domingo, 30 de novembro de 2008

Artigo 495º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal ( revisto )/Acórdão da Relação de Coimbra, de 05-11-2008

Artigo 495.º

Falta de cumprimento das condições de suspensão

1 — Quaisquer autoridades e serviços aos quais seja
pedido apoio ao condenado no cumprimento dos deveres,
regras de conduta ou outras obrigações impostos comunicam
ao tribunal a falta de cumprimento, por aquele, desses
deveres, regras de conduta ou obrigações, para efeitos do
disposto no n.º 3 do artigo 51.º, no n.º 3 do artigo 52.º e
nos artigos 55.º e 56.º do Código Penal.

2 — O tribunal decide por despacho, depois de recolhida
a prova, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o
condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o
cumprimento das condições da suspensão.

Sobre este número 2, clique no título deste post.
Consulte também: http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/c3fb530030ea1c61802568d9005cd5bb/84fb01e2283c45c180257508004e5108?OpenDocument

3 — A condenação pela prática de qualquer crime cometido
durante o período de suspensão é imediatamente
comunicada ao tribunal competente para a execução, sendo-
-lhe remetida cópia da decisão condenatória.
4 — Para os efeitos do disposto no n.º 1, a decisão que
decretar a imposição de deveres, regras de conduta ou
outras obrigações é comunicada às autoridades e serviços
aí referidos.

IMPUGNAÇÃO DE PATERNIDADE LEGÍTIMA/Inconstitucionalidade

Processo: 0856074
Nº Convencional: JTRP000418893
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DE PATERNIDADE LEGÍTIMA
INCONSTITUCIONALIDADE
Nº do Documento: RP200811240856074
Data do Acordão: 24-11-2008
Votação: UNANIMIDADE

Sumário: O artigo 1842º nº 1, c) do Código Civil é inconstitucional na medida em que é limitador da possibilidade de impugnação a todo o tempo, pelo presumido progenitor, da sua paternidade.

Ameaça ou mera advertência?

Acórdão da Relação do Porto, de 19-11-2008
Processo: 0846214
Relatora: Airisa Caldinho

Sumário:
No crime de ameaça a inevitabilidade do mal ameaçado tem de aparecer como dependente da vontade do agente sendo esta que distingue a ameaça do simples aviso ou advertência.

Texto Parcial:

“...Sobre o enquadramento jurídico-penal dos factos em questão, vejamos o que foi produzido na sentença sob recurso:
- “…
Dispõe o nº 1, do artigo 153º, do Código Penal: “quem ameaçar outra pessoa com a prática de um crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido (...)”.
O citado preceito pretende proteger o bem jurídico da liberdade de decisão e de acção, isto é, a paz jurídica individual.
A ameaça não lesando directamente a liberdade fá-lo indirectamente na medida em que perturba a tranquilidade de ânimo, provocando um estado de agitação e incerteza e tolhendo os movimentos daquele que não se crê seguro na vida ou nos bens.
O elemento objectivo do tipo consiste em ameaçar outra pessoa, ou seja, anunciar, por qualquer meio, a intenção de causar um mal futuro, dependente da vontade do autor, que constitua crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor.
Temos assim, desde logo, que um dos elementos essenciais da ameaça é o mal a produzir, que neste caso deve constituir crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor.
A inevitabilidade do mal ameaçado tem de aparecer como dependente da vontade do agente sendo esta que distingue a ameaça do simples aviso ou advertência.
Com efeito, se alguém anuncia a outrem perigos que não dependem do seu querer tal não passa de um aviso ou advertência, não sendo esta em si mesma susceptível de perturbar a liberdade de decisão e de acção com ela propondo-se, apenas, consciencializar a pessoa visada de eventuais consequências do seu estado, comportamentos ou atitudes que não dependem daquele que adverte.
Com efeito, o crime de ameaça, a par de exigir a cominação de um mal futuro, ainda que mais ou menos próximo, não se compadece, porém, com a subordinação da concretização do mal ameaçado a uma condição dependente da vontade do próprio ameaçado.
Ora, a expressão “não te metas com a minha família que eu parto-te o focinho e mato-te! Isto é um aviso, olha que eu mato-te”, configura um aviso à ofendida de uma consequência caso a mesma se meta com a família do arguido.
Assim, nos termos expostos tal expressão não configura um crime de ameaça mas um aviso com a subordinação do mal ameaçado na dependência do comportamento da ofendida.
Ora, para preenchimento do tipo objectivo de ilícito previsto no artigo 153º do Código Penal não basta o anúncio de um qualquer mal futuro para o integrar.
Com efeito, nem todos os factos socialmente danosos constituem crimes, mas tão só os que o legislador tipificou como tais, por considerá-los de tal modo graves para a vida social que justificam a sanção penal para quem os praticar.
Do mesmo modo nem todos os comportamentos lesivos dos bens que são objecto de tutela penal constituem um ilícito penal, mas só aqueles que ocorram nos termos da previsão legal.
O Direito Penal tendo por fim a protecção de bens jurídicos fundamentais rege-se por princípios entre os quais merece destaque o princípio da intervenção mínima ou da subsidiariedade que significa que este só deve intervir quando for essencial e eficiente para protecção desses bens jurídicos, sendo, ainda, de notar que a vulgarização da intervenção penal para tutela de interesses que pese embora socialmente incorrectos não são essenciais para a vida em comunidade enfraquece a sua força preventiva de protecção de valores sociais absolutamente fundamentais.
Ora, não constituindo a expressão mais do que um aviso cuja concretização depende do comportamento da própria ofendida forçoso se torna concluir pelo não preenchimento do tipo legal do crime de ameaça, previsto e punido pelo artigo 153º, nº 1, do Código Penal.
Decorre do exposto que o arguido deve ser absolvido da prática do crime que lhe é imputado.”
Não sofre dúvida que o “conflito” aqui existente é o de saber até que ponto a frase dirigida pelo arguido C………. à assistente, no contexto em que foi proferida, constitui ameaça nos termos e para os efeitos do art. 153.º do CP.
Está provado que o arguido C………., no dia 22 de Maio de 2006, se dirigiu à assistente dizendo-lhe que não se metesse com a sua família que lhe partia o focinho e a matava, que era um aviso, que a matava.
Este comportamento teve lugar depois de uma discussão havida, no dia 19 de Maio de 2006, entre a assistente e a mulher do arguido e surgiu como atitude de desforço por parte deste devido a tal discussão; o próprio arguido diz à assistente que aquilo é um aviso.
É entendimento da doutrina e da jurisprudência que o conceito de ameaça se preenche com um mal futuro cuja ocorrência dependa ou apareça como dependente da vontade do agente aos olhos do homem comum, tendo em conta as características individuais do ameaçado.
A dependência da concretização do mal futuro da vontade do agente estabelece a diferença entre o aviso ou advertência e a ameaça.
No caso que nos ocupa, como refere a sentença recorrida, as expressões proferidas pelo arguido C………. configura um aviso à assistente de uma consequência, caso ela se meta com a família dele, não configurando um crime de ameaça, mas um aviso, com subordinação do mal ameaçado a um comportamento dela.
Na perspectiva do homem comum, do adulto normal, é assim que as expressões proferidas pelo arguido são entendidas, isto é, como não dependentes da vontade dele, mas de um comportamento da assistente, pelo que esta não pode ter como limitada a sua liberdade pessoal.
Neste sentido, veja-se a anotação ao art. 153.º em “Comentário Conimbricense do Código Penal”, da Coimbra Editora, 1999, pág.s 340 e ss, que se seguiu de perto, bem como o ac. da Relação do Porto de 19.06.2002 , proc. n.º 0110909 (www.dgsi.pt).
Quanto ao pedido cível, tendo como causa de pedir o ilícito criminal, a absolvição do arguido deste impõe a absolvição também daquele.
Nesta conformidade, acolhendo a posição defendida na sentença sob recurso com os demais argumentos que se subscrevem, entende-se que o recurso não merece provimento.
III. Pelo exposto:
1.º Nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
2.º Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC.
Elaborado e revisto pela primeira signatária.

Porto, 19 de Novembro de 2008
Airisa Maurício Antunes Caldinho
António Luís T. Cravo Roxo”

Prisão Subsidiária/ Impossibilidade de cumprimento na habitação

Acórdão da Relação do Porto, de 26-11-2008
Processo: 0843400
N.º do Documento: RP200811260843400

Sumário:
É ilegal a decisão que determina o cumprimento da prisão subsidiária em regime de permanência na habitação.

Justo Impedimento

Acórdão do S.T.J., de 27-11-2008
N.º de documento: SJ200811270023722
Processo: 08B2372O

Sumário:

O justo impedimento só pode ser invocado em situações em que ainda não tenha decorrido o prazo peremptório estabelecido na lei para a prática do acto processual, não o podendo ser no período temporal adicional de três dias úteis, estabelecido no n.º 5 do art. 145º do Cód. Proc. Civil.

Denúncia criminal/Honra

Acórdão do S.T.J., de 18-11-2008
N.º de documento: SJ20081118032272
Relator: João Bernardo

Sumário:

1. A linha demarcadora entre a licitude e a ilicitude duma ofensa à honra não pode passar abaixo do mínimo de dignidade do ser humano enquanto tal.

2. Acima de tal ponto, essa linha passa a ser indeterminada, havendo que atender a múltiplos factores, mormente ao conflito com outros direitos de consagração legal ao mesmo nível hierárquico.

3 . No caso de denúncias criminais, ou, em geral, de comunicações ao Ministério Público para efeitos de integração em processo penal, há que distinguir entre narração dos factos imputados ao denunciado e juízos de valor.

4 . Relativamente àquela, por regra - cujas excepções podem, no entanto, no limite, integrar até um crime de denúncia caluniosa - há que fazer prevalecer o direito de denúncia sobre o contraposto direito à honra do denunciado.

5. Relativamente aos juízos de valor, as ofensas à honra relevam contra quem as produziu, sem qualquer escudo que proteja o seu autor.

6 . O epíteto de “nazi”, a não ser em casos de discussão de ideias políticas ou semelhantes, eivada dum tolerável exagero próprio das circunstâncias, é ilicitamente ofensivo da honra.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Alteração ao Cód. Proc. Civil( clique para consultar o diploma )

Decreto-Lei n.º 226/2008, D.R. n.º 226, Série I de 2008-11-20
Ministério da Justiça
No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 18/2008, de 21 de Abril, altera, no que respeita à acção executiva, o Código de Processo Civil, os Estatutos da Câmara dos Solicitadores e da Ordem dos Advogados e o registo informático das execuções

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Autorização Judicial Prévia: sistema de posicionamento global ( GPS )

Acórdão da Relação de Évora, de 07-10-2008
Processo: 2005/08-1
Relator: MARTINHO CARDOSO


Sumário:
Não carece de prévia autorização judicial o uso pelos órgãos de polícia criminal de localizadores de GPS colocados em veículos utilizados por pessoas investigadas em inquérito (e pelo tempo tido por necessário pelo órgão de polícia criminal encarregue do mesmo).



Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
...
#
No tocante à 2.ª das questões postas, a de se também deve ser autorizada a colocação de localizadores, nomeadamente com sistema GPS, nos veículos utilizados pelo suspeito por forma a controlar os seus movimentos, pelo prazo de 60 dias:
O senhor Juiz "a quo" indeferiu esta pretensão por ter entendido não se vislumbrar qualquer base legal que legitime a vigilância por recurso a instrumentos de localização GPS - tão pouco vindo indicada -
O M.º P.º rebateu, afirmando que existem normas legais a prever essa utilização, que as indicou, e que são os art.º 187.º, n.º 1 al.ª b), 189.º, n.º 2 e 252.º-A, aplicáveis por analogia com a localização celular dos telemóveis, permitida pelo art.º 4.º, todos do Código de Processo Penal (diploma ao qual pertencerão todos os preceitos legais a seguir referidos sem menção de origem).
Vejamos o que dizem estas disposições legais, realçando a negrito as passagens que mais directamente interessam ao assunto:
Artigo 187.º
Admissibilidade
1 — A intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas durante o inquérito, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público, quanto a crimes:
a) Puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a três anos;
b) Relativos ao tráfico de estupefacientes;
(…)
Artigo 189.º
Extensão
2 — A obtenção e junção aos autos de dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações só podem ser ordenadas ou autorizadas, em qualquer fase do processo, por despacho do juiz, quanto a crimes previstos no n.º 1 do artigo 187.º e em relação às pessoas referidas no n.º 4 do mesmo artigo.
Artigo 252.º-A
Localização celular
1 — As autoridades judiciárias e as autoridades de polícia criminal podem obter dados sobre a localização celular quando eles forem necessários para afastar perigo para a vida ou de ofensa à integridade física grave.
2 — Se os dados sobre a localização celular previstos no número anterior se referirem a um processo em curso, a sua obtenção deve ser comunicada ao juiz no prazo máximo de quarenta e oito horas.
3 — Se os dados sobre a localização celular previstos no n.º 1 não se referirem a nenhum processo em curso, a comunicação deve ser dirigida ao juiz da sede da entidade competente para a investigação criminal.
4 — É nula a obtenção de dados sobre a localização celular com violação do disposto nos números anteriores.
Artigo 4.º
Integração de lacunas
Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, entendemos que localização por GPS não tem coisa alguma a ver com localização celular.
A localização celular funciona quando num telemóvel é activado o IMEI, ou seja, quando é feita ou recebida uma chamada ou uma mensagem; só indica a “antena” que está a transmitir para o IMEI alvo, ou seja, se é S. ou T. e não o local exacto onde está o telemóvel alvo.
A localização por GPS é activada por um aparelho sintonizado com pelo menos dois satélites, dos quais recebe a informação das coordenadas da longitude e da latitude a que o aparelho se encontra, fornecendo-lhe assim a localização do sítio exacto por reporte ao mapa das estradas dessa região, informação que é transmitida e reproduzida num receptor na posse, neste caso, da autoridade policial.
Ora o legislador, que bem recentemente, em Agosto de 2007, através da Lei n.º 48/2007, de 29-8, se preocupou a aperfeiçoar a individualização e o acautelamento do uso de diversos mecanismos electrónicos tais como o telefone e o telemóvel (art.º 187.º), o correio electrónico ou outras formas de transmissão de dados por via telemática, bem como os sofisticados e ainda raros aparelhos de escuta à distância de conversas a ocorrerem entre pessoas presentes num local (art.º 189.º), a localização celular e os registos da realização de conversas ou comunicações (art.º 190.º) – não podia desconhecer a existência de localizadores GPS e as virtudes da sua utilização na investigação criminal. Não obstante, nada regulamentou sobre a sua utilização, nem os proibiu.
Assim, aplica-se o art.º 125.º:«São admissíveis as provas que não forem proibidas por lei».
Sendo que a utilização de localizadores GPS não consubstancia qualquer dos métodos proibidos de prova a que se refere o art.º 126.º.
Certo que no n.º 3 deste último preceito legal se estabelece que são nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada. Mas o ter a autoridade policial no decurso de um inquérito criminal acesso à informação de onde está a cada momento um determinado veículo automóvel, não pode ser visto como uma intromissão na vida privada de quem vai nesse veículo, pois que o GPS é um aparelho surdo e cego no sentido de que não escuta as conversas dos ocupantes do carro, nem identifica quem lá vai e o que estão a fazer, apenas informa aonde está o veículo, circunstância que é visível a olho nu para quem olhe para o carro e lhe vê a matrícula. Daí que expressões ou divulgações como: «estava lá o carro de Fulano», «vi passar o carro de Sicrano» ou «o carro de Beltrano fica todas as noites estacionado à porta da Maria», não constituam qualquer comportamento tipificado como crime de devassa da vida privada, p. e p. pelo art.º 192.º do Código Penal.
Situação bem diferente seria – como está bom de ver – a de utilizar localizadores GPS em pessoas individuais ou grupos de pessoas individuais. Mas não é esse, de forma alguma, o caso dos autos.
De resto, se bem atentarmos, não é por acaso que por exemplo na investigação de crimes ocorridos em alto mar como o de tráfico de estupefacientes, as autoridades, sem necessidade de autorização judicial prévia, leiam e juntem ao processo como prova o mapa do itinerário da embarcação marcado no GPS da mesma.
De resto, digamos que a localização por GPS é o «irmão gémeo electrónico» do clássico seguimento do alvo por pessoas a bordo de um carro. E que tem vantagens e desvantagens em relação a este seguimento personalizado. A principal vantagem será o permanente acesso à localização em que se encontra o carro-alvo. A desvantagem mais evidente será a de que, apesar de em qualquer momento se saber aonde está o carro, se desconhecer por completo o que é que o seu ocupante ou os seus ocupantes estão a fazer de concreto. Nesse aspecto, o seguimento clássico, por permitir, além do mais, escrutinar quem vai no carro e o que fazem os ocupantes pelo menos quando o carro pára, para onde vão quando saem dele e com quem falam, é um método muito mais intrusivo e abrangente do que o mero conhecimento da localização do carro, pelo que o GPS servirá sobretudo como meio coadjuvante do seguimento clássico – o qual, aliás, também pode ocorrer 24 sobre 24 horas. E não é por isso que as autoridades policiais precisam de obter uma autorização judicial prévia para fazerem o seguimento de uma pessoa que vai num veículo automóvel.
Daí e em resumo que entendamos que não carece de prévia autorização judicial o uso pelos órgãos de polícia criminal de localizadores de GPS colocados em veículos utilizados por pessoas investigadas em inquérito.
III
Termos em que, concedendo provimento ao recurso, se decide revogar o despacho recorrido e autorizar:
A)...; e
B) A colocação de localizadores GPS nos veículos utilizados pelo suspeito por forma a controlar os seus movimentos e pelo tempo tido por necessário pelo orgão de polícia criminal encarregue do inquérito.
#

Évora, 7-10-2 008
Martinho Cardoso
António Latas
(elaborado e revisto pelo relator)

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

DECLARAÇÕES ESCUTADAS POR MEIO DE “ALTA-VOZ” /Prova Proibida

DECLARAÇÕES ESCUTADAS POR MEIO DE “ALTA-VOZ” /Prova Proibida
Acórdão da Relação de Coimbra, de 28-10-2008
Processo: 103/06.8GAAGN.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR. VASQUES OSÓRIO


Sumário:

I. - O acesso a uma conversação telefónica através do sistema técnico de audição designado por “alta voz” integra o conceito jurídico-penal de intromissão (objectiva) no conteúdo de telecomunicações (cf. Ac. do STJ de 07/02/2001, processo nº 2555/00, 3ª secção, acessível na jurisprudência do STJ, do site da Procuradoria Distrital de Lisboa).

II. - O depoimento prestado por uma testemunha, sobre factos jurídico-penalmente relevantes e obtidos através da função de “alta voz”, quando efectuado sem o conhecimento e o consentimento do emissor de voz, constitui-se como uma intromissão em telecomunicações e deve ser taxado como prova nula.


Texto ( parcial ):

Da prova proibida (conclusão 12)
7. Pretende o recorrente que é prova nula, nos termos dos arts. 32º, nº 8 da Constituição da República Portuguesa e 125º e 126º, nº 3, do C. Processo Penal, o depoimento da testemunha …. Para tanto alega que a testemunha tomou conhecimento da ameaça imputada e praticada através de chamada telefónica, através da activação pela assistente do sistema de alta voz do seu telemóvel, activação que não foi consentida pelo recorrente, o que tipifica o crime previsto no art. 194º, nº 2, do C. Penal.Vejamos se assim é.

7.1. Competindo ao Estado assegurar o interesse constitucional da realização da Justiça, nele se incluindo, como é óbvio, a punição dos autores de crimes, a busca da verdade na realização desta tarefa não pode ser obtida a qualquer preço, havendo que ponderar sempre os direitos fundamentais e a medida da sua afectação.A este propósito, doutrinam os Profs. Jorge Miranda e Rui Medeiros, «A eficácia da Justiça é também um valor que deve ser perseguido, mas, porque numa sociedade livre os fins nunca justificam os meios, só é aceitável quando alcançada lealmente, pelo engenho e arte, nunca pela força bruta, pelo artifício ou pela mentira, que degradam quem os sofre, mas não menos quem os usa.» (ob. cit. 361).

Por isso a lei estabelece proibições de prova que constituem limites à descoberta da verdade isto é, são obstáculos ao apuramento dos factos que constituem o objecto do processo (cfr. Prof. Costa Andrade, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, 83).«A coberto dos métodos proibidos de prova proscreve a lei processual os atentados mais drásticos à dignidade humana, mais capazes de comprometer a identidade e a representação do processo penal como processo de um Estado de Direito e, por vias disso, abalar os fundamentos daquela Rechtskultur sobre que assenta a moderna consciência democrática.» (Prof. Costa Andrade, ob. cit. 209).

O art. 32º, nº 8 da Constituição da República Portuguesa dispõe que são nulas todas as provas obtidas mediante abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.Trata-se de uma interdição relativa, devendo considerar-se abusiva a intromissão quando efectuada fora dos casos previstos na lei e sem intervenção judicial, quando desnecessária ou desproporcionada, e ainda quando destruidora dos próprios direitos (cfr. Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. 524). Ao nível da lei ordinária, estabelece por sua vez, o art. 126º, nº 3, do C. Processo Penal que ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular.

Dispõe o art. 34º, nº 1, da Lei Fundamental, que o domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis, proibindo o seu nº 4, a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal. Naturalmente que a referência constitucional à ingerência das autoridades públicas não significa que seja legítima tal ingerência a entidades provadas (cfr. Armando Veiga e Benjamim Rodrigues, Escutas Telefónicas, 1ª Ed., 57).

Os arts. 187º a 190º do C. Processo Penal dão corpo à excepção indicada na parte final deste último preceito constitucional, regulando as escutas telefónicas nos seguintes aspectos: estabelecimento de um regime de autorização e controle por um juiz (arts. 187º, nº 1 e 188º, nº 4, do C. Processo Penal); reserva das escutas para a investigação de certos tipos de ilícito, quer em função da sua gravidade, quer em função das suas características que tornam as escutas meio de recolha de prova particularmente adequado à sua investigação (art. 187º, nº 1, do C. Processo Penal); limitação do universo de pessoas sujeitos às escutas (art. 187º, nº 4, do C. Processo Penal); e exigência da indispensabilidade da diligência para a descoberta da verdade ou para a obtenção da prova (art. 187º, nº 1, do C. Processo Penal).

Desta forma, acautelou e atenuou o legislador a danosidade social que as escutas acarretam, na medida em que, quando não consentidas, constituem sempre lesão irreparável do direito à palavra falada (cfr. Prof. Costa Andrade, ob. cit. 284).

7.2. Incluído no Capítulo VII – Dos crimes contra a reserva da vida privada, do Título I, do Livro II, do C. Penal, o crime de Violação de correspondência ou de telecomunicações, previsto no art. 194º do código citado, tem, numa primeira linha, como bem jurídico tutelado a privacidade. Mas, como adverte o Prof. Costa Andrade, não se trata da privacidade em sentido material mas da privacidade em sentido formal, pois é indiferente o conteúdo das missivas ou telecomunicações, não exigindo o preenchimento do tipo que versem coisas privadas ou brigue com segredos. Numa segunda linha e, portanto, reflexamente, a incriminação tutela ainda um bem supra-individual, a confiança da sociedade na integridade dos serviços postais e das telecomunicações (Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 754).

Releva apenas para a concreta questão a decidir a violação de telecomunicações e, por isso, a conduta típica prevista no nº 2, do art. 194º, do C. Penal.

São elementos constitutivos desta modalidade de cometimento do crime:- [elemento objectivo] que o agente, sem consentimento, se intrometa no conteúdo de telecomunicações ou dele tome conhecimento; - [elemento subjectivo] o dolo, o conhecimento e vontade de praticar o facto, em qualquer uma das modalidades previstas no art. 14º, do C. Penal.

Não é isenta de dificuldades a determinação do titular do bem jurídico, sendo que esta qualidade releva para efeitos de legitimidade para consentir que um terceiro possa tomar conhecimento.

A este respeito diz-nos o Prof. Costa Andrade (Comentário, 756) que, no que às comunicações telefónicas concerne, pressupondo estas a intervenção simultânea de, pelo menos, duas pessoas, deve entender-se que todos os interlocutores são, a igual título, portadores do bem jurídico, o que determina que não assiste «a qualquer deles a legitimidade para, só por si, e sem a concordância do outro, consentir que um terceiro tenha acesso, escute, registe ou grave a comunicação.».

Mas não deixa este Mestre de notar que a solução proposta não é unânime, quer na doutrina, quer na jurisprudência, esclarecendo ser maioritária na Alemanha a tese de que o acordo de um dos interlocutores bastará para legitimar a intromissão de terceiros (Comentário, 764).

Fixando agora a conduta típica em análise, cabe dizer que só é típica a conduta que envolva o recurso a meios técnicos de captação, audição e registo.

Assim, não será típica a conduta de quem, escondido, houve uma conversação telefónica, mas já será típica a conduta de quem, com um segundo auscultador, ouve uma conversação telefónica, se tal é desconhecido pelo ofendido (cfr. Prof. Costa Andrade, Comentário, 763).

7.3. Diz o recorrente que a testemunha tomou conhecimento da ameaça que lhe é imputada, praticada através de conversação telefónica havida entre si e a assistente, por ter esta activado o sistema de alta voz do seu telemóvel, activação que não foi consentida pelo recorrente.

Ouvido o depoimento da testemunha … produzido em audiência – cassete 3, lado B – dele resulta ter a testemunha afirmado que ouviu as palavras dirigidas pelo recorrente à assistente porque esta, depois de repetidas chamadas feitas pelo recorrente que não atendeu, decidiu atender uma, e activou então a função de alta voz [viva voz, referiu inicialmente a testemunha] do aparelho, para que todos pudessem ouvir.

Afirmou também a testemunha que o recorrente, vendo rejeitadas as chamadas feitas para o telemóvel da assistente, ligava então para o próprio telemóvel da testemunha, pois sabia que a assistente estava consigo, mas também não atendia as chamadas, a pedido desta.

Posto isto.Na conversação telefónica de que cuidamos, eram simultaneamente emissores e receptores, a assistente e o recorrente.

E apenas estes o eram, na medida em que cada um detinha o meio apto a manter a conversação isto é, os respectivos telemóveis, em ligação.

A testemunha … não praticou qualquer acto de intromissão naquela conversão, utilizando ela mesma um qualquer meio técnico.

Pelo contrário, de forma absolutamente passiva, limitou-se a ouvir o que recorrente e assistente diziam.

E foi precisamente o teor desta conversa o que, através do seu depoimento e na qualidade de testemunha, declarou em audiência.

A testemunha, enquanto terceiro, não se intrometeu na conversação, antes foi intrometida pela própria assistente que era um das interlocutoras e também uma das titulares do bem jurídico tutelado pelo art. 194º, do C. Penal.

Por isso se entende não estarem verificados em relação à testemunha, os elementos do tipo objectivo e subjectivo do crime de violação de correspondência ou de telecomunicações.

De facto, foi a assistente quem, sem o consentimento do recorrente – este o afirma, e é normal que assim tenha sido, atento até o depoimento da testemunha – manteve a conversação com o sistema de alta voz do aparelho que utilizava accionado, proporcionado a sua audição por terceiros.

A função alta voz, que hoje vulgar até nos telemóveis menos sofisticados, é um meio técnico de audição. Por esta razão, o acesso a uma conversação telefónica através dela, integra o conceito jurídico-penal de intromissão (objectiva) no conteúdo de telecomunicações (cfr. Ac. do STJ de 07/02/2001, processo nº 2555/00, 3ª secção, acessível na jurisprudência do STJ, do site da Procuradoria Distrital de Lisboa).

A lei pressupõe que o emprego destes meios técnicos parta de um terceiro que os usa para obter uma informação que, de outro modo, não obteria.

Nos autos, se ingerência existiu, ela não foi de um terceiro – da testemunha – mas do próprio, ainda que não único, titular do bem ou seja, da assistente.

A actuação da assistente, tendo em consideração as palavras que lhe foram dirigidas pelo recorrente – dando corpo a ameaças – e as repetidas tentativas de estabelecer com ela contactos telefónicos no contexto de um desentendimento grave entre o casal, sempre estaria a coberto da causa de justificação da legítima defesa ou mesmo, do direito de necessidade (cfr. Prof. Costa Andrade, Comentário, 767 e 841).

Justificada a esta luz, a conduta da assistente, não se vê que a testemunha possa ter preenchido o tipo do nº 3, do art. 194º, do C. Penal, ao produzir em audiência o depoimento que produziu.

Por outro lado, a conversação ouvida pela testemunha não respeita à vida íntima do recorrente não se colocando por isso, e agora numa outra perspectiva, a devassa da sua vida privada (art. 192º, do C. Penal).

Apesar da conduta da testemunha não se revelar ilícita, certo é que as proibições de prova não têm, necessariamente, que ter tal natureza.

Por outro lado, não é o depoimento da testemunha, em si mesmo, que se mostra afectado, mas antes a razão do conhecimento dos factos que são o seu objecto.

Dito de outra forma: a testemunha teve conhecimento dos factos que relatou em audiência porque, passivamente, os ouviu, mas tal audição apenas foi possível porque uma outra pessoa – a assistente – com o propósito de o permitir, activou, sem o consentimento do recorrente, um meio técnico de audição – alta voz do telemóvel usado na comunicação – que constitui uma intromissão em telecomunicações.


Assim, atento o disposto nos arts. 32º, nº 8, da Constituição da República Portuguesa e o art. 126º, nº 3, do C. Processo Penal, o depoimento prestado pela referida testemunha é prova nula.Tendo o depoimento que constituiu prova nula, contribuído para a formação da convicção do tribunal recorrido, relativamente ao crime de ameaça pelo qual foi o recorrente condenado – na fundamentação de facto da sentença, este depoimento é qualificado de muito importante – a procedência de tal nulidade determina a invalidade dos actos subsequentes (art. 122º, nº 1, do C. Processo Penal).

Desta forma, sendo inválida a sentença recorrida, deve o tribunal produzir nova sentença, agora sem considerar a prova considerada nula por proibida.

A procedência da nulidade da prova proibida prejudica o conhecimento das demais questões suscitadas nas conclusões do recurso, e que atrás se deixaram enunciadas.

III. DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar procedente a invocada nulidade da prova relativamente ao depoimento da testemunha K… e, em consequência, declaram a invalidade da sentença recorrida, e determinam a sua repetição, agora sem que seja atendida e ponderada a prova proibida.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Convenção relativa à Competência, à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsab. Parental e Medidas de Protecç

Decreto n.º 52/2008, D.R. n.º 221, Série I de 2008-11-13
Ministério dos Negócios Estrangeiros
Aprova a Convenção relativa à Competência, à Lei Aplicável, ao Reconhecimento, à Execução e à Cooperação em Matéria de Responsabilidade Parental e Medidas de Protecção das Crianças, adoptada na Haia em 19 de Outubro de 1996

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Processo Abreviado (art. 391º-A do CPP): acusação sem constituição prévia de arguido/admissibilidade

Tribunal da Relação de Coimbra
Rec. 24/08.OGAACB-A.C1


Acordam, em Conferência, na secção criminal:

Vem, pelo MP, interposto recurso do despacho proferido nos autos em epígrafe, com as seguintes conclusões :

A - Não se verificam as situações previstas no art. 3110 do CPP que permitam rejeitar a acusação pública;
B - A acusação para julgamento em processo abreviado respeita os requisitos exigidos pelo art. 391°-A do CPP;
C - Assim, o Ministério Público, face ao auto de notícia , podia e devia deduzir acusação para julgamento em processo abreviado;
D - Ao rejeitar aquela acusação, violou a Mina Juiz o disposto nos arts. 3110 e 391°-A do CPP.
E - Adquirindo-se a qualidade de arguido com a dedução de acusação e podendo o termo de identidade e residência ser aplicado pelo Juiz e tendo-se ainda em atenção o disposto no art. 391°-A, n°1 do C.P .P, não deveriam os autos terem sido remetidos ao Ministério Público para constituição de arguido e sujeição a T.I.R..

Deve, pois, o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que receba a acusação pública e designe data para julgamento, determinando ainda a sujeição do arguido a termo de identidade e residência.
*
Emitiu Parecer de provimento, o Ex.mo PGA.
*
Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

Foi o arguido, …, acusado pelo Ministério Público do prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292° n.° 1 e 69°, ambos do Código Penal.

Remetidos os autos à distribuição, o M.mo Juiz, nos termos do art. 311° e 391° c), ambos do C.P .P ., rejeitou essa mesma acusação, por o acusado não ter sido ainda constituído arguido nem ter prestado TIR.
Afigura-se-nos que sem razão.

Com efeito, estabelece o art° 311° n. °s 2 a) e 3 b) deste Diploma, que a acusação será rejeitada, por manifestamente infundada, quando não contenha o narração dos factos, e estipulando, por outro lado o art. ° 283° n° 3 b) do C.P.P., que a acusação contém, sob pena de nulidade: A narração ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de unia medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada,

Ora, cumprindo a acusação com todos estes requisitos, não podia também o Mm.º Juiz recusar a acusação a pretexto do falta de constituição do suspeito como arguido e subsequente TIR, pois que, para além do disposto no art. 57° n.º 1 do C.PP, refere-se no art. 391.° -A, n.° 1 do mesmo Diploma que, "Em caso de crime punível com pena de multa ou com pena de prisão não superior a 5 anos, havendo provas simples e evidentes de que resultem indícios suficientes de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente, o Ministério Público, em face do auto de notícia ou após realizar inquérito sumário, deduz acusação para julgamento em processo abreviado".
*
Termos em que, na procedência do recurso, se revoga o despacho recorrido que deve ser substituído por outro que receba a acusação e designe data para julgamento, determinando ainda a sujeição do arguido a termo de identidade e residência.
*
Sem tributação.
*
Coimbra, 15 de Outubro de 2008
Arlindo Félix de Almeida

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Prisão Preventiva/ Convolação de Tráfico para Tráfico de menor gravidade

Um arguido encontra-se acusado por crime de tráfico p. e p. pelo art. 21º do Dec. Lei n.º 15/93, de 22.01 e em prisão preventiva.

Vem a ser condenado depois por crime de tráfico de menor gravidade do art. 25º daquele diploma legal.

Atento o disposto nos arts. 202, n.º 1, al. b), conjugado com o art. 1º, al.m), ambos do Cód. Proc. Penal, que exclui o tráfico de menor gravidade do elenco dos crimes que integram o conceito de criminalidade "altamente organizada", a prisão preventiva não se pode manter, após prolacção do acórdão.

Nesse sentido apontam os artigos citados e ainda a analogia com o art. 214º, n.º 2, do C. P. Penal, de onde decorre que se deve atender à decisão condenatória para definição dos pressupostos da medida de coacção.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Bater nos filhos

Tribunal da Relação do Porto, Acórdão 10 Setembro 2008
Relator: José Joaquim Aniceto Piedade
Processo: 0841369

OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA. Preenche o tipo legal de crime de ofensa à integridade física qualificada o arguido que agride de forma violenta e reiterada, com ajuda de um cinto da tropa, o seu filho de treze anos apelidando-o de «vagabundo» e «cabrão», assim o humilhando, provocando-lhe imenso sofrimento físico e psíquico, apenas por ter faltado a uma aula, ultrapassando o poder-dever de correcção e educação dos pais em relação aos filhos. MEDIDA PENA. Aplicação da lei nova mais favorável. Pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada deve o arguido ser condenado na pena de um ano de prisão suspensa na sua execução por igual período.


Jurisprudência relacionada:

• No mesmo sentido, Ac.STJ de 05-02-1986 (in BMJ, 285)
• No mesmo sentido, Ac. STJ de 04-07-1996 (in CJSTJ, T2, pág 192)
• No mesmo sentido, Ac. STJ de 24-05-2001 (in CJSTJ, IX, Tomo 2, pág 201)
• No mesmo sentido, Ac. STJ de 03-11-2005, nº 11/2005 (in DR Série I-A, de 19/12/2005)
• No mesmo sentido, Ac. STJ de 15-09-1993 (in BMJ, pág 429-501)
• No mesmo sentido, Ac. STJ de 19-10-2000, nº 2803/00-5

Comentário:

No âmbito do Cód. Penal, com a redacção da Lei n.º 59/07, de 04.09, bater num filho ( sem outras consequências que não sejam as do art. 143º, n.º 1, ) - ou seja, num menor cuja idade permita concluir por uma situação de particular incapacidade de defesa -, no domicílio ( apenas, não cabendo aqui as hipóteses de factos ocorridos na rua ou na casa do vizinho, salvo para quem recorra a uma interpretação extensiva do art. 152º, n.º 2, do Cód. Penal ), pode integrar, em concurso aparente, os seguintes crimes:

- Um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos arts. 145º, n.º 1, al. a), por referência aos arts. 143º, n.º 1, e 132º, n.º 2, alªs. a) e c), do Cód. Penal, punível com pena de prisão até 4 anos;

- Um crime de maus tratos p. e p. pelo art. 152º-A, n.º 1, al. a), do Cód. Penal, punível com pena de 1 a 5 anos de prisão; e

- Um crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152º, n.º 1, al. d), e 2, do Cód. Penal, punível com pena de 2 a 5 anos de prisão.

O arguido de tal crime será seguramente punido pelo último crime, que consumirá os demais.

Se os factos não ocorrerem no domicílio, aplicar-se-á sempre o art. 152-A, n.º 1, al. a), do Cód. Penal.

Apreensão de veículo/Reserva de propriedade

Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão 16 Setembro 2008
Processo: 08B2181
Relator: Alberto de Jesus Sobrinho

APREENSÃO DO VEÍCULO. RESERVA DE PROPRIEDADE. O adquirente que recorre ao financiamento de um terceiro para adquirir um automóvel, este nunca poderá reservar para si a propriedade da coisa adquirida, pois não é, nem nunca foi o seu proprietário. A reserva de propriedade apenas está prevista para os contratos de transmissão da propriedade e nunca para os contratos de mútuo, mesmo que o vendedor ceda a sua reserva de propriedade ao financiador. Por não ser proprietário o financiador não tem legitimidade para lançar mão da providência cautelar de apreensão de veículo automóvel com base na reserva de propriedade.

Jurisprudência relacionada:

No mesmo sentido, Ac. STJ de 02-10-2007, nº 05B538

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

LIBERDADE CONDICIONAL

Acórdão da Relação de Coimbra, de 15-10-2008
Processo: 810/00. 9TXCBR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: DR.ª ELISA SALES
Descritores:

Sumário:

I. – O alargamento das possibilidades de controlo de indivíduos em situação de privação de liberdade através da vigilância electrónica operado pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2007, de 04.10 visou libertar as prisões da população prisional, de acordo com as recomendações da Comissão de Estudo da Reforma do Sistema Prisional e da Recomendação R (99) 22, do Conselho da Europa, de 30 de Setembro;
II. – Na concessão da liberdade condicional ou de concessão do período da adaptação à liberdade condicional a lei não postula a exigência da presença de defensor oficioso para decretamento da concessão mas tão só a audição pessoal do condenado para prestação do consentimento.
III. – Não ocorre, pois, a nulidade prevista na alínea c) do artigo 119.º do C.P.P. se o defensor oficioso não estiver presente no momento em que o condenado é ouvido para prestar o consentimento a que alude o artigo 485.º do Código de Processo Penal.

Nulidade da decisão da entidade administrativa/ Processo de Contra-Ordenação

Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 28-10-2008
Processo: 1441/08-1
Relator: JOÃO GOMES DE SOUSA

Sumário:

I. A necessidade, prevista no artigo 62º, nº 1 do RGCO, de enviar os autos ao Ministério Público só se compagina com a possibilidade e necessidade de este exercer o controlo próprio de uma magistratura, designadamente o controle do princípio da legalidade. A fase judicial do processo contra-ordenacional só se inicia com o envio dos autos ao juiz e a fase administrativa termina com a possibilidade de revogação da decisão pela entidade administrativa.
II. Cria-se, assim, uma fase intermédia entre aquelas duas naturezas do processo – a administrativa e a judicial – em que o processo se encontra na disponibilidade do MP e que podemos designar por fase “acusatória”. A tal fase só se podem entender aplicáveis, subsidiariamente, os artigos 277º e 283º do Código de Processo Penal, com as necessárias adaptações. Nesta fase acusatória o MP pode não deduzir acusação, o que corresponderá a uma revogação da decisão da entidade administrativa e à inutilidade superveniente da impugnação judicial.
III. O conceito de acusação em matéria penal contido no artigo 6º da CEDH, conceito com autonomia e que deve ser interpretado no sentido da Convenção, é interpretado pelo TEDH como abrangendo o direito contra-ordenacional.
É lícito ao Juiz rejeitar a “acusação” por manifestamente infundada fazendo apelo ao disposto no artigo 311º, nº 2, al. a) e 3 do Código de Processo Penal.
IV. A declaração de nulidade da decisão administrativa implica a aplicação do disposto no artigo 122º do Código de Processo Penal.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Divórcio

Lei n.º 61/2008, D.R. n.º 212, Série I de 2008-10-31
Assembleia da República
Altera o regime jurídico do divórcio

Alterações ao Código Penal:
«Artigo 249.º
[...]
1 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
a) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
b) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
c) De um modo repetido e injustificado, não cumprir
o regime estabelecido para a convivência do menor na
regulação do exercício das responsabilidades parentais,
ao recusar, atrasar ou dificultar significativamente a sua
entrega ou acolhimento;
é punido com pena de prisão até dois anos ou com
pena de multa até 240 dias.
2 — Nos casos previstos na alínea c) do n.º 1, a pena
é especialmente atenuada quando a conduta do agente
tiver sido condicionada pelo respeito pela vontade do
menor com idade superior a 12 anos.
3 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Artigo 250.º
[...]
1 — Quem, estando legalmente obrigado a prestar
alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação
no prazo de dois meses seguintes ao vencimento,
é punido com pena de multa até 120 dias.
2 — A prática reiterada do crime referido no número
anterior é punível com pena de prisão até um ano ou
com pena de multa até 120 dias.
3 — (Anterior n.º 1.)
4 — Quem, com a intenção de não prestar alimentos,
se colocar na impossibilidade de o fazer e violar a
obrigação a que está sujeito criando o perigo previsto
no número anterior, é punido com pena de prisão até
dois anos ou com pena de multa até 240 dias.
5 — (Anterior n.º 3.)
6 — (Anterior n.º 4.)»

Normas da Lei com especial interesse:

Artigo 9.º
Norma transitória
O presente regime não se aplica aos processos pendentes
em tribunal.

Comentário: ressalvado, obviamente, o art. 2º do Cód. Penal.

Artigo 10.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.