segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Cumprimento da multa como pena principal - Rito processual

Cumprimento da multa como pena principal
Esquema processual


1º O arguido é acusado pela prática de um crime que preveja a pena de multa como pena principal (artigo 283.º do Código de Processo Penal).

2º A acusação é recebida e o juiz designa a data da audiência de julgamento (artigos 311.º e 312.º do Código de Processo Penal).

3º O arguido é notificado por contacto pessoal ou por via postal registada da data da audiência, excepto se tiver prestado TIR, que prevê a notificação por via postal simples (artigo 313.º, nºs 1 a 3, e 113.º, n.º 9, do Código de Processo Penal).

4º Se não for possível notificá-lo por esta via, é notificado por editais para se apresentar em juízo, no prazo de 30 dias, sob pena de ser declarado contumaz (artigo 335.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).

5º O arguido está presente na audiência de julgamento

a) Se o arguido estiver presente em algumas sessões da audiência de julgamento mas faltar à última, a sentença terá de lhe ser notificada por contacto pessoal (Ac. TRE de 08.01.08, CJ XXXIII, Tomo I/2008, p. 259).
b) Quando o arguido que esteve presente pelo menos na última sessão da audiência de julgamento, notificado em acta da data da leitura da sentença, falta a esta leitura, deve considerar-se notificado da sentença na pessoa do seu defensor (artigo 373.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, Acs. TC n.º 545/2003, de 11.11.2003 e 429/2003, DRII, 21.11.2003 e Ac STJ de 27.07.2006, p. 06P2954, Ac. TRC de 14.03.2007, p. 29/04.0GB; Ac. TRC de 14.01.2004, proc. n.º 3729/03).

6º O arguido não está presente na audiência de julgamento

a) O presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência (artigo 333.º do Código de Processo Penal), sob pena de nulidade (Ac. STJ de 24.10.2007, p. 07P3486).

b) Se o arguido não comparecer a todas ou à última sessão da audiência de julgamento a sentença terá de lhe ser notificada pessoalmente – por contacto pessoal ou por via postal registada – e só transita com esta notificação (artigos 113.º, n.º 9 e 333.º, n.º 5, do Código de Processo Penal) (Ac TC n.º 274/03, D.R., II série, de 5.07.2003; Ac TRL de 18.10.2006, p. 7067/2006-3).

c) Quando a audiência tiver lugar na ausência do arguido, a sentença ser-lhe-á notificada (artigos 113.º, n.º 9, 333.º, nºs 5 e 6, e 334.º, n.º 6, do Código de Processo Penal), excepto quando o arguido requerer que o julgamento se faça na sua ausência por se encontrar impossibilitado de comparecer à audiência por idade, doença grave ou residência no estrangeiro e quando o processo for reenviado de forma sumaríssima para comum (artigo 334.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Penal), situações em que é representado, para todos os efeitos possíveis, pelo defensor, incluindo a notificação da sentença (artigo 334.º, nºs 4 e 6, do Código de Processo Penal).

d) No caso de julgamento em processo sumário, o arguido libertado antes da audiência de julgamento, é notificado para comparecer perante o Ministério Público para ser submetido a audiência e julgamento em processo sumário, com a advertência de que esta se realizará mesmo que não compareça, sendo representado por defensor (artigo 385.º, n.º 3, al. a), do Código de Processo Penal), pelo que, caso falte à leitura da sentença, considera-se notificado na sentença na pessoa do seu defensor.

Sobre esta matéria não é conhecida jurisprudência, à excepção do Acórdão da Relação de Coimbra, de 22-04-2009 (http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/b590b10f9f027c72802575b000499449?OpenDocument ), que não se pronunciou sobre tal questão, mas sim sobre a recorribilidade ou não do despacho judicial que entendeu em sentido diferente do supra-sustentado, e podem aduzir-se dois argumentos:

i) Princípio da celeridade processual (artigo 386.º, n.º 2, do Código de Processo Penal), não resultando da nossa interpretação qualquer violação direitos, pois o arguido, já constituído como tal e ciente dos seus direitos e deveres, é previamente advertido de que lhe vai ser nomeado defensor e de que a audiência se realizará na sua ausência, sendo representado pelo mesmo;

ii) Referência legal expressa à representação por defensor em audiência de julgamento, audiência essa que inclui a própria leitura da sentença (artigos 385.º, n.º 3, al. a), e 389.º, n.º 6, do Código de Processo Penal).

e) Sobre esta matéria pode ainda ver-se o Ac. TC n.º 111/2007, DR II, de 20.03.2007), que permite a notificação por via postal simples, com prova de depósito, para a morada indicada no termo de identidade e residência prestado pelo arguido, de sentença condenatória proferida na sequência de audiência de julgamento a que o arguido, ciente da data da sua realização, requerera ser dispensado de comparecer, por residir no estrangeiro, sentença que foi notificada ao defensor do arguido, que esteve presente na audiência de julgamento e na audiência para leitura de sentença.

f) Não estando em causa a aplicação ou a execução da medida de prisão preventiva, o arguido julgado na ausência não pode ser detido apenas para o efeito de notificação da sentença (Ac. TRL de 17.01.2008, CJ XXXIII, tomo I/2008, p. 124 e Ac. TRL de 15.11.2007, proc. n.º 2548/07-9).

g) O tribunal deve continuar a diligenciar a busca do paradeiro do arguido para que a referida notificação seja efectuada (Ac. TRP de 01.02.06, p. 0545096).

7º O arguido é condenado em pena de multa.

a) Não obstante não ser obrigatória a consignação na sentença da conversão da multa em prisão subsidiária, nada o impede e até se considera aconselhável (Ac. TRC de 18.01.2006, p. 3858/05).

8º O arguido, devidamente notificado da sentença que o condenou em multa, paga a multa no prazo de 15 dias da notificação e a pena extingue-se pelo cumprimento (artigo 489.º, n.º 2, do Código de Processo Penal).

a) As quantias pagas pelo condenado devem ser afectas ao valor da pena de multa e, consequentemente, deve considerar-se cumprida aquela pena, com as legais consequências em matéria de custas processuais (Ac. TRL de 27.02.2008, CJ XXXIII, tomo I/2008, p. 143).

9º O arguido, devidamente notificado da sentença que o condenou em multa, não paga a multa

a) Se o arguido requerer o pagamento da multa em prestações dentro do prazo de 15 dias e a sua situação económica o justificar, o tribunal pode permiti-lo, desde que a última prestação não vá além dos 2 anos subsequentes à data do trânsito em julgado da decisão (artigos 47.º, n.º 3, do Código Penal e 489.º, n.º 2, do Código de Processo Penal).

b) Se o arguido requerer a substituição da multa por dias de trabalho dentro do prazo de 15 dias e o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, pode ordená-la (artigos 48.º, n.º 1, do Código Penal e 489.º, n.º 2, e 490.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).

i) Se o Tribunal entender substituir a multa por dias de trabalho, deve solicitar um relatório à Direcção-Geral de Reinserção Social (artigo 490.º, n.º 2, do Código de Processo Penal) e deve notificar pessoalmente o condenado da decisão da substituição e do n.º de horas de trabalho (artigo 490.º, n.º 3, do Código de Processo Penal).

ii) Caso o condenado não cumpra os dias de trabalho deve ser ouvido sobre as razões do incumprimento (artigo 495.º, n.º 3, ex vi do artigo 498.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, por identidade de razões).

iii) Quando o Tribunal decida revogar a suspensão, devem ser tidos em consideração os dias de trabalho já prestados.

c) Se o condenado requerer o pagamento da multa em prestações ou a sua substituição por trabalho a favor da comunidade depois de decorrido o prazo de 15 dias a contar da notificação para o pagamento voluntário da multa, existem duas correntes jurisprudenciais:

i) Deve tal requerimento ser indeferido por extemporaneidade (Acs. TRP de 11.07.07; 28.05.03; 22.02.06, CJ XXXI, I, p. 216; 10.09.08, p. 0843469).

ii) Não obstante o decurso do prazo, as preocupações eminentemente pessoais que atravessam o direito criminal apontam claramente no sentido de que não seja preterida a possibilidade de opção por uma pena que se revele mais ajustada, ainda que requerida depois de ultrapassado o prazo fixado para o pagamento da multa (Ac. TRP de 28.09.2005, p. 0414867).

10º Findo o prazo para pagamento da multa ou o de alguma das prestações sem que o pagamento seja efectuado, procede-se à execução patrimonial (artigo 491.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).

a) Caso o arguido não tenha bens suficientes para pagar a multa, deve ser ouvido para explicar as razões do não pagamento da multa (Acs. TRC de 08.11.2006, p. 162/04; 14.03.2007, p. 29/04.0GB; Ac. TRG de 06.06.2006, p. 2397/05-1).

11º Se o condenado não provar que a razão do não pagamento lhe não é imputável, a multa não paga converte-se em prisão subsidiária (artigo 49.º, nºs 1 e 3, do Código Penal), pelo tempo correspondente reduzido a dois terços (Ac. TRL de 23.11.2004, p. 7251/2004-5).

a) A audição do arguido prévia ao despacho que converte a multa em prisão subsidiária pode ser feita por escrito (Ac. TRG de 06.02.2006, p. 2397/05-1 e Ac. TRP de 09.04.08, proc. 0840367).

b) A modalidade da notificação ao arguido do despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiária é objecto de duas correntes jurisprudenciais:

i) Uma que entende que tal despacho deve ser notificado ao arguido por contacto pessoal ou por via postal registada, pelo que só transita com esta notificação (Ac. TRE de 22.04.08, proc 545/08-1).

A favor desta posição podem aduzir-se os seguintes argumentos:

(1) O TIR, como medida de coacção, extinguiu-se com o trânsito em julgado da sentença condenatória (artigo 214.º, n.º 1, al. e), do Código de Processo Penal), pelo que as consequências que dele decorrem, designadamente a de as notificações serem feitas por via postal simples para a morada indicada também se extinguiram (artigo 196.º, nºs 2 e 3, al. b), do Código de Processo Penal).

(2) Não obstante não constar do elenco de actos que não se bastam com a notificação do defensor (artigo 113.º, n.º 9, do Código de Processo Penal), atendendo à gravidade deste despacho, que converte uma pena não privativa da liberdade numa privativa, há identidade de razão, designadamente, com a sentença, que tem de ser notificada ao arguido.

ii) Outra que defende que o despacho de conversão pode ser notificado ao arguido por via postal simples, com prova de depósito, na morada constante do TIR, pois que tal notificação não respeita a nenhum dos actos processuais em que a lei exige notificação pessoal – cfr. art.113º, nº.9 do C.P.P. – podendo a mesma ser efectuada na pessoa do respectivo defensor ou advogado (Ac. TRL de 20.05.2008, in http://www.pgdlisboa.pt/, referência a Proc. 2992/08).

c) Não tendo o arguido cumprido a pena de multa em que foi condenado, é a mesma convertida em pena de prisão subsidiária. Há duas teses jurisprudenciais quanto ao momento em que este despacho pode ser executado:

i) Uma que defende que é necessário aguardar o trânsito em julgado deste despacho, por se tratar de uma despacho recorrível (artigo 399.º do Código de Processo Penal).

ii) Outra que pugna pela desnecessidade de aguardar o trânsito em julgado do despacho para proceder à passagem de mandados de detenção, uma vez que a única forma de o arguido obstar ao cumprimento da prisão subsidiária é procedendo ao pagamento da multa (Ac. TRL de 25.05.2006, p. 3378/06-9).

12º Suspensão da prisão subsidiária

i) Só após ser decretada a prisão subsidiária pode o arguido pedir, a todo o tempo, que esta seja suspensa, o que só deverá ser deferido se o arguido fizer prova cabal de que a frustração do pagamento não lhe é imputável (Ac. TRC de 22.10.2003, p. 2274/03, e Ac. TRP de 09.07.2008, proc. n.º 0813395).

ii) O arguido tem de ser ouvido para que a prisão subsidiária seja suspensa (Ac. TRC de 08.11.2006, p. 162/04.8GAANS-A.C1).

Nota: Os acórdãos do STJ, TRL, TRP, TRC, TRE e TRG sem menção da respectiva publicação estão disponíveis em www.dgsi.pt.
Os acórdãos do TC sem menção da respectiva publicação estão disponíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/.


COMENTÁRIO:

O rito indicado é verdadeiramente mirabulante! Mas é real...