terça-feira, 3 de julho de 2007

Liquidação de Herança em Benefício do Estado

Ex.mo Senhor
Juiz de Direito do Tribunal Judicial de…


Em petição para liquidação em benefício do Estado da herança de Júlia …, que foi residente em …, deste concelho e comarca de …,

DIZ o MINISTÉRIO PÚBLICO:

1.º

A referida Júlia … faleceu no dia …/…/…, viúva de José … (doc. n.º 1).

2.º

Quando morreu não tinha ascendentes, filhos, netos, irmãos ou outros parentes sucessíveis.

3.º

Sendo certo que faleceu sem testamento, doação por morte ou qualquer outra disposição de última vontade.

4.º

No inventário n.º …, que correu termos no … Juízo deste Tribunal, coube a Júlia …, interessada nesses autos, a quota de … euros, montante esse que se encontra depositado na Caixa Geral de Depósitos à ordem da mesma, na conta n.º …da agência de … do banco … (doc. n.º 2).

5.º

A sua herança compõe-se apenas de tal dinheiro, não lhe sendo conhecidos outros bens.


Deve, pois, a herança ser declarada vaga para o Estado e proceder-se à sua liquidação.
Para tanto, requer-se a V. Ex.ª que se digne decretar arrolamento (art.º 427.º, n.º 2, do Código de Processo Civil) e mandar citar editalmente quaisquer interessados incertos para deduzir a sua habilitação como sucessores, seguindo-se os ulteriores termos dos artigos 1132.º, e ss. do Código de Processo Civil.


Valor: … €.
Junta: dois documentos.
Entrega-se: duplicados e cópias legais.


O Procurador-Adjunto


Consultas sugeridas sobre esta matéria:

Parecer n.º 10/2007, D.R. n.º 130, Série II de 2007-07-09

Ministério Público - Procuradoria-Geral da República

Acção de liquidação de herança em benefício do Estado.
Isenção de custas por parte do Ministério Público


Herança jacente—Herança vaga—Acção especial de liquidação
de herança—Custas judiciais—Isenção
de custas—Ministério Público—Representação do Estado

Conclusões:

1.ª No âmbito da acção especial regulada nos artigos 1132º a 1134º
do Código de Processo Civil, o Ministério Público, litigando em nome
próprio, está isento de custas e, consequentemente, do pagamento
de taxas de justiça inicial e subsequente [artigo 2º, n.º 1, alínea a),
do Código das Custas Judiciais].
2.ª As custas judiciais desse processo, relativas à administração e
à liquidação do património hereditário, constituem um encargo da
herança, caso esta, na falta de outros sucessíveis, venha a ser declarada
vaga para o Estado (artigo 2068º do Código Civil).
3.ª Tal encargo, gozando de privilégio creditório em relação às
dívidas do falecido, será pago pelo produto da liquidação do activo
da herança, logo a seguir às despesas com o funeral e sufrágios
(artigo 2070º, n.º 2, do Código Civil).
4.ª O património do Estado não responde por esse encargo, mesmo
que o produto da liquidação do activo hereditário se mostre insuficiente
para o seu pagamento integral (artigo 2071.º do Código Civil).


Acórdão da Relação de Lisboa, de 09.07.03
( Processo 2105/2003-2; relator: Desembargador Tibério Silva ):

I- No processo de liquidação de herança vaga em benefício do Estado, há que saber se há sucessores em condições de ser habilitados. Caso contrário, será declarada vaga a herança para o Estado, seguindo-se, depois, a fase da liquidação, adjudicando-se ao Estado o que remanescer das operações, que, nesse âmbito, há que levar a efeito.
II- A procuração é um negócio unilateral, enquanto o mandato é um contrato. No mandato, o mandatário tem o dever de o exercer, enquanto, na procuração, o procurador, não tendo esse dever, tem essa possibilidade ou poder.
III- Uma procuração não tem, face às normas contidas nos arts. 2179º e segs. do C. Civil, o valor de um testamento, nem o substitui, não podendo ser invocada como título de vocação sucessória. IV - O procurador tem, em regra, interesse na procuração. Mas não é um qualquer interesse que leva a que a procuração seja considerada irrevogável. Tem de ser um interesse específico na conclusão do negócio que constitui a relação subjacente, um interesse directo, que só existe se o procurador for parte no negócio que constitui essa relação subjacente.
V –Não carreando o procurador elementos suficientes que, submetidos a prova, sejam susceptíveis de demonstrar a vinculação do dominus num concreto negócio que funcionasse em benefício daquele e impeditivo de que, contra a vontade do mesmo procurador, fosse revogada a procuração, não é possível concluir pela irrevogabilidade desta, apesar da convenção nesse sentido. Daí que nada impeça que, com a morte do dominus, a procuração, assente numa relação de confiança entre o dominus e o procurador, caduque.
VI- O art. 1132º do C.P. Civil reporta-se à habilitação de sucessores.
VII– Mesmo defendendo a não extinção da procuração, há que considerar que a posição do dominus se transmite para os sucessores que, a partir da morte, ocuparão essa posição na relação de representação. Ora, são precisamente os sucessores que se cuida de habilitar, para tanto não bastando ter um crédito sobre a herança.

Acórdão da Relação de Lisboa, de 17.11.1992
( BMJ 421, p. 480 ):

Os Tribunais portugueses não têm competência internacional para o processo de arrecadação de herança de um cidadão português falecido num país estrangeiro onde residia e onde deixou os seus bens.

Parecer do Conselho Consultivo da PGR, de 25.07.1985
( N.º convencional: PGRP00007581 ):

1 - Quando o Estado e instituído herdeiro por via testamentária, há lugar a organização do processo gracioso regulado pelo Decreto-Lei n.º 31156, de 3 de Março de 1941, e, uma vez decidida pelo Ministro das Finanças e do Plano a aceitação da herança, há lugar a instauração de processo de inventário obrigatório para partilha e / ou adjudicação dos bens;
2 - Quando o Estado é chamado à sucessão a título de herdeiro legítimo, desprovido da faculdade de repudiar a herança, há lugar a instauração do processo especial de liquidação de patrimónios em beneficio do Estado, regulado nos artigos 1132 e seguintes do Código de Processo Civil;
3 - Porém, se o autor da herança a que o Estado foi chamado como herdeiro legítimo tiver falecido sem haver aceitado ou repudiado outra herança a que, por seu turno, fora chamado, transmite-se para o Estado o direito de a aceitar ou repudiar (artigo 2058, n.º 1, do Código Civil);
4 - Relativamente a esta segunda herança, que adveio para o Estado por direito de transmissão, há lugar a instauração do processo gracioso e do inventário obrigatório referido na conclusão 1, por cujo termo deverá aguardar o processo especial referido na conclusão 2.