” e disse-lhe também para se sentar à mesa.
Acerca dos factos ocorridos neste dia, foi ouvido o agente da PSP que foi chamado ao local e que fez constar na “participação” de fls. 144 dos autos, as informações que lhe forma transmitidas, não tendo presenciado quer a chegada das arguidas a casa do assistente, quer a saída da mesma. (cfr. fls. 165).
Ora, perante tais factos temos, por um lado, que a arguida C………. entendeu o consentimento dado pela sua prima, a arguida D………., como um consentimento válido para ali permanecer.
Coloca-se assim a questão de se saber se este consentimento dado pela arguida D………. à arguida C………. é válido.
Para responder a tal pergunta temos que saber, in casu, quem é o portador do bem jurídico.
Como já vimos, o portador do bem jurídico é aquele a que assiste o domínio e a disposição sobre o espaço da habitação, seja qual for o seu fundamento jurídico: um direito real, uma relação obrigacional ou uma situação de direito público. Decisivo é que aquela posição seja conforme ao direito. Por outro lado, não tem que haver correspondência entre o portador do bem jurídico-penal e o detentor de posições jurídico-civilmente protegidas (como proprietário, possuidor, etc.) sobre o espaço da habitação.
Ora, no presente caso, quer o assistente, quer a arguida D………. avocam a qualidade de titulares de um direito de retenção sobre a fracção em causa e como tal, ambos têm o direito a fazer dela a sua habitação, sendo que a arguida já ali habitou.
Contudo, no dia em causa - 25.12.06- o casal encontrava-se separado de facto e quem residia na casa de morada de família era apenas o assistente e a menor, filha de ambos.
Assim, afigura-se-nos que a habitação da arguida D………., penalmente tutelada, terminou com a sua saída de casa, ocorrendo, nessa altura, o termo efectivo daquela esfera de privacidade e segredo (cfr., neste sentido, “Comentário Conimbricense do Código penal”, tomo I, pág. 704).
Assim, tem sido a opinião da jurisprudência, a título de exemplo, o Acórdão do TRP, de 20.02.02, pº 0111124, in www.dgsi.pt refere que “tendo um co-titular de uma casa deixado de a habitar há mais de um ano e passando a mesma a servir de habitação de outro co-titular, não pode o primeiro aí penetrar sem o consentimento do segundo(...)”
No entanto, a arguida C………. agiu convencida que a arguida D………. era também “proprietária” da casa de morada de família, nas suas palavras, “a casa era dela também”, pelo que ao dar-lhe autorização para entrar e nela permanecer, legitimava a sua actuação.
Acerca da validade do consentimento de um dos portadores do bem jurídico, a doutrina e a jurisprudência tem entendido que: “Há casos em que a habitação pertence em comum a várias pessoas (v.g. cônjuges (…). O principio é aqui a igualdade tanto no plano interno como externo: o consentimento de qualquer dos titulares será bastante para só por si e mesmo com a oposição de outro ou outros - legitimar a entrada de terceiros”(ob. citada, pág. 705 e Acórdão do STJ de 23.03.94 aí citado)
Acresce que, a doutrina tem entendido que a concordância do portador do bem jurídico afasta a responsabilidade do agente a título da violação do domicílio em qualquer uma das modalidades. Trata-se de um caso de acordo que exclui a tipicidade (cfr. Costa Andrade, in “Consentimento”, pág. 362 e ss.).
Ora, afigura-se-nos que, no que concerne à arguida C………., estamos perante um erro sobre a ilicitude.
Preceitua o art. 17º do Código Penal que:
1 - Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
2 - Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada.
Ora, atendendo a que a arguida C………. sabia que o assistente e arguida D………. são casados, que a casa “era dos dois” e embora separados de facto, ela ainda era “dona” da mesma, afigura-se-nos que ao ter como válido o consentimento da sua prima, a arguida C………. actuou com o cuidado que uma pessoa portadora de uma recta consciência ético jurídica actuaria. Aliás, tal entendimento de que o consentimento da arguida D………. era válido foi perfilhado pela Digna Magistrada do Ministério Público no seu douto despacho de arquivamento.
Pelo exposto, entendemos que o erro da arguida não lhe é censurável.
E mesmo que assim não se entenda, a versão da arguida atentas as circunstâncias expostas, e à posição do arguido ora dizendo-lhe que tinha que se retirar ora convidando-a a sentar-se numa cadeira e à mesa, não foi uma posição concludente e clara no sentido de que a arguida C………. tinha que se retirar, pelo que, faltando este elemento do crime, tornam-se despiciendas tecer quaisquer outras considerações, por não se verificar o tipo de ilícito em causa.

Concluindo:
A ponderação de todos os elementos de prova coligidos em sede de Inquérito e em sede de instrução, supra referidos, relacionados e conjugados entre si, resulta que, no presente caso, os indícios recolhidos não são, de todo, suficientes para a decisão de submeter a causa a julgamento, já que se assim fosse, a absolvição será mais provável do que a condenação, sendo que o non liquet na questão da prova sempre terá de ser valorado a favor do arguido.
*
8.
Em face do exposto, por se entender que não foram recolhidos indícios suficientes da verificação dos pressupostos de que depende a aplicação às arguidas de uma pena, por virtude da imputação às mesmas dos factos constantes do Requerimento de abertura de Instrução, por não se indiciar, desde logo, o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do crime de violação de domicilio e de introdução em lugar vedado ao público, p. e p., respectivamente, pelos art.s 190º e 191º do Código Penal, nem de qualquer outro ilícito criminal, decido, ao abrigo do disposto no art. 308º, n.º 1 do Código de Processo Penal, não pronunciar as arguidas C………. e D………., pelos factos e disposições legais constantes do RAI e, em consequência, determinar o oportuno arquivamento dos autos”.
IV
Apreciando:
1. Em suma, decidiu o tribunal recorrido não pronunciar as arguidas porque ambas agiram numa situação de erro sobre a ilicitude, não censurável, que exclui o dolo.
Concordando-se com a decisão final de não pronúncia, parece-nos, no entanto, que a solução jurídica pode e deve assentar noutros fundamentos.
Diz o artigo 190º do Código Penal que:
“1. Quem, sem consentimento, se introduzir na habitação de outra pessoa ou nela permanecer depois de intimado a retirar-se é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias. (...)”.
Refere-se e bem no despacho impugnado que o bem jurídico protegido com esta incriminação “é a privacidade/intimidade. Que só é protegida face a agressões qualificadas pela exigência de violação de uma esfera pessoal espacialmente limitada e fisicamente assegurada: a habitação”[2].
Por sua vez, “o bem jurídico analisa-se …numa dupla dimensão: uma dimensão formal (a ultrapassagem de um espaço fisicamente assegurado e hoc sensu a violação da posição de domínio que confere ao portador concreto o direito de admitir e excluir); e uma dimensão material, correspondente aos valores ou interesses pertinentes à privacidade/intimidade. Esta última uma dimensão cujo peso e hermenêutico pode ser determinante na definição da compreensão e alcance de muitos elementos da factualidade típica (v. g. objecto da acção, titular do direito, início e termo do direito, etc.)”[3].
O objecto da acção é a habitação, sendo esta o espaço fisicamente fechado - quatro paredes e um telhado -, efectivamente reservadas ao alojamento de uma ou várias pessoas, nomeadamente de uma família, associada, na sua forma mais paradigmática, à casa. Ou, no dizer de FECHNER[4], “a habitação é o pedaço mais visível do espaço reservado ao indivíduo”.

2. Definido e delimitado o bem jurídico protegido, cumpre agora averiguar do seu titular, no caso que nos ocupa.
Segundo a alegação do recorrente, é ele o seu portador, na medida em que a arguida D………., sua mulher, abandonou a casa no dia 5 de Outubro de 2006, sem qualquer intenção de regressar, ficando a viver na casa, o assistente e a filha.
E assim foi igualmente entendido pelo tribunal recorrido que, apoiando-se na doutrina de Costa Andrade, in Comentário Conimbricense do Código Penal, fls. 704 e na jurisprudência do ac. deste Tribunal da Relação do Porto de 20.2.2002, proferido no processo 0111124, afirma que “a habitação da arguida Elisabeth, penalmente tutelada, terminou com a sua saída de casa, ocorrendo, nessa altura, o termo efectivo daquela esfera de privacidade e segredo”.
Ora, neste particular, é diferente o nosso entendimento, na medida em que, com os elementos que o processo proporciona, não é possível nem legítimo concluir que a recorrida D………. deixou de ter qualquer tutela ou protecção quanto à casa que até então era a casa da família, o designado lar conjugal, onde coabitavam ela, o assistente e a filha.
Entre o assistente e recorrida D………. existe um vínculo[5] e forte, que não pode ser considerado indiferente: o matrimónio.
Do casamento entre o assistente e a recorrida nasceram direitos e obrigações, que são relevantes e que devem ser atendidas na dinâmica do relacionamento entre ambos e essencialmente no enquadramento jurídico da conduta da recorrida D………. .
“O casamento baseia-se na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges” - artigo 1671º, nº 1, do Código civil.
E “a direcção da família pertence a ambos os cônjuges…” - nº 2, do mesmo preceito.
“Os cônjuges devem escolher de comum acordo a residência da família atendendo, nomeadamente, às exigências da sua vida profissional e aos interesses dos filhos e procurando salvaguardar a unidade da vida familiar” - artigo 2673º, nº 1, do Código Civil -, devendo os mesmos adoptar esta residência - nº 2, do mesmo preceito.
De entre os deveres conjugais, é sabido que constam os de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.
Significa tudo isto que, a residência da família e a residência dos cônjuges, é um facto relevante considerado pelo legislador, atribuindo-lhe mesmo efeitos e protecção, no que respeita à sua eventual disposição ou transmissão, pressupondo ou exigindo sempre o consentimento de ambos: v. artigos 1682º-A, nº 2 e 1682º-B, ambos do Código Civil.

3. Contrariamente ao alegado pelo assistente, a arguida D………. diz que saiu da casa de morada de família, com a filha, em virtude de estar a ser vítima de maus tratos pelo marido, ora assistente - declarações de fls. 24 e 25 dos autos.
Não permitem estes autos apurar das verdadeiras razões da saída da arguida da casa de morada de família, nem se conhece qual foi, exactamente, a evolução da situação jurídica deste casal após a ocorrência dos factos que originaram este processo bem como qual a situação actual. Embora ajudasse a perceber melhor, não se afigura de todo imprescindível para a apreciação do recurso.
Facto assente é que, ou de motu próprio ou devido aos maus tratos, a arguida saiu da casa de morada de família com a filha, continuando o assistente a morar na casa.
E na sequência desta saída, em 27 de Novembro foi fixado provisoriamente o poder paternal da filha do casal, nos termos expressos na certidão de fls. 178 e 179.
Acontece que a simples separação de facto entre estes cônjuges, não faz cessar de imediato o casamento, que se mantém, igualmente se mantendo os deveres conjugais[6], regulando o legislador o caso concreto do dever de assistência, nos termos do artigo 1675º, do Código Civil, sendo a regra, a da manutenção, se a separação não for imputável a qualquer dos cônjuges.
De entre os deveres conjugais e no que ao caso interessa, persiste o de coabitação.
Este traduz-se no dever de fazer vida em comum, debaixo do mesmo tecto e abrange o designado “débito conjugal”, o qual se traduz, por sua vez, no dever de cada um dos cônjuges ter relações de sexo com o outro - v. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. IV, 2ª edição, fls. 257 e 258.
Não se considerando findo ou suspenso por inexistência de divórcio, conforme se referiu na nota de rodapé anterior (6), também a simples separação de facto não o fez cessar.
Ora, conjugando todos estes factos e disposições legais e o que as regras da experiência nos ditam, em que não raras vezes após um período[7] de separação entre cônjuges existe uma reconciliação entre ambos, não tem em nosso entender qualquer base legal a premissa assumida pelo assistente de que, com a saída da arguida D………. no dia 5 de Outubro de 2006, a mesma deixou desde logo, a partir daquela data, de poder entrar na casa de habitação ou de morada de família, sem o consentimento do assistente.
Assistente e arguida já viviam juntos, como marido e mulher, há mais de nove anos. Tinham a sua casa de morada de família, onde ambos viviam com a filha do casal. Por desavenças conjugais, surgiu uma separação física de ambos. Mas tal atitude da arguida, ainda que não apoiada material e processualmente em termos de imputação de culpa, ao assistente[8], não impede que a mesma, na sua qualidade de cônjuge, possa ter acesso à casa de morada de família, por ter perdido o direito de aí se deslocar ou pernoitar.
Separação de facto entre cônjuges é uma coisa; outra, diferente, é o uso e fruição da casa de morada de família. É que, mesmo em situação de separação, a casa pode ser fruída por ambos os cônjuges. Não existe qualquer impossibilidade legal ou física para que assim não possa ser.
A não ser que os cônjuges, expressamente, por acordo, estipulem um regime diferente, nomeadamente acordem que apenas um deles passará a habitar a casa que é do casal.
Não pode o assistente entender e concluir como concluiu, que com a saída da arguida, a mesma deixou de poder regressar à habitação, em qualquer circunstância, quer para usufruir de alguns bens pessoais que aí ainda mantivesse, quer para aí pernoitar, quer para aí receber algum amigo ou familiar[9].
Uma relação conjugal é uma relação, por natureza e em regra, de emoções, o que significa que o que hoje e agora é amor, no minuto ou dia seguinte pode ser ódio e vice-versa.
Pelo que a decisão de sair de casa em determinado momento, pode não significar abdicar ou prescindir de querer continuar a habitar/usufruir a casa que até então foi do casal, quer em comunhão com o outro cônjuge[10], quer em regime de exclusividade.
Na verdade, apesar de ter saído de casa, nada impedia a arguida D………. - a não ser que houvesse acordo com o assistente noutro sentido -, de requerer ao tribunal o direito a habitar a casa de morada de família, quer a título provisório, quer a título definitivo - v. artigos 1793º, do C. Civil e 1413º, do Código de Processo Civil, caso o pedido seja feito sem ser na pendência de acção de divórcio e 1407º, nº 7, deste último diploma, caso seja feito na pendência de acção de divórcio litigioso, sendo certo que, na acção de divórcio por mútuo consentimento, é condição daquele, o acordo dos cônjuges, nesta matéria.

4. Sendo este o enquadramento legal, entendemos que, no fundo, a arguida agiu e portou-se de acordo com o mesmo: a sua saída de casa, até pelas razões por que o fez, não significou que quisesse e tivesse abdicado de ter acesso à casa de habitação ou lar conjugal, sobretudo depois de ter sido fixado provisoriamente o poder paternal da filha e a mesma ter ficado com o direito de visitas.
Entendeu a arguida que podia exercer esse direito, nomeadamente com o acesso à casa, desde logo como forma de melhor exercer esse direito. A arguida não só o declarou expressamente ao assistente como se portou como tal, exigindo a entrada em casa.
Toda a ocorrência dos factos e respectivo enquadramento jurídico, tem como pano de fundo o factor tempo, na medida em que tudo acontece ou ocorre decorridos apenas alguns dias, no máximo, dois meses, da saída da arguida de casa, tendo ainda como pressuposto que, antes destes factos, a arguida já tinha ido a casa visitar a filha, sem quaisquer conflitos.
Ou seja, todo o circunstancialismo ocorre ainda numa altura que se pode designar de transitório, entre uma coabitação pacífica para uma separação de facto stricto sensu, sem nada estar ainda definido entre os cônjuges, incluindo o direito a habitar a casa de morada de família.
Esta situação não é comparável àquela ou àquelas em que a separação já perdura no tempo, meses, anos ou mais, em que, por acordo expresso ou ainda que por mero acordo tácito, os cônjuges assumem a separação como duradoura ou definitiva e passam a viver em lugares diferentes, cada um com a sua residência, em separado.
Temos para nós como certo que, ainda que juridicamente casados e ainda que a casa, bem comum do casal ou arrendada, passou a ser só a residência de um deles, passou a ter também uma protecção diferente.
Enquanto que na vivência comum, na casa do casal, os cônjuges partilham não só o espaço físico mas a sua privacidade/intimidade, havendo consentimento e aceitação recíproca nesta partilha, com a sua separação mais ou menos prolongada, essa intimidade e partilha deixou de ter sentido, passando a ter tratamento de terceiros entre si.
E não deixa de ser relevante que mesmo para efeitos de fundamento de divórcio litigioso, a lei só atribui, por enquanto, efeitos jurídicos, à separação de facto superior a três anos.
Aceita-se, no entanto, que para efeitos de protecção do domicílio de qualquer cônjuge, tendo em conta o bem jurídico protegido, o prazo do término da tutela da habitação para aquele que sai, seja diferente.
Pressuposto essencial é que na sequência dessa separação exista também uma clara definição/separação de domicílios, aceite pacificamente entre os cônjuges, sem qualquer referência temporal, que poderá coincidir até com a data da saída de qualquer deles de casa ou definida pela perduração da separação no tempo, que traduza uma clara separação de vivências e intimidade entre os cônjuges.
Julgamos que deverá ser com este sentido que deve ser interpretada a jurisprudência citada quer pelo assistente quer pela decisão recorrida, pois em ambas é apontado o período aproximado de um ano de separação de facto:
- Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 21.6.1990, proferido no processo 041472, podendo ser consultado em www.dgsi.pt.jstj - fls.72;
- Ac. desta Relação do Porto de 11.6.2001, citado pelo assistente a fls 75 bem como na decisão recorrida, podendo ser consultado em www.dgsi.pt.jtrp, sendo o teor do sumário o seguinte:
“tendo um co- titular de uma casa deixado de a habitar há mais de um ano e passando a mesma a servir de habitação de outro co-titular, não pode o primeiro aí penetrar sem o consentimento do segundo(...)”.
Por sua vez, exemplificativo do que se disse sobre o direito a habitar a casa de morada de família por qualquer dos cônjuges, decidiu-se no ac. deste Tribunal da Relação do Porto de 29.1.2003, proferido no processo nº 0241383, podendo ser consultado em www.dgsi.pt.jtrp, o seguinte:
“Em caso de divórcio por mútuo consentimento, o dever de coabitação fica suspenso a partir da primeira conferência.
Assim, até tal momento, a casa de morada de família é considerada a residência de ambos os cônjuges, podendo cada um deles nela entrar e permanecer por direito próprio, não obstante existir uma separação de facto do casal.
Deste modo, tendo o arguido entrado na dita casa, antes da primeira conferência citada, não existe violação de domicílio a punir nos termos do artigo 190º do Código Penal, ainda que, de facto, já se encontrasse separado da mulher”.

5. Considerações que afastam qualquer ilicitude da conduta da arguida D………., por a mesma estar legitimada, no período em que o faz - 25 de Dezembro de 2006 -, a entrar na casa de morada de família independentemente da vontade ou consentimento expresso do assistente.
Situação que legitima deste modo também a entrada e presença da arguida C………. na casa, pois esta só o faz por ter o consentimento expresso/solicitação da arguida D………., que se fez acompanhar da prima por recear pela sua segurança e integridade física, resultando das declarações da testemunha E………., ouvida a fls. 169, que também esta a acompanhou em duas ocasiões a casa para visitar a filha.

6. Ademais, no que respeita à conduta da arguida D………. quanto ao dia 25 de Dezembro, mesmo que se entendesse que não poderia já entrar na casa sem o consentimento expresso ou tácito do assistente, resulta indiciado nos autos que este consentimento existiu, discordando apenas da entrada da arguida C………. e nomeadamente que a D………. a tivesse persuadido a entrar.
A optar-se por este entendimento, sempre a conduta da D………. estaria legitimada pelo consentimento do assistente e a ilicitude da conduta da arguida C………. excluída pelo erro não censurável, nos termos exactamente apreciados pelo tribunal recorrido, para cujos fundamentos se remete, ao abrigo do artigo 425º, nº 5, do Código de Processo Penal, aplicável a este acórdão, por analogia.
*
O artigo 308º, nº 1, do Código de Processo Penal, diz-nos que “ se até ao encerramento da instrução tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, profere despacho de não pronúncia “.

Não tendo sido recolhidos aqueles indícios de verificação dos pressupostos de que depende a aplicação às arguidas de uma pena, deverão estas não ser pronunciadas.

V
Decisão
Por todo o exposto, decide-se negar provimento ao recurso.

Custas a cargo do recorrente com a taxa de justiça que se fixa em 8 (oito) UCs.

Porto, 14/07/2008
Luís Augusto Teixeira
José Alberto Vaz Carreto

_______________________
[1] Embora no requerimento de abertura de instrução o assistente impute às arguidas outros factos, nas conclusões de recurso do despacho de não pronúncia limita estas aos factos do referido dia 25 de Dezembro.
[2] Manuel da Costa Andrade, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte especial. Tomo I, pág. 701.
[3] Mesmo autor e obra, fls. 702.
{4] Referenciado por Costa Andrade, in ob. Cit., fls. 702.
[5] Pelo menos existia à data da prática dos factos, ocorridos em 25 de Dezembro de 2006, não constando dos autos outros elementos que nos informem sobre a situação jurídica actual, neste aspecto, sendo certo que a mesma se pode manter ou ter evoluído para uma situação de divórcio, entre outras. De qualquer modo, relevante para apreciação da questão, é a situação jurídica e fáctica dos mesmos, àquela data.
[6] Quer o divórcio quer os deveres conjugais apenas cessam com a dissolução do casamento, decretado por divórcio ou dissolvido por morte, nos termos dos artigos 1788º e 1789º, ambos do código Civil. E no que ao divórcio respeita, deveria diferenciar-se consoante se tratasse de divórcio litigioso - em que só a sentença transitada em julgado produzia efeitos -, ou de divórcio por mútuo. Neste, antes da alteração do DL nº 272/2001, de 13 de Outubro, que revogou, entre outros, o artigo 1777º, do C. Civil, que previa a realização da segunda conferência, o dever de coabitação só ficava suspenso a partir da realização da primeira conferência, ao abrigo do artigo 1776º, nº 3, do mesmo diploma legal.
[7] Que pode atingir não só dias como até meses.
[8] Embora a crer no que a arguida diz, de ser vítima de maus tratos, essa imputação exista.
[9] Pois pode acontecer que, por força da necessidade de sair de casa para não ser vítima de qualquer ofensa ou maus tratos, a cônjuge mulher tivesse que ir viver para um quarto ou residencial sem as condições de aí receber familiares e amigos e mantivesse interesse em recebê-los em casa, como sempre.
[10] Podendo esta partilha voltar a ser em regime de coabitação pura ou apenas de partilha do mesmo espaço físico, a demais vida em separado.

SINOA

A respeito da nomeação de um único defensor a diversos arguidos no âmbito do SINOA , informo que tal deverá ser feito através de uma primeira solicitação de defensor em relação a um deles, averbando-se depois no "cancelar" o defensor indicado as demais arguidos.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Princípio da Indivisibilidade da Queixa

Deixo à consideração dos colegas a seguinte situação:

António furta da carteira do pai 5oo euros, o que faz de forma concertada e em comunhão de esforços com Berta.

Estamos perante uma co-autoria de crime de furto p. e p. pelo art. 203º, n.º 1, do Cód. Penal.

Como António é filho do ofendido, cumpre aplicar a regra do art. 207º, al. a), do Cód. Penal, que estabelece que "No caso do artigo 203º (...) o procedimento criminal depende de acusação particular se: a) O agente for (...) descendente (...) da vítima (...) ".

Mas Berta não é irmã de António.

A questão a resolver é a seguinte:

- Sendo o crime particular em relação a António, sê-lo-á também em relação a Berta ?
- Pelo facto de intervir Berta, o crime passa a semipúblico ?

No caso em apreço a ilicitude é a mesma, porquanto a moldura penal é a mesma ?

A diferença reside na natureza do crime.

Se se entender que a ilicitude permanece inalterada, não tem aplicação o art. 28º, n.º 1, do Cód. Penal.

Como resolver a questão ?

Se o crime não revestir natureza particular em relação ambos, terá de ser semipúblico também em relação a ambos, em violação do art. 207º, al. a), do Cód. Penal ?

Outra solução seria ser particular em relação ao filho e semipúblico em relação a Berta, pelo que se o pai não apresentasse queixa ou não formulasse acusação particular em relação ao filho, também se não poderia perseguir Berta ( arts 115º, n.º 2, e 116º, n.º 3, do Cód. Penal ).

Como resolver a questão ?

Poder-se-á entender que, afinal, a desgraduação de um crime semipúblico em particular é ainda uma questão de ilicitude, pelo que o art. 28º, n.º 1, do Cód. Penal tem aplicação, no sentido de que a qualidade de filho beneficia o co-autor ?

O art. 28º, n.º 1, do Cód. Penal estabelece:

"1. Se a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependerem de certas qualidades ou relações especiais do agente, basta, para tornar aplicável a todos os comparticipantes a pena respectiva, que essas qualidades ou relações se verifiquem em qualquer deles, excepto se outra for a intenção da norma incriminadora ".

Lendo o trabalho da Prof. Teresa Beleza, vejo que exclui a aplicabilidade do art. 28º, n.º 1, do Cód. Penal.
Como resolver ?

Concordando que a questão da ilicitude permanece inalterada com o art. 207º do Cód. Penal, não posso acompanhar quem defenda que o queixoso poderá escolher perseguir Berta e não o filho. Os arts. 115º, n.º 2, e 116º, n.º 3, do Cód . Penal estabelecem a regra inequívoca de que em caso de comparticipação o queixoso não pode escolher quem quer perseguir criminalmente - trata-se de uma decorrência do princípio da igualdade e não há motivo para tratar de forma desigual uma situação em tudo igual.

Assim, ou o procedimento criminal prossegue em relação a ambos ou é arquivado em relação a ambos.

Ora, sendo a questão da ilicitude a mesma, sustenta a doutrina que o art. 28º, n.º 1, do Cód. Penal não se aplica.

Importa, pois, saber se o facto de um crime revestir natureza particular e outro natureza semipública cria ou não uma situação de desigualdade de tratamento.

Não cria, pois que a moldura abstracta da pena é a mesma.

O facto de o procedimento criminal de um crime depender de queixa e o outro depender de queixa, de constituição como assistente e de acusação particular não tem como consequência a conversão de ambos os crimes em crimes semipúblicos ou de ambos os crimes em crimes particulares.

A solução deverá ser encontrada nos moldes indicados acima, ou seja, o MP pode acusar um dos furtos e o pai terá de se constituir assistente e formular acusação particular pelo crime de furto cometido pelo filho, sendo certo que se não o fizer, os autos se arquivam em relação a ambos os arguidos.

Ou seja, tenho para mim que a questão é meramente processual e terá de ter os remédios do direito processual penal, conjugados com o acima sustentado por referência aos arts 115, n.º 2, e 116º, n.º 3, do Cód. Penal.

HOMICÍDIO QUALIFICADO «ATÍPICO» ( NEGAÇÃO, NO CASO CONCRETO )

Acórdão do STJ de 03-07-2008 [Ver ficha original em www.dgsi.pt]

I - O legislador, depois de, no art. 131.º do CP, proceder à descrição do tipo fundamental de homicídio, previu, no artigo seguinte, uma forma agravada de homicídio, fazendo uso da combinação de um critério generalizador - a especial censurabilidade ou perversidade - determinante dum especial tipo de culpa, com a técnica dos exemplos-padrão.
II - Segundo o MP recorrente, as circunstâncias susceptíveis de, no caso dos autos, indiciarem uma especial censurabilidade ou perversidade não integram nenhum exemplo-padrão; a agravação do crime seria obtida por aplicação directa do n.º 1 do art. 132.º do CP, constituindo um homicídio qualificado atípico.
III - Os exemplos-padrão têm uma função delimitadora dos casos atípicos, deles se devendo apreender não apenas o seu especial grau de gravidade, mas também a sua própria estrutura valorativa (Ac. de 15-05-2002, Proc. n.º 1214/02 - 3.ª). Por poder afectar o princípio da legalidade, não se permite, o apelo directo à cláusula de especial censurabilidade ou perversidade, sem primeiramente a fazer passar pelo crivo dos exemplo-padrão e de, por isso, comprovar a existência de um caso expressamente previsto ou de uma situação valorativamente análoga (Ac. de 13-07-2005, Proc. n.º 1833/05 - 5.ª).
IV -No caso em análise, o circunstancialismo que, segundo o recorrente, justifica a qualificação do crime resulta dos seguintes aspectos:
a) a primeira agressão, com uma garrafa de vidro, ter sido levada a efeito sem aviso prévio, quando o ofendido se encontrava de costas, sem possibilidade de defesa;
b) a asfixia da vítima, conseguida pela obstrução das vias respiratórias através da pressão da mão direita, ser demonstrativa de uma elevada insensibilidade do arguido perante a vida humana, que retirou à vítima, olhos nos olhos;
c) o furto de objectos pertencentes à vítima demonstrar que o arguido tem uma personalidade fria, calculista e insensível.
V - A atitude do agente é altamente reprovável, não só por pôr em causa o bem supremo que é a vida, mas também por a agressão, que culminou com a morte por asfixia, ter sido iniciada de surpresa, dificultando à vítima a possibilidade de defesa e colocando-a à mercê do arguido.
VI -Tal situação, não podendo ser tida como análoga à do exemplo-padrão da al. b), não mostrando uma grande persistência na intenção de matar, nem se tendo provado que a morte foi levada a cabo com o objectivo de facilitar a apropriação dos bens e dinheiro da vítima, não atinge o especial grau de censurabilidade ou perversidade que o legislador considerou inerente ao homicídio qualificado.
VII - (...)
Proc. 08P301
Relator: ARMÉNIO SOTTOMAYOR

Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas

Lei n.º 58/2008, D.R. n.º 174, Série I de 2008-09-09
Assembleia da República
Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas


Este diploma revoga o Dec. Lei n.º 24/84, de 16.01, alterando, por exemplo, os prazos de prescrição do procedimento disciplinar.
Aplica-se aos magistrados, devidamente adaptado.


A presente lei entra em vigor na data do início de
vigência do Regime do Contrato de Trabalho em Funções
Públicas, aprovado nos termos do artigo 87.º da Lei n.º 12-A/2008. DR 41 SÉRIE I, 1º SUPLEMENTO de 2008-02-27 (Assembleia da República ), que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Cânabis, canabis, cannabis ou canábis ?

Consultei "ciberduvidas.sapo.pt " e extraí o seguinte:

"A palavra está dicionarizada canábis no Dicionário 2001 da Academia portuguesa, com a indicação de vir do inglês cannabis.
Mas no Dicionário Etimológico, de José Pedro Machado, depreende-se que a palavra deriva do latim cannabis, com o segundo a breve. Logo, a acentuação tó[ô]nica seria feita em ¦Ka¦. Aliás, a tó[ô]nica na palavra inglesa também é feita em ¦Ka¦, concordando com a grafia grega kánnabis.
No Vocabulário da Academia Brasileira de Letras está registado cânabis. O dicionário Houaiss-por. e. aceita as duas variantes: cânabis e canábis (mas remete esta para aquela).
Não me parece corre(c)ta na língua a palavra pronunciada como oxítona: *¦kanabís¦.
Atendendo à etimologia do termo e à sua relação com cânhamo, prefiro também a grafia cânabis, proparoxítona, com vogal semifechada.
Reconheço, no entanto, que a comunidade portuguesa pronuncia com frequ[ü]ência ¦Kanábis¦. Ao seu dispor,
D´Silvas Filho"

Ou seja, diremos CÂNABIS OU CANÁBIS.

IDTP, IP

A refência feita nos arts 62º e 74º do Decreto-Lei n.º15/93, de 22 de Janeiro, na redacção introduzida sucessivamente pela Lei n.º45/96, de 03.09, Lei n.º30/00, de 29.11, Lei n.º101/01 e 104/04 de 25-08, Decreto-Lei n.º323/01, de 17.12, Lei n.º11/04, de 27.03 e Decreto-Lei n.º47/03, de 22.08, deve ser feita ao Instituto da Droga e da Toxicodependência, I.P., por força das disposições conjugadas dos arts. 25º, n.ºs 1 e 2, do Dec. Lei n.º 31/99, de 05.02, e Dec. Lei n.º 269-A/02, de 29.11, e Dec. Lei n.º 172/05, de 14.10.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Nomeação de Defensor - informação do Habilus

Informa-se que o H@bilus foi actualizado para dar suporte ao novo modelo de nomeação de patrono e de defensor nos termos da Portaria 10/2008 de 3 de Janeiro.

Assim os pedidos de nomeação passam a ser feitos de forma automática, através do Habilus, o qual enviará um pedido electrónico de nomeação ao SINOA - Sistema de Informação da Ordem dos Advogados que é a entidade responsável pelo sistema informático de suporte às nomeações.

NOTA IMPORTANTE: uma vez que o sistema de nomeação SINOA é também utilizado por outros órgãos de polícia criminal (GNR, PSP, SEF, ...), nos casos de nomeações para diligências urgentes no âmbito de escalas de prevenção, deverá sempre ser verificado junto do órgão de polícia criminal se este já procedeu ao pedido de nomeação e respectivo contacto com o Advogado nomeado.Neste caso o utilizador NÃO deverá proceder à nomeação urgente para que se evite uma nova nomeação para o mesmo beneficiário, devendo assim o advogado nomeado através do pedido electrónico do órgão de polícia criminal, ser inserido normalmente como mandatário do beneficiário recorrendo à tabela de Mandatários existente no Habilus.

Para proceder a um pedido electrónico de nomeação de patrono ou defensor oficioso:
No contexto de um processo, na árvore de intervenientes, clique com o botão direito do rato sobre o nome do beneficiário da nomeação;
Clique na opção "Inserir dependente";
Ao seleccionar Defensor Oficioso ou Patrono surgirá uma caixa de diálogo com as seguintes opções:
URGENTE - esta opção deverá ser unicamente utilizada nos casos de nomeações para diligências urgentes no âmbito de escalas de prevenção;
NORMAL - restantes situações, não urgentes, em que seja necessária a nomeação de um advogado;
CANCELAR - para proceder à inserção de um Advogado constante da tabela de Mandatários existente no Habilus.



Comentário:

O despacho a formular na acusação em que se torna necessário nomear defensor será o seguinte:


"Proceda à formulação de pedido electrónico de nomeação de defensor ao arguido ao SINOA, atento o disposto no art. 64º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal e art. 2º da Portaria n.º 10/2008, de 03.01.
Comunique oportunamente, nos termos do art. 66º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, sendo ao arguido com a identificação do ilustre defensor e respectivo escritório.
Notifique o arguido de que fica obrigado, caso seja condenado, a pagar os honorários do defensor oficioso, salvo se lhe for concedido apoio judiciário, e que pode proceder à substituição do defensor mediante a constituição de advogado(a) ( cf. art. 64º, n.º 4, do Cód. Proc. Penal )."

Nota: não é necessário comunicar a nomeação à Ordem dos Advogados, salvo para nomeações urgentes - cf. art. 3º, n.º 3, da Portaria referida.

Processo Abreviado. Art. 391.º-D do CPP/revisto. Prazo de 90 dias para julgamento. Nulidade insanável. Trânsito em julgado

ACRL de 02-07-2008 Processo nº 5748/08 3ª S.

I – Proferida decisão sobre uma concreta questão processual, fica esgotado o poder jurisdicional do julgador, a esse respeito, no processo em causa, que se encontra, assim, impedido de a alterar – nisto se consubstanciando o caso julgado formal previsto no art. 672.º do CPC;
II – Por isso, e independentemente da questão de saber se o prazo de 90 dias a que se reporta o art. 391.º-D do CPP/revisto é ou não meramente ordenador, o trânsito em julgado do despacho judicial que, em processo especial abreviado, lhe conferiu natureza peremptória e, por isso, decidiu que a sua inobservância importa a nulidade insanável prevista no art. 119.º, alínea f) do CPP e implica a subsequente tramitação dos autos sob a forma comum, tem força obrigatória dentro do processo, obstando a que o mesmo ou outro juiz o possa alterar. Uma vez transitado tal despacho, esse “quid” espelha acto de soberania, que se impõe dentro do processo a todos, inclusive ao próprio Juiz, e isso obsta a que as questões por ele resolvidas sejam novamente suscitadas no mesmo processo.
III – Por outro lado, a prolação daquele despacho não implica qualquer desaforamento uma vez que a competência dos Juízos criminais para o julgamento sobre a forma comum já estava predeterminada, e essa antecedência já existia igualmente para a situação de necessidade de reenvio do processo da forma especial para a forma comum. O que significa portanto que a lei nova não se inseriu nem na individualização do juiz chamado a decidir quando utilizada a forma de processo comum, nem na competência dos Juízes do TPIC para decidir manter a forma abreviada ou ordenar o reenvio à forma comum, nem nos procedimentos de distribuição do processo.~
IV – Por isso, se na sequência do trânsito em julgado do despacho referido em II, os autos forem remetidos aos Juízos Criminais para julgamento sob a forma comum, não há qualquer fundamento normativo para que este Tribunal se declare incompetente para proceder a esse julgamento.

Relator: Rui Gonçalves
Adjuntos: Conceição Gonçalves -
Sumário elaborado por João Vieira

Apreensão de máquina fotográfica. revelação de fotografias. falta de autorização prévia do JIC: prova proibida

ACRL de 16-07-2008 Processo nº 6131/08 3ª S.

I - É de manter o despacho do JIC que indefere a junção aos autos de fotografias reveladas, sem o consentimento do arguido, a partir de um cartão digital contido em máquina fotográfica ao mesmo apreendida, sem que o MºPº ou o OPC tenham solicitado ao JIC prévia autorização para revelar ou juntar as mencionadas fotografias. II - No caso '...regem os arts. 1º, 26º, nº 1 e 32º, nº 8, todos da CRP e o artº 126º, nº 3 do Código de Processo Penal, fluindo dos mesmos proibições de prova com utilização de meios invasivos da privacidade dos indivíduos, as quais têm clara aplicação ao caso dos autos, que se reporta ao conteúdo do cartão de memória digital de uma máquina fotográfica; ou se fosse esse o caso, o conteúdo de um rolo de uma máquina fotográfica'.

Relator: Rui Gonçalves
Adjuntos: Conceição Gonçalves -
Sumário elaborado por Paula Figueiredo

Código das Expropriações

Lei n.º 56/2008, D.R. n.º 171, Série I de 2008-09-04
Assembleia da República
Procede à quarta alteração ao Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, o qual republica.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Cartas de condução do Brasil, Angola, Cabo-Verde: reciprocidade/ Não assim com as de São Tomé e Príncipe

Acórdão da Relação de Lisboa, de 26-03-2008

Relator: CARLOS SOUSA
Processo: 781/2008-3



Sumário:

1. Não basta um reconhecimento de facto da validade de cartas de condução portuguesas, em situação idêntica, por parte do Estado estrangeiro emitente da carta de condução do arguido – no caso, a República de São Tomé e Príncipe.
2. Resulta da ponderação e apreciação das várias alíneas daquele nº 1 do artº 125º do C.Estrada (2005), que exige um acordo de reciprocidade, mediante acto da Administração Pública, relativamente a licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro, tal como ocorre no caso da alínea precedente, em que “... o Estado Português se tenha obrigado a reconhecer, por convenção ou tratado internacional” – vd. al. d) desse nº 1.
3. Esta alínea d) não se aplica ao presente caso já que os Estados que integram os PALOP não aderiram à Convenção de Genebra sobre Trânsito Rodoviário, de 19/09/1949 (cfr. artºs 16º e 17º da Convenção de Viena, de 8/1/1968).
4. Por isso, também na hipótese prevista na al. e), que ora nos ocupa, se exige acto de reconhecimento expresso, por parte da Administração Pública portuguesa, exactamente para efeitos de reconhecimento da validade dos títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro “desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais”




Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa:

"... *
III – Colhidos os vistos, cumpre decidir.
1. O âmbito do recurso é restrito à questão de se saber se o despacho recorrido, ao rejeitar a acusação por considerar inexistir crime, mas antes que os factos descritos na mesma integram somente a prática pelo arguido da contra-ordenação p. e p. pelo artº 125º, nº 1, al. e), nº 4 e nº 7, do C.Estrada (DL 44/2005), violou o disposto no artº 311º nºs 1, 2 e 3, al. d) do CPP (L 59/98).
2. Começamos, assim, por realçar que na acusação do MºPº a factualidade imputada ao arguido era a seguinte:
« 1) No dia 7 de Junho de 2007, pelas 17h00, o arguido A… conduzia o motociclo, com a matrícula XX-XX-XX, pela Rua São José, em Santa Iria da Azóia, quando foi fiscalizado pelo autuante, agente da P.S.P.;
2) O arguido conduzia o veículo indicado sem se encontrar legalmente habilitado para exercer a condução de motociclos na via pública;
3) O arguido é titular de uma carta de condução n.º 25122, emitida em 29.6.2005, pela República Democrática de São Tomé e Príncipe;
4) O arguido agiu deliberadamente, livre e conscientemente;
5) Bem sabia que tal conduta era proibida por lei. »
*
3. Pondera-se, por sua vez, no douto despacho recorrido o seguinte:
« Despacho proferido ao abrigo do disposto no artigo 311º, nº 1, nº 2, al. a), e nº 3, al. d), do Código de Processo Penal:
Entendemos que os factos constantes da acusação merecem um diferente enquadramento jurídico e, consequentemente, sanção diferente se lhes corresponde.
Com efeito, o enquadramento jurídico vertido na acusação pressupõe que a reciprocidade no reconhecimento dos títulos de condução estrangeiros prevista na al. e) do artigo 125º do Código da Estrada, na redacção do Decreto-Lei nº 44/2005, de 23 de Fevereiro, depende de acto da Administração Pública, ou seja, que é uma responsabilidade condicionada.
Tal tese conduziria à condenação criminal dos habilitados com carta emitida por São Tomé e Príncipe se e enquanto a Administração Pública (neste caso, a Direcção-Geral de Viação ou entidade que lhe sucedeu) assim o entendesse.
Ora, sendo certo que a aplicação da al. e) do artigo 125º do Código da Estrada, e do artigo 3º do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, se excluem mutuamente, ou seja, o que não caberá numa caberá noutra, não poderá o intérprete basear a sua opção na existência, ou não, de um acto de Administração Pública.
Sob pena de, então, violar-se o disposto no artigo 1º do Código Penal e, bem assim, a norma constante da al. c) do nº 1 do artigo 165º da Constituição da República Portuguesa, que diz: “É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, (...) c) definição dos crimes, penas, medidas de segurança e respectivos pressupostos, (...)”
Sem prescindir, pensamos também que será de atentar no relatório do recente ACORDO ENTRE A REPÚBLICA PORTUGUESA E A REPÚBLICA DE CABO VERDE PARA RECONHECIMENTO DE TÍTULOS DE CONDUÇÃO (vertido no Decreto nº 10/2007, de 5 de junho), pois que um dos fundamentos para o estabelecimento do referido acordo é, e passamos a citar, “Tendo em conta que a República de Cabo Verde já reconhece, de facto, os títulos de condução portugueses,...”
Ora, tal reconhecimento de facto, existe, de igual modo, pela República de São Tomé e Príncipe, país da entidade emitente do título de condução do arguido. (...)»
Para então se concluir, como já acima relatámos, tendo ainda em conta que “o arguido reside há mais de 185 dias em Portugal”, que os factos imputados na acusação integram somente a aludida contra-ordenação p. e p. pelo artº 125º, nº 1, al. e), nº 4, e nº 7, do C.E.(2005).
*
4. Em situação muito semelhante à ora descrita e na qual se estava perante idêntico despacho de rejeição da acusação do MºPº, já esta Relação de Lisboa e 3ª Secção decidiu dar provimento a recurso do MºPº - cfr. Ac. TRL de 27/09/2006 (Proc. nº 5790/06-3ª, mesmo relator).
Na verdade, a questão suscitada prende-se com a possibilidade de um cidadão titular de carta de condução emitida em país estrangeiro para poder circular legalmente em Portugal depender do reconhecimento pelo Estado Português, por acto administrativo/político, e no exercício da sua soberania, conferir validade ao documento emitido pelo Estado estrangeiro, mormente por acordo de reciprocidade.
Ora, o despacho recorrido basta-se, como vimos, pela afirmação (mas não comprovação) de uma alegada reciprocidade de facto (quod erat demonstrandum!!!), por parte do Estado estrangeiro (emitente da carta de condução detida pelo arguido), pois, segundo ele, subjaz ao disposto na al. e) do nº 1 do artº 125º do Código da Estrada o entendimento de que a reciprocidade no reconhecimento dos títulos de condução estrangeiros, ali prevista, não depende de acto da Administração Pública.
Ao invés, o Ministério Público, ora recorrente (secundado pela Ex.ma PGA, nesta Relação), considera que o preceito constante daquela alínea e) exige a chamada reciprocidade condicionada; ou seja, que haja um acto da Administração Pública (do Estado Português) a reconhecer expressamente a validade daquelas licenças de condução (estrangeiras).
5. Parece-nos evidente que tem razão o ora recorrente (MºPº) na medida em que não basta um reconhecimento de facto da validade de cartas de condução portuguesas, em situação idêntica, por parte do Estado estrangeiro (emitente da carta de condução do arguido – no caso, a República de São Tomé e Príncipe).
Na verdade, é o que resulta da ponderação e apreciação das várias alíneas daquele nº 1 do artº 125º do C.Estrada (2005), que exige um acordo de reciprocidade, mediante acto da Administração Pública, relativamente a licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro, tal como ocorre no caso da alínea precedente, em que “... o Estado Português se tenha obrigado a reconhecer, por convenção ou tratado internacional” – vd. al. d) desse nº 1.
Note-se que esta alínea d) não se aplica ao presente caso já que os Estados que integram os PALOP não aderiram à Convenção de Genebra sobre Trânsito Rodoviário, de 19/09/1949 (cfr. artºs 16º e 17º da Convenção de Viena, de 8/1/1968), como bem alerta o MºPº, recorrente.
Por isso, também na hipótese prevista na al. e), que ora nos ocupa, se exige acto de reconhecimento expresso, por parte da Administração Pública portuguesa, exactamente para efeitos de reconhecimento da validade dos títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro “desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais”.
Assim ocorre relativamente a licenças de condução emitidas pelo Brasil – cfr. despacho da DGV nº 10.942/00 (DR II Série, de 27/05/2000) – ou pela República de Cabo Verde – cfr. Decreto nº 10/2007, de 5 de Junho, publicado no DR I Série; e o mesmo sucede com a República Popular de Angola.
No caso, o arguido conduzia munido de licença de condução emitida pela República Democrática de São Tomé e Príncipe, sendo certo que ainda não ocorreu o exigível reconhecimento da validade destas licenças de condução por parte da Administração Pública portuguesa. Não está, pois, abrangida pela citada al. e) do nº 1 do artº 125º do C.Estrada (2005).
Em suma, como aquele título não o habilita, legalmente, a conduzir em território nacional, significa isto que se indicia nos autos que o arguido cometeu o crime imputado na acusação, de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artº 3º, nº 2 do D.L. nº 2/98, de 3/1.
[ Neste sentido, o Ac. TRL de 12/10/1988, in Colectânea de Jurisprudência, Tomo IV, págs.144 e 145 – consignou que: “Conduz sem título válido, ou indocumentado, quem, domiciliado em Portugal, é apenas titular de uma carta de condução emitida por outro país no qual os cidadãos portugueses, em idênticas circunstâncias, só possam conduzir quando sejam titulares de carta de condução desse país.”]
IV - DECISÃO:
Nos termos expostos, acordam em dar provimento ao recurso, pelo que se revoga o despacho recorrido e ordena-se a sua substituição por outro que receba a acusação do MºPº e designe data para a audiência de julgamento. Sem custas.
Lisboa, 26 de Março de 2008.
(Carlos de Sousa – relator)
(Mário Manuel Varges Gomes)
(Maria Teresa Féria de Almeida)


Comentário:

Ver o Acórdão da Relação de Lisboa, de 19-09-2007
Processo: 5066/2007-3
Relator: RODRIGUES SIMÃO
( publicado neste blogue e extraído de www.dgsi.pt )

Sumário: I – Com a publicação do Despacho n.º 12595/07 (DR II série de 21/06/07) do Director Geral de Viação, os títulos de condução emitidos pela República Popular de Angola, que se encontrem dentro do respectivo prazo de validade, habilitam à condução em Portugal, ao abrigo do art. 125.º, n.º 1, al. e), do CE, pelo prazo de 185 dias.

II – Perante o disposto nos arts. 29.º, n.º 4, da CRP e 2.º, n.º 2, do CP, com a publicação do aludido despacho foram descriminalizadas todas as condutas respeitantes à condução de veículos levadas a cabo em Portugal por cidadãos daquele país angolano, residentes em Portugal, desde que titulares de título de condução válido emitido por Angola.

III – Sendo o arguido, de nacionalidade angolana, detentor de título de condução válido emitido pela República Popular de Angola e residindo no nosso país há mais de 185 dias, ao conduzir veículo automóvel em Portugal comete a contra-ordenação prevista no art. 125.º, n.ºs 1 al. e), 4 e 7, do CE.