sábado, 20 de dezembro de 2008

DETENÇÃO/DESCONTO NA PENA DE MULTA ( Ac. Rel. Coimbra: clique)

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19-11-2008
Processo: 281/07.9PANZR.C1
Relator:
DR. ANTÓNIO ALBERTO MIRA
Sumário:

I. – O desconto da prisão preventiva é de funcionamento “automático/obrigatório”, devendo ser operado por mera regra de execução, como tem decidido o Supremo Tribunal de Justiça: “o desconto da prisão preventiva não tem que ser ordenado na decisão condenatória – resulta imperativamente da lei, para ser tomado em conta no cumprimento da pena».

II. - O mesmo não acontece quanto ao desconto, na pena de multa, da detenção sofrida pelo arguido. Nesta situação, o juiz terá de fazer o que se lhe afigurar equitativo, porquanto a expressão “pelo menos” do artigo 80.º, n.º 2, do CP significa que 1 dia de prisão pode equivaler a mais de 1 dia de multa.

III. - Neste caso específico, é desejável que o desconto seja mencionado na sentença condenatória, para que fique desde logo determinado o exacto quantum da multa e, assim, definida a verdadeira situação “jurídico-penal” do arguido.

IV. - Todavia, não impõe a lei que o desconto tenha necessária e obrigatoriamente de ser ordenado na sentença, podendo ser determinado posteriormente, em momento ainda adequado, por despacho – cfr. Ac. da Relação de Évora de 18-02-2003.

TERMO DE IDENTIDADE E RESIDÊNCIA/MUDANÇA DE RESIDÊNCIA/JULGAMENTO NA AUSÊNCIA DO ARGUIDO (Acórdão do STJ: clique )

Acórdão do S.T.J., de 18-12-2008
Processo:08P2816
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SIMAS SANTOS
Nº do Documento: SJ200812180028165

Sumário :

1 – A imposição de termo de identidade e residência, de acordo com o art. 196° do CPP, significa que, para o efeito de ser notificado mediante via postal simples, nos termos da al. c) do n.º 1 do art. 113.º, o arguido indicou um domicílio à sua escolha (n.º 2) e lhe foi dado conhecimento (n.º 3) da obrigação de comparecer perante a autoridade competente ou de se manter à disposição dela sempre que a lei o obrigar ou para tal for devidamente notificado [a)], da obrigação de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado [b)]; de que as posteriores notificações seriam feitas por via postal simples para a morada por si indicada, excepto se comunicasse uma outra, através de requerimento entregue ou remetido por via postal registada à secretaria do Tribunal Judicial onde correm os autos [c)]; e de que o incumprimento do disposto nas alíneas anteriores legitima a sua representação por defensor em todos os actos processuais nos quais tenha o direito ou o dever de estar presente; e bem assim a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333.º [d)].


2 – Se o arguido mudou da morada que indicara, nos termos do n.º 2 do art. 196.º e não comunicou essa mudança aos autos, como estava obrigado, bem sabendo que as posteriores notificações seriam feitas por via postal simples para a morada que indicara fica legitimada a sua representação por defensor em todos os actos processuais nos quais tenha o direito ou o dever de estar presente e a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333.º.


3 – A circunstância da mãe do arguido ter informado que o arguido estaria numa outra morada, o que foi consignado pela GNR não dispensou o recorrente de vir comunicar, na forma prevista na lei, a mudança de residência aos autos que visa garantir a disponibilidade e contactibilidade dos arguidos, responsabilizando-os por isso, em termos de notificações futuras.


4 – Daí que tendo o arguido sido notificado termos da al. c) do n.º 1 do art. 113.º, na residência indicada, não enferme de qualquer nulidade o seu julgamento na ausência.


5 – No sistema de césure ténue de que é tributário o nosso sistema processual penal, a questão da determinação da sanção aplicável é destacada da questão da determinação da culpabilidade do agente. Por outro lado, o n.º 2 do art. 71.º do C. Penal manda atender também, na determinação da medida da pena, às condições pessoais do agente e a sua situação económica [d)], à sua conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime [e)] e à falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena [f)].

6 – Só estando apurado que o arguido, julgado na ausência, não tem antecedentes criminais, nada mais se sabendo, designadamente quanto às condições pessoais do agente e a sua situação económica, à sua conduta posterior ao facto (a qual não pode ser deduzido da sua não comunicação de mudança de residência e falta de cumprimento ou incumprimento inadequado do dever de apresentação) e à falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena, impõe a elaboração e consideração de um relatório social, pelo que deve ser reaberta a audiência nos termos do art. 371.º do CPP.

TEXTO PARCIAL:

"...Pretende, em síntese, o recorrente que a realização da audiência de julgamento, sem a sua presença constitui nulidade insanável (n.°s 2 e 3 do art. 313° do CPP), pois não foi notificado, com pelo menos 30 dias de antecedência, da respectiva data fixada para julgamento, com cópia da acusação.”...
Na sua óptica, sem bem que não morasse à data dessa notificação na residência que indicara, a notificação deveria ter tido lugar na morada para onde mudara, que indicara à sua mãe e que esta teria indicado à GNR.
Mas não lhe assiste razão.
O arguido, como ele próprio reconhece, prestou termo de identidade e residência, de acordo com o prescrito no art. 196° do CPP.
Significa isso que, para o efeito de ser notificado mediante via postal simples, nos termos da al. c) do n.º 1 do art. 113.º, o arguido indicou um domicílio à sua escolha (n.º 2) e lhe foi dado conhecimento (n.º 3) da obrigação de comparecer perante a autoridade competente ou de se manter à disposição dela sempre que a lei o obrigar ou para tal for devidamente notificado [a)], da obrigação de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado [b)]; de que as posteriores notificações seriam feitas por via postal simples para a morada por si indicada, excepto se comunicasse uma outra, através de requerimento entregue ou remetido por via postal registada à secretaria do Tribunal Judicial de Vila Nova de Foz Côa (onde os autos se encontrarem a correr nesse momento) [c)]; e de que o incumprimento do disposto nas alíneas anteriores legitima a sua representação por defensor em todos os actos processuais nos quais tenha o direito ou o dever de estar presente; e bem assim a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333.º [d)].
Ora, como o próprio recorrente aceita, mudou da morada que indicara, nos termos do n.º 2 do art. 196.º e não comunicou essa mudança aos autos, como estava obrigado por força da al. b) do n.º 2 do art. 196.º, bem sabendo que as posteriores notificações seriam feitas por via postal simples para a morada que indicara, uma vez que não comunicara outra, através de requerimento entregue ou remetido por via postal registada à secretaria do tribunal de V.N. Foz Côa, de acordo com a al. c) do mesmo n.º 2, o que tudo legitimava, como fora advertido, a sua representação por defensor em todos os actos processuais nos quais tenha o direito ou o dever de estar presente e a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333.º [n.º 2, al. d)].
Daí que se deva ter o arguido por regularmente notificado, uma vez que lhe foi enviada a devida e completa notificação para a morada que indicara e não alterara regularmente.
Não se diga, em contrário e como faz o recorrente, que a informação prestada pela mãe a GNR e feita constar de auto dispensou o recorrente de vir comunicar, na forma prevista na lei, a mudança de residência aos autos. Como a história do art. 196.º pode elucidar, os deveres impostos, nessa sede, aos arguidos de maneira a garantir a sua disponibilidade e contactibilidade, e responsabilizando-os por isso, na forma já analisada. E a valoração da informação prestada pela mãe ao OPC, que o não responsabilizava, desresponsabilizava-o face ao processo, ficando-se sem conhecer residência que o comprometesse em termos de notificações futuras.
Ora a exigência do formalismo, incumprido pelo recorrente, visa exactamente assegurar, como se disse, a eficácia do processo. E, por outro lado, foi o recorrente devidamente informado dos procedimentos a adoptar e das suas consequências.
É certo que é obrigatória a presença do arguido (n.º 1 do art. 332º do CPP) na audiência que só pode ter lugar quando o mesmo se encontre regularmente notificado para ela, mas como vimos, foi regularmente notificado e nas circunstâncias fora advertido de que seria, no incumprimento das regras, representado por defensor nos actos processuais em que pudesse ou devesse estar presente e, poderia ter lugar a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333.º [n.º 2, al. d) do art. 196.º]...”
“...Lisboa, 18 de Dezembro de 2008
Simas Santos (Relator)
Santos Carvalho”.

DENÚNCIA DE CRIME/OFENSAS À HONRA/COLISÃO DE DIREITOS/RESPONSABILIDADE CIVIL /Acórdão do STJ(clique)

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 08A2680
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SEBASTIÃO PÓVOAS
Descritores:
Nº do Documento: SJ20081218026801
Data do Acordão: 18-12-2008

Sumário:

1) Toda a participação criminal dirigida contra pessoa certa contém, objectivamente, ainda que a nível de suspeita sustentada por argumentos meramente indiciários, uma ofensa à honra e consideração do denunciado, por se traduzir na imputação de factos penalmente ilícitos.

2) O acesso aos tribunais para fazer valer um direito é constitucionalmente garantido, e o direito de participar criminalmente pode, em certos casos constituir um dever cujo incumprimento será, por si, a comissão de um ilícito penal. Mas a participação não pode ser feita com a consciência da falsidade da imputação ou é crime de denúncia caluniosa.

3) No crime de denúncia caluniosa os interesses protegidos pela incriminação são a administração da justiça, a não ser perturbada por impulsos inúteis e infundados e dos acusados a serem protegidos contra imputações falsas e temerárias lesivas da sua honra.
Trata-se de um crime doloso, inadmitindo, sequer, o dado eventual como elemento subjectivo.

4) Ao direito à honra do denunciado contrapõe-se o direito à denúncia como “iter” de acesso á justiça e aos tribunais.

5) Na colisão de direitos, que são desiguais, deve prevalecer o considerado superior.

6) Com princípio, o direito de denúncia prevalece notoriamente nos casos de denúncia vinculada (ou denúncia-dever funcional) e, em geral, porque como garantia de estabilidade, da segurança e da paz social no Estado de Direito deve assegurar-se ao cidadão a possibilidade quase irrestrita de denunciar factos que entende criminosos.

7) Para além da denúncia caluniosa, são restrições a linguagem ofensiva do texto (que não se limite à narração de factos mas lance epítetos ou emite juízos de valor sobre o denunciado) que, por si, pode ofender a honra, mas não esquecendo o princípio da necessidade do n.º 2 do artigo 154º do CPC, sendo que, no mais (dever geral de diligência), deve ser feita uma avaliação casuística na ponderação do tipo de crime, na complexidade, sofisticação, necessidade de perícia e putativos agentes, que pode servir de critério para avaliar da grosseira leviandade da denúncia.

8) O regular – ressalvando situações de abuso e de actividades perigosas – exercício do direito exclui a ilicitude (é causa de justificação) como pressuposto da responsabilidade civil.