terça-feira, 5 de abril de 2011

Impugnação da matéria de facto: modo de interposição do recurso.

 

 

Supremo Tribunal de Justiça, Secção Criminal, Acórdão de 1 Jul. 2010, Processo Procº Nº 241/08.2GAMTR.P1.S1

Relator: Santos Carvalho.

Processo: Procº Nº 241/08.2GAMTR.P1.S1

Jurisdição: Criminal

Colectânea de Jurisprudência, N.º 224, Tomo II/2010

Sumário:

Impugnação da matéria de facto: modo de interposição do recurso.

Texto Parcial:

«…Ora analisando a motivação e as conclusões do recurso verifica se que o recorrente indica os pontos de facto provados que alega incorrectamente julgados (por isso não deviam ser provados), e indica os meios de prova usados, avalia os e indica que não podiam levar á convicção a que o tribunal chegou e indica os como impondo decisão diversa, e fazendo referência aos ficheiros das gravações dos depoimentos testemunhais indicados remete para a totalidade desse depoimentos, não satisfazendo a exigência dos n.ºs 3 e 4 citados não indicando as concretas passagens das gravações em que funda a impugnação que imporia decisão diversa, uma vez que o que a lei pretende que o recorrente indique o facto incorrectamente julgado, indique que a prova X..., (que identifica com o inicio e fim da parte do depoimento no caso de a prova ser testemunhal) impunha decisão diversa e porquê, e diga qual era essa decisão, e indique concretamente as passagens gravadas do depoimento que impõem essa alteração (n.º 4), a fim de o tribunal de recurso proceder á audição dessas passagens (n.º 6).

Ora o arguido recorrente não satisfaz as indicações exigidas pela lei que são essenciais, pois "... à Relação não cumpre proceder a um novo julgamento em matéria de facto, apreciando a globalidade das "provas" produzidas em audiência, antes lhe competindo, atenta a forma como se encontra estruturado o recurso... (cfr. Damião da Cunha, O Caso Julgado Parcial, 2002, pág. 37), emitir juízos de censura crítica ", face á forma de impugnar a decisão proferida sobre matéria de facto (passível de modificação se, havendo documentação, a prova tiver sido impugnada, nos termos do artigo 412°, n.º 3, a) e b), art. 431° b) CPP aí se impondo a especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados bem como as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (a expressão "concreta" é nova sendo introduzida pela nova Lei que alterou o CNI, e traduz o que já era Jurisprudência e Doutrina assente).

E como se refere no Ac. TC 140/04 cit. "a indicação exigida pela alínea b) do n.º 3 e pelo n.º 4 do artigo 412° do Código de Processo Penal... é imprescindível logo para a delimitação do âmbito da impugnação da matéria de facto, e não um ónus meramente formal. O cumprimento destas exigências condiciona a própria possibilidade de se entender e delimitar a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, exigindo se, pois, referências específicas,... ", ora concretas o que está de acordo com o facto de "... o recurso não é tudo, é um remédio para os erros, não é novo julgamento" (G. Marques da Silva, Conferência parlamentar sobre a revisão do C.P.P., A.R., Cód. Proc. Penal, vol. II, tomo II, Lisboa 1999, pág. 65), e constituindo apenas um remédio para os vícios, o tribunal ad quem verifica apenas da legalidade da decisão recorrida tendo em conta todos os elementos de que se serviu o tribunal que proferiu a decisão e daí a importância da indicação da lei, porque o recurso em matéria de facto, destina se apenas á apreciação de pontos concretos e determinados.

Só assim pode ser entendido o especial dever de motivação e das conclusões que apenas se satisfaz com a especificação, ponto por ponto, do que foi mal decidido, como das provas concretas que " impõem decisão diversa" por referência à concreta passagem do depoimento gravada.

Assim está a Relação impossibilitada de apreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto (cfr. Ac. R. G. 25/6/07 in www.dgs.pt, Ac. STJ de 5/6/08 in www.dgsi.itij/pt proc. nº 08P1884, AC.TC. n.º 140/2004, de 10 de Março, proc. nº 565/2003, DR, II série, de 17 de Abril de 2004, Ac. do STJ de 15 7 2004, proc. nº 2360/04 5a, in Ac. Guimarães citado) e tal não é desconforme á Constituição como decidiu o TC, em relação ao art. 412°3 CPP no Ac. nº 140/04 de 10/3, DR IP Série, de 17/4/04, em relação aos nºs 3 e 4 do art. 412° CPP, ac. nº 259/02, in http//tribunalconstitucional.pt, e, no ac. 488/04 porque está em causa algo "imprescindível... para a delimitação do âmbito da impugnação da matéria de facto... O cumprimento destas exigências condiciona a própria possibilidade de se entender e delimitar a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, exigindo se, pois, referências especificas, e não apenas uma impugnação genérica da decisão preferida em matéria de facto" sendo que, " no caso das exigências constantes do artigo 412° nºs 3, alínea b) e 4 do Código de Processo Penal, cujo cumprimento incluindo a referência aos suportes técnicos, com indicação da cassete em causa e da localização nesta da gravação das provas em questão) não é desproporcionado e antes serve uma finalidade de ordenamento processual claramente justificada", sendo que a indicação que o recorrente faz das provas testemunhais em que se baseia, não satisfaz a exigência de especificação (ou indicação exacta e ora passagem concreta) do art. 412° 4, CPC (a parte do depoimento que impõe decisão diversa).

Nesse sentido o Ac. R. Porto de 7/2/07 Proc. 2897/06 4 do seguinte teor:

"Esta exigência legal não se basta com a mera indicação de que os depoimentos chamados à colação se encontram gravados; ou que se encontram gravados na cassete nº tal; ou gravados no lado A ou B da cassete nº tal; ou ainda, por forma mais sofisticada mas igualmente inútil, que o depoimento da testemunha T.. se encontra gravado na cassete nº tal, lado A ou B, de voltas x a voltas y. Disso toma conhecimento o tribunal de recurso através de mera consulta da acta, de onde necessariamente constam tais informações, pelo que não faria sentido impor ao recorrente que desse nota desses elementos.

O que se exige é que o recorrente, sustentando que um determinado ponto de facto foi incorrectamente julgado, o indique expressamente, mencionando aprova que confirma a sua posição; e tratando se de depoimento gravado, que indique também, por referência ao correspondente suporte técnico, os segmentos relevantes da gravação. " Interpretação esta que está em conformidade com o expendido no Ac. T.C. 488/04.

A existência da gravação não substituiu a exigência legal imposta ao recorrente, pelo que aderimos á decisão desta Relação, no Ac. de 7/2/07 Proc 2897/05.4, pelo que nessa parte (art. 403°CPP) deve o recurso ser rejeitado art. 420° CPP e dele não se conhecer, em razão do que não pode a matéria de facto ser alterada pela Relação com base na prova testemunhal indicada e se considera definitivamente fixada (art. 431°b) CPP), salvo se ocorrer outro motivo para a sua modificação, como os que se analisarão a seguir.

O Tribunal da Relação, perante as falhas que apontou ao recurso quanto à impugnação da matéria de facto por confronto com as provas produzidas na audiência e documentadas em acta, falhas essas que revelariam um alegado mau cumprimento do disposto nos n.ºs 3 e 4 do art.º 412.º do CPP, deveria ter mandado aperfeiçoar as conclusões do recurso antes de se pronunciar, como tem sido jurisprudência constante deste STJ e do Tribunal Constitucional, para permitir um segundo grau de recurso em matéria de facto.

O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar inconstitucional, por violação dos direitos a um processo equitativo e do próprio direito ao recurso, as normas dos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP na interpretação segundo a qual o incumprimento dos ónus aí fixados, conduz à rejeição do recurso, sem a possibilidade de aperfeiçoamento (cfr. Acs de 26-9-01, proc. n.º 2263/01, de 18-10-01, proc. n.º 2374/01, de 10-4-02, proc. n.º 153/00, de 5-6-02, proc. n.º 1255/02, de 7-10-04, proc. n.º 3286/04-5, de 17-2-05, proc. n.º 4716/04-5, e de 15-12-05, proc. n.º 2951/05-5).

Assim decidiu que "(5) se o recorrente não deu cabal cumprimento às exigências do n.º 3 e especialmente do n.º 4 do art. 412.º do CPP, a Relação não pode sem mais rejeitar o recurso em matéria de facto, nem deixar de o conhecer, por ter por imodificável a matéria de facto, nos termos do art. 431.º do CPP. (6) Este último artigo, como resulta do seu teor, não toma partido sobre o endereçar ou não do convite ao recorrente, em caso de incumprimento pelo recorrente dos ónus estabelecidos nos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º, antes vem prescrever, além do mais, que a Relação pode modificar a decisão da 1.ª instância em matéria de facto, se, havendo documentação da prova, esta tiver sido impugnada, nos termos do artigo 412.º, n.º 3, não fazendo apelo, repare-se, ao n.º 4 daquele artigo, o que no caso teria sido infringido. (7) - Saber se a matéria de facto foi devidamente impugnada à luz do n.º 3 do art. 412.º é questão que deve ser resolvida à luz deste artigo e dos princípios constitucionais e de processo aplicáveis, e não à luz do art. 431.º, al. b), cuja disciplina antes pressupõe que essa questão foi resolvida a montante. (8) Entendendo a Relação que o recorrente não forneceu os elementos legais necessários para reapreciar a decisão de facto nos pontos que questiona, a solução não é "a improcedência", por imodificabilidade da decisão de facto, mas o convite para a correcção das conclusões. (Acs de 7-11-02, proc. n.º 3158/02-5 e de 15-5-03, proc. n.º 985/03-5)".

E que, face à declaração com força obrigatória geral da inconstitucionalidade da norma do art. 412.º, n.º 2, do CPP, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas als. a), b) e c) tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência (Ac. n.º 320/2002 do T. Constitucional, DR-IA, 07.10.2002), não pode manter-se a decisão da Relação que decidiu não tomar conhecimento dos recursos no que se refere à decisão de facto, por não terem os recorrentes dado cumprimento ao imposto nos n.º 3 e 4 daquele art. 412.º.

Em tal caso a Relação deve tomar posição sobre a suficiência ou insuficiência das conclusões das motivações e ordenar, se for caso disso, a notificação do recorrente para corrigir/completar as conclusões das motivações de recurso, conhecendo, depois, desses recursos. (Acs. de 12-12-2002, proc. n.º 4987/02-5, de 7-10-04, proc. n.º 3286/04-5, de 17-2-05, proc. n.º 4716/04-5, e de 15-12-05, proc. n.º 2951/05-5).

Só não será assim se o recorrente não tiver respeitado, de todo, as especificações a que se reporta a norma legal em causa, pois o conteúdo do texto da motivação constitui um limite absoluto que não pode ser extravasado através do convite à correcção das conclusões da motivação (cfr. os Acs. do STJ de 11-1-01, proc. n.º 3408/00-5, de 8-11-01, proc. n.º 2453/01-5, de 4-12-03, proc. n.º 3253/03-5 e de 15-12-05, proc. n.º 2951/05-5).

Mas, se o recorrente, como é o caso dos autos, tendo embora indicado os pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa, com a indicação, nomeadamente, das testemunhas cujos depoimentos incidiram sobre tais pontos, que expressamente indicou (v.g., falta de vestígios de sangue na roupa, hora em que ocorreu o homicídio e permanência do arguido no local de trabalho entre determinadas horas), só lhe faltando indicar "as concretas passagens das gravações em que funda a impugnação que imporia decisão diversa", não se pode dizer que há uma total falta de especificações, mas, quanto muito, uma incorrecta forma de especificar. Tanto mais que, se o recorrente tem o ónus de indicar as concretas passagens das gravações, o tribunal tem o dever de atender a outras que considere relevantes para a descoberta da verdade (art.º 412.º, n.º 6, do CPP), sob pena do recorrente "escolher" a passagem que mais lhe convém e omitir tudo o mais que não lhe interessa, assim se defraudando a verdade material.

A Relação, ao proceder da forma como transcrevemos, não conheceu da impugnação da matéria de facto, já que a rejeitou por razões meramente formais e não deu oportunidade ao recorrente de corrigir os pequenos desvios em que, alegadamente, incorreu.

Portanto, omitiu pronúncia sobre questão de que deveria conhecer e incorreu na nulidade a que se reportam os art.ºs 379.º, n.º 1, al. c) e 425.º, n.º 4, do CPP.

Esse vício é sanável no tribunal recorrido, devendo o mesmo, antes de mais, conceder um prazo ao recorrente para o aperfeiçoamento.

Só depois de fixada a matéria de facto é que o tribunal da Relação terá nova oportunidade de abordar as restantes questões suscitadas pelo recorrente.

5. Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em anular o acórdão recorrido e em mandá-lo repetir, com sanação do apontado vício e após a referida notificação ao recorrente.

Não há lugar a tributação.

Notifique.

Supremo Tribunal de Justiça, 1 de Julho de 2010

Os Juízes Conselheiros

Santos Carvalho

Arménio Sottomayor»

Fundo de Garantia de Alimentos

 

 

ACÓRDÃO N.º 87/2011

Processo n.º 844/10

2.ª Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Em processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, por sentença proferida em 25 de Novembro 2008, A. foi condenado a pagar mensalmente, a título de alimentos, a quantia de € 130, actualizável anualmente em 3% ou de acordo com a taxa de inflação se superior, a partir de 2010, a cada um dos seus filhos menores, B. e C..

Posteriormente, D., mãe daqueles menores, veio requerer em Fevereiro de 2010 que as pensões de alimentos acima referidas fossem suportadas pelo F.G.A.D.M (Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social) por se encontrarem verificados os requisitos exigidos pelo artigo 3.º, Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, que veio regulamentar a Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro.

Após instrução do pedido e emissão de parecer favorável do Ministério Público, foi proferida sentença que condenou o F.G.A.D.M. a pagar mensalmente a D. as pensões de alimentos, relativas aos filhos B. e C., no montante mensal de €136,50, por cada um, desde Fevereiro de 2010, após recusar a aplicação do disposto no artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-lei n.º 164/99, de 13 de Maio, com fundamento na sua inconstitucionalidade.

O Ministério Público interpôs recurso desta decisão, na parte em que recusou a aplicação do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, nos termos conjugados dos artigos 202º, nº 1 e 2, 203º e 204º, todos da Constituição da República Portuguesa, por inconstitucionalidade material (por violação do disposto nos artigos 1º, 7º, nº 5 e 6, 13º, 63º, nº 3, 67º, nº 2, alíneas c) e g), 69º e 81º alíneas a) e b) da Constituição da República Portuguesa), nos termos do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), 72.º, n.º 3, 75.º-A, n.º 1, 78.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.

Apresentou alegações em que concluiu que devia ser “julgada inconstitucional, por violação dos arts. 69º nº 1 e 63º, nºs 1 e 3 da Constituição da República Portuguesa, a norma do art. 4º, nº 5 do Decreto-Lei 164/99, de 13 de Maio, quando interpretada no sentido literal de que a obrigação de prestação de alimentos a menor, assegurada pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, em substituição do devedor, só nasce com a decisão que julgue o incidente do incumprimento do devedor originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal, não abrangendo, porém, quaisquer prestações anteriores”.

Fundamentação

1. Delimitação do objecto do recurso

Na sentença recorrida declarou recusar-se a aplicação do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, com fundamento na sua inconstitucionalidade.

Dispõe este preceito:

“O Centro Regional de Segurança Social inicia o pagamento das prestações, por conta do Fundo, no mês seguinte ao da notificação da decisão do tribunal”.

O Ministério Público interpôs recurso, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da LTC, pedindo a fiscalização da constitucionalidade do n.º 5, do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio.

Nas alegações de recurso, restringiu o objecto do pedido de fiscalização a uma determinada interpretação deste dispositivo.

Da leitura da fundamentação da decisão recorrida constata-se que esta interpretou o transcrito preceito com o sentido de que a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as pensões de alimentos a menor judicialmente fixadas, em substituição do devedor, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

E foi este critério normativo, extraído da interpretação do referido artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, que a decisão recorrida considerou que violava a Constituição, como caminho necessário para, no caso concreto, poder determinar o pagamento pelo FGADM das pensões de alimentos devidas a dois menores desde Fevereiro de 2010 (data do pedido).

Assim sendo, constata-se que a norma recusada foi precisamente essa leitura normativa do n.º 5, do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, pelo que deve ser ela a integrar o objecto do presente recurso de constitucionalidade

2. Do mérito do recurso

O Tribunal Constitucional já teve ocasião de se pronunciar sobre a questão de constitucionalidade que agora vem colocada à sua consideração.

Com efeito no acórdão n.º 54/2011 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt) decidiu-se julgar inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 69.º, n.º 1, e 63.º, n.º 1 e 3, da Constituição, a norma constante do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, na interpretação de que a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as pensões de alimentos a menor judicialmente fixadas, em substituição do devedor, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

A jurisprudência fixada neste acórdão é inteiramente transponível para o presente caso, pelo que, remetendo-se para a respectiva fundamentação, mantém-se a posição de considerar inconstitucional a referida interpretação normativa.

Decisão

Pelo exposto, decide-se:

a) Julgar inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 69.º, n.º 1, e 63.º, n.º 1 e 3, da Constituição, a norma constante do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, na interpretação de que a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as pensões de alimentos a menor judicialmente fixadas, em substituição do devedor, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

b) E, em consequência, julgar improcedente o recurso.

Sem custas.

Lisboa, 15 de Fevereiro de 2011.- João Cura Mariano – Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido quanto ao conhecimento, nos termos da declaração exarada no Acórdão n.º 54/2011) – Catarina Sarmento e Castro (Por ser inteiramente transponível, remeto para a minha declaração de voto no Acórdão n.º 54/2011) – Rui Manuel Moura Ramos.

FUNDO DE GARANTIA

Fundo de Garantia

Tribunal Constitucional
Acórdão 54/2011, de 1 Fev. 2011, Processo 707/10
Relator:João Eduardo Cura Mariano Esteves

Sumário:
As prestações alimentares atribuídas aos menores devem cobrir todo o período em que se verifica o incumprimento por parte dos pais do dever de proverem à subsistência dos seus filhos, desde que exista um mecanismo que permita acorrer, num curto espaço de tempo, aos casos de necessidade urgente. O Tribunal julga inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 69.º, n.º 1, e 63.º, n.º 1 e 3, da Constituição, a norma constante do artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, na interpretação de que a obrigação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores assegurar as pensões de alimentos a menor judicialmente fixadas, em substituição do devedor, só se constitui com a decisão do tribunal que determine o montante da prestação a pagar por este Fundo, não sendo exigível o pagamento de prestações respeitantes a períodos anteriores a essa decisão.

Em sentido equivalente:
TC, 3ª Secção, Ac. de 8 de Junho de 2005
TC, Ac. de 19 de Dezembro de 2002

Em sentido contrário:
STJ, Secção Cível, Ac. de 7 de Julho de 2009