terça-feira, 2 de setembro de 2008

Tomada em consideração das decisões de condenação nos Estados-Membros da União Europeia por ocasião de um novo procedimento penal

Decisão-Quadro 2008/675/JAI do Conselho, de 24 de Julho de 2008 , relativa à tomada em consideração das decisões de condenação nos Estados-Membros da União Europeia por ocasião de um novo procedimento penal Jornal Oficial nº L 220 de 15/08/2008 p. 0032 - 0034

Decisão-Quadro 2008/675/JAI do Conselho
de 24 de Julho de 2008
relativa à tomada em consideração das decisões de condenação nos Estados-Membros da União Europeia por ocasião de um novo procedimento penal

O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,
Tendo em conta o Tratado da União Europeia, nomeadamente o artigo 31.o e a alínea b) do n.o 2 do artigo 34.o,
Tendo em conta a proposta da Comissão,
Tendo em conta o parecer do Parlamento Europeu [1],
Considerando o seguinte:
(1) A União Europeia estabeleceu como objectivo manter e desenvolver um espaço de liberdade, segurança e justiça. Este objectivo pressupõe que as informações relativas às decisões de condenação proferidas nos Estados-Membros possam ser tomadas em consideração fora do Estado-Membro de condenação, tanto para prevenir novas infracções como por ocasião de um novo procedimento penal.
(2) Em 29 de Novembro de 2000 e em conformidade com as conclusões do Conselho Europeu de Tampere, o Conselho aprovou o Programa de medidas destinadas a aplicar o princípio do reconhecimento mútuo das decisões penais [2] estabelecendo que a "aprovação de um ou mais instrumentos jurídicos que consignem o princípio segundo o qual o juiz de um Estado-Membro deve estar em condições de tomar em consideração as decisões penais transitadas em julgado proferidas nos outros Estados-Membros para apreciar os antecedentes criminais do delinquente, para ter em conta a reincidência e para determinar a natureza das penas e as regras de execução susceptíveis de serem aplicadas".
(3) A presente decisão-quadro destina-se a instituir a obrigação mínima de os Estados-Membros tomarem em consideração condenações proferidas noutros Estados-Membros. Por conseguinte, a presente decisão-quadro não deverá impedir os Estados-Membros de tomarem em consideração, em conformidade com o respectivo direito nacional e caso disponham de informações, por exemplo, decisões definitivas proferidas por autoridades administrativas cujas decisões sejam susceptíveis de recurso para um órgão jurisdicional competente em matéria penal, que declarem a culpabilidade de uma pessoa por uma infracção penal ou acto punível nos termos do direito nacional por constituir infracção às normas jurídicas.
(4) Alguns Estados-Membros atribuem efeitos às condenações penais proferidas noutros Estados-Membros, enquanto outros só tomam em consideração as decisões de condenação nacionais.
(5) Importa estabelecer o princípio de que uma decisão de condenação proferida num Estado-Membro deverá ter nos outros Estados-Membros efeitos equivalentes aos das condenações proferidas de acordo com o direito nacional, independentemente de se tratar de elementos de facto ou de direito processual ou substantivo. Porém, a presente decisão-quadro não se destina a harmonizar os efeitos atribuídos pelas diferentes legislações nacionais à existência de condenações anteriores, e a obrigação de ter em conta condenações anteriores proferidas noutros Estados-Membros só existe na medida em que as condenações nacionais anteriores sejam tomadas em consideração nos termos do direito nacional.
(6) Em contraste com outros instrumentos, a presente decisão-quadro não se destina a executar num Estado-Membro decisões judiciais tomadas noutros Estados-Membros, mas sim a permitir que se tirem consequências de uma condenação anterior proferida num Estado-Membro por ocasião de um novo procedimento penal noutro Estado-Membro, na medida em que são tiradas as mesmas consequências de condenações nacionais anteriores nos termos da lei desse outro Estado-Membro.
Por conseguinte, a presente decisão-quadro não impõe a obrigação de ter em conta essas condenações anteriores, por exemplo, nos casos em que a informação obtida ao abrigo dos instrumentos aplicáveis não seja suficiente, em que não teria sido possível uma condenação nacional pelo facto que deu lugar à anterior condenação, ou em que a pena anteriormente aplicada não se encontre prevista no sistema jurídico nacional.
(7) Os efeitos atribuídos às decisões de condenação proferidas noutro Estado-Membro deverão ser equivalentes aos das decisões nacionais, quer se trate da fase que antecede o processo penal, quer do processo penal em si, quer ainda da fase de execução da pena.
(8) Quando, por ocasião de um procedimento penal num Estado-Membro, existam informações sobre uma condenação anterior noutro Estado-Membro, deverá evitar-se, tanto quanto possível, que a pessoa em causa seja tratada de forma menos favorável do que se a condenação anterior tivesse sido uma condenação nacional.
(9) O n.o 5 do artigo 3.o deverá ser interpretado, nomeadamente de acordo com o considerando 8, por forma a que se, no novo procedimento penal, o tribunal nacional, ao ter em conta uma pena anterior proferida noutro Estado-Membro, considerar que impor determinado nível de pena dentro dos limites da legislação nacional é proporcionalmente severo para o infractor, tendo em conta as circunstâncias e se o objectivo da sanção puder ser alcançado através de uma pena mais branda, poderá reduzir o nível da pena em conformidade, se tal fosse possível em processos de âmbito puramente nacional.
(10) A presente decisão-quadro destina-se a substituir as disposições do artigo 56.o da Convenção Europeia de 28 de Maio de 1970, sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, relativas à tomada em consideração das sentenças penais, nas relações entre os Estados-Membros partes nessa Convenção.
(11) A presente decisão-quadro respeita o princípio da subsidiariedade consagrado no artigo 2.o do Tratado da União Europeia e no artigo 5.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, na medida em que o seu objectivo de aproximar as disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros não pode ser realizado de forma suficiente pelos Estados-Membros agindo unilateralmente e pressupõe uma acção concertada a nível da União Europeia. Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 5.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, a presente decisão-quadro não excede o necessário para atingir aquele objectivo.
(12) A presente decisão-quadro respeita os direitos fundamentais e os princípios consagrados no artigo 6.o do Tratado da União Europeia e reflectidos na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
(13) A presente decisão-quadro respeita as diversas soluções e procedimentos nacionais necessários para ter em conta uma condenação anterior proferida noutro Estado-Membro. A exclusão da possibilidade de rever uma condenação anterior não deverá impedir um Estado-Membro de proferir uma decisão, se necessário, a fim de atribuir efeitos jurídicos equivalentes a essa condenação anterior. Contudo, os procedimentos necessários para que tal decisão seja proferida não deverão, tendo em conta o tempo e os trâmites ou formalidades requeridos, impedir que uma condenação anterior proferida noutro Estado-Membro produza efeitos equivalentes.
(14) A interferência com uma sentença ou a sua execução abrangem, nomeadamente, as situações em que, nos termos do direito nacional do segundo Estado-Membro, a pena imposta por uma sentença anterior deva ser absorvida por outra pena ou nela incluída, devendo então ser efectivamente executada, na medida em que a primeira sentença não tenha ainda sido executada ou a sua execução não tenha sido transferida para o segundo Estado-Membro,
APROVOU A PRESENTE DECISÃO-QUADRO:
Artigo 1.o
Objecto
1. A presente decisão-quadro tem por objectivo definir as condições em que, por ocasião de um procedimento penal num Estado-Membro contra determinada pessoa, são tidas em consideração condenações anteriores contra ela proferidas noutro Estado-Membro por factos diferentes.
2. A presente decisão-quadro não deve ter por efeito alterar a obrigação de respeitar os direitos e os princípios jurídicos fundamentais consagrados no artigo 6.o do Tratado.
Artigo 2.o
Definições
Para efeitos da presente decisão-quadro, entende-se por "condenação" qualquer decisão definitiva de um tribunal penal que declare a culpabilidade de uma pessoa por uma infracção penal.
Artigo 3.o
Tomada em consideração, por ocasião de um novo procedimento penal, de uma condenação proferida noutro Estado-Membro
1. Cada Estado-Membro assegura que, por ocasião de um procedimento penal contra determinada pessoa, as condenações anteriores contra ela proferidas por factos diferentes noutros Estados-Membros, sobre as quais tenha sido obtida informação ao abrigo dos instrumentos aplicáveis em matéria de auxílio judiciário mútuo ou por intercâmbio de informação extraída dos registos criminais, sejam tidas em consideração na medida em que são condenações nacionais anteriores e lhes sejam atribuídos efeitos jurídicos equivalentes aos destas últimas, de acordo com o direito nacional.
2. O n.o 1 é aplicável na fase que antecede o processo penal, durante o processo penal propriamente dito ou na fase de execução da condenação, nomeadamente no que diz respeito às regras processuais aplicáveis, inclusive as que dizem respeito à prisão preventiva, à qualificação da infracção, ao tipo e ao nível da pena aplicada, ou ainda às normas que regem a execução da decisão.
3. A tomada em consideração de condenações anteriores proferidas noutros Estados-Membros, tal como prevista no n.o 1, não tem por efeito interferir com essas condenações nem com qualquer decisão relativa à sua execução, nem que as mesmas sejam revogadas ou reexaminadas pelo Estado-Membro em que decorre o novo procedimento.
4. Em conformidade com o n.o 3, o n.o 1 não se aplica na medida em que, se a condenação anterior tivesse sido uma condenação nacional proferida no Estado-Membro em que decorre o novo procedimento, a tomada em consideração dessa condenação teria tido por efeito, de acordo com o direito nacional desse Estado-Membro, interferir com a condenação anterior ou com qualquer outra decisão relativa à sua execução, ou levar à sua revogação ou ao seu reexame.
5. Se a infracção que levou à instauração do novo procedimento tiver sido cometida antes de ser proferida ou integralmente executada a condenação anterior, o disposto nos n.os 1 e 2 não deve ter por efeito obrigar os Estados-Membros a aplicarem as respectivas normas nacionais ao imporem sentenças, caso a aplicação dessas normas a condenações estrangeiras limite o juiz na imposição da pena no âmbito do novo procedimento.
Os Estados-Membros asseguram, contudo, a possibilidade de, nesses casos, os seus tribunais tomarem em consideração as condenações anteriores proferidas noutros Estados-Membros.
Artigo 4.o
Relações com outros instrumentos jurídicos
A presente decisão-quadro substitui o artigo 56.o da Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, de 28 de Maio de 1970, nas relações entre os Estados-Membros partes nessa Convenção, sem prejuízo da aplicação desse artigo nas relações entre os Estados-Membros e países terceiros.
Artigo 5.o
Aplicação
1. Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para dar cumprimento à presente decisão-quadro até 15 de Agosto de 2010.
2. Os Estados-Membros devem comunicar ao Secretariado-Geral do Conselho e à Comissão o texto das disposições que transpõem para o respectivo direito nacional as obrigações decorrentes da presente decisão-quadro.
3. Com base nessas informações, a Comissão deve apresentar ao Parlamento Europeu e ao Conselho, até 15 de Agosto de 2011, um relatório sobre a aplicação da presente decisão-quadro, acompanhado, se necessário, de propostas legislativas.
Artigo 6.o
Entrada em vigor
A presente decisão-quadro entra em vigor no dia da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia.
Feito em Bruxelas, em 24 de Julho de 2008.
Pelo Conselho
O Presidente
B. Hortefeux
[1] Parecer emitido em 27 de Setembro de 2006 (ainda não publicado no Jornal Oficial).
[2] JO C 12 de 15.1.2001, p. 10.
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