sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Um acórdão interessante - competência em caso de vários crimes elencados no art. 16º, n.º 2, al a), do C. P. Penal

Sumário:

Se no mesmo processo são mais de um os crimes abrangidos pela previsão da alínea a) do nº 2 do art. 16º do Código de Processo Penal, a competência para o julgamento pertence ao tribunal colectivo, quando o limite máximo da pena aplicável ao concurso de crimes é superior a 5 anos de prisão.


Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal, do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
No processo supra identificado, findo o inquérito, o MP deduziu acusação, para julgamento em processo colectivo, contra o arguido B………., imputando-lhe a prática de factos que qualificou como susceptíveis de integrar em autoria material, na forma consumada e em concurso real, em número de 2, a previsão do tipo legal de crime de resistência e coacção sobre funcionário, pp. e pp. pelo artigo 347º C Penal. Distribuído o processo à .ª Vara Criminal do Círculo do Porto, aí foi, proferido o seguinte despacho:“ao arguido vem imputada a prática de 2 crimes de resistência e coacção sobre funcionário, pp. e pp. pelo artigo 347º C Penal, tendo sido requerido o julgamento com intervenção do Tribunal Colectivo. Pese embora o número de crimes em apreço (no mínimo é discutível se se trata apenas de um crime, pois que o tipo e, apreço não visa a protecção de cada agente da autoridade, mas, isso sim, a protecção da objectiva actuação da autoridade), denegamos a atribuída competência, porquanto a competência para o julgamento de tais ilícitos é sempre do tribunal singular, conforme decorre imperativamente do preceituado no artigo 16º/2 alínea a) C P Penal. Termos em que e, sem necessidade de maiores considerandos e ao abrigo do disposto nos artigos 14º “a contrario”, 16º, 32º/1 e 33º C P Penal, declaramos este Tribunal incompetente para julgar os presentes autos, competência, que, salvo melhor opinião, deve ser atribuída aos Juízos Criminais do Porto, a quem deverão ser os autos remetidos para ali virem a ser distribuídos. Não se vislumbra que existam actos urgentes que devam ser levados a cabo nesta altura, cfr. artigo 33º/2 C P Penal.Notifique.Após trânsito, remeta os autos conforme supra ordenado e dê conhecimento ao ilustre subscritor da acusação”. Nos juízos Criminais, foi proferido o seguinte despacho:“registe e autue como processo comum. Questão prévia:Nos presentes autos o arguido B………. encontra-se acusado pela autoria material e em concurso real por 2 crimes de resistência e coacção a funcionário, pp. e pp. pelo artigo 347º C Penal, cabendo a cada um deles prisão até 5 anos.O MP acusou o arguido em processo comum e com a intervenção do Tribunal Colectivo, não tendo por isso feito uso do artigo 16º/3 C P Penal.O processo foi distribuído pela .ª Vara Criminal do Porto, que conforme despacho de fls. 131 se declarou materialmente incompetente para julgar os crimes dos autos e competente o Tribunal de estrutura singular, nos termos aí alinhados.Previamente ao despacho que declarou o tribunal de estrutura colectiva materialmente incompetente, não houve efectiva e transitada convolação da qualificação jurídica dos factos vertidos na acusação e imputados ao arguido, pelo que se mantém a mesma qualificação jurídica constante daquela.Ora salvo o devido respeito por opinião diversa, não concordamos com a douta opinião aí expressa.Na situação em apreço, o arguido foi acusado pela autoria material e em concurso real, por 2 crimes e a pena máxima abstractamente aplicável é superior a 5 anos de prisão, mais concretamente 10 anos.Ora nos termos do artigo 16º/2 C P Penal, “compete também ao tribunal singular, em matéria penal julgar os processos que respeitarem a crimes:a) previstos no capítulo III do Título V do Livro II C Penal:b) cuja pena máxima, abstractamente aplicável seja igual o inferior a 5 nos de prisão”.Em nenhum sítio deste número se diz, ainda que em situação de concurso.É que para a situação de concurso de crimes, ainda que, com os constantes das alíneas a) rege o nº. 3 do artigo 16º C P Penal, que prescreve que, “compete ainda ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos no artigo 14º/2 alínea a), mesmo que em caso de concurso de infracções, quando o MP na acusação ou em requerimento, quando seja superveniente o conhecimento do concurso, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena superior a 5 anos”.Isto significa que em primeira linha a competência para julgar os processos cuja pena máxima aplicável for superior a 5 anos, pertence a um Tribunal de estrutura colectiva e, só a intervenção limitativa do MP, fazendo uso do artigo 16º/3 C P Penal, atribui competência para julgar o processo a um Tribunal singular.No caso dos autos o MP acusou em processo e com a intervenção do Tribunal Colectivo, pelo que a competência para julgar o concurso de infracções imputadas ao arguido, pertence ao Tribunal de estrutura colectiva, cfr. artigo 14º/2 alínea b) C P Penal, pois que não foi feito uso do disposto no artigo 16º/3 C P Penal.Em conformidade com o que vimos dizendo, pronunciou-se o Tribunal da Relação do Porto de 16.5.2007, in http://wwwdgsi.pt/jtrp com o nº. convencional JTRP00040327, que se debruça sobre a competência do Tribunal, no caso de concurso de infracções.Pelo exposto e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 14º/2 alínea b) e 16º/2 alínea b) e nº. 3 “a contrario”, ambos do C P Penal, declaro este Tribunal singular incompetente para proceder ao julgamento dos presentes autos.Nos termos do estabelecido no artigo 32º/1 C P Penal a incompetência do tribunal é do conhecimento e declarada oficiosamente.Pelo exposto, atenta a moldura dos crimes imputados ao arguido e ao disposto nas citadas disposições legais, declaro incompetente este Tribunal singular para julgamento dos presentes autos, cabendo a competência, para o efeito à .ª Vara Criminal do Porto. Notifique. Após trânsito, abra vista a fim de ser levantado conflito negativo de competência. Ambos os despachos transitaram em julgado.Foi suscitado o conflito negativo de competência, pelo Magistrado do MP junto deste último Tribunal.Aqui foi dado cumprimento ao disposto no artigo 36º/2 do C P Penal, ninguém, se tendo pronunciado.Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer, defendendo que a competência deve ser atribuída ao Tribunal Colectivo, pois que no caso, ao concurso de crimes, corresponde a moldura penal abstracta de 10 anos de prisão, no seu limite máximo.Foram colhidos os vistos legais.Foram os autos presentes à conferência.Há que decidir.

II. FundamentaçãoNa interpretação, o argumento literal, não deve ser desprezado e deve-lhe mesmo ser concedido peso decisivo, na tarefa, por vezes árdua, de procurar o sentido da norma querido pelo legislador.O texto é o ponto de partida da interpretação, quando o sentido para que nos remete não seja paradoxal.Por um lado, apresenta-se com uma função negativa:a de eliminação daqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, correspondência ou ressonância nas palavras da lei, e, por outro, com uma função positiva, nos seguintes termos: “primeiro, se o texto comporta apenas um sentido, é esse o sentido da norma – com a ressalva, porém, de se poder concluir com base noutras normas que a redacção do texto atraiçoou o pensamento do legislador; quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto produz-se em dar mais forte apoio a, ou sugerir mais fortemente, um dos sentidos possíveis; e que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita; ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto, nem sempre exacto, de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento”, cfr. João Baptista Machado, in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 12ª reimpressão, 2000, pág. 182.Ora, e no caso, não só se deve eliminar esse outro sentido, por não ter qualquer apoio nas palavras da lei, como, porque o texto da norma comporta apenas aquele afirmado sentido e outras normas se não conhecem que apontem para que o pensamento do legislador se tenha exprimido, digamos deste modo, por defeito.As normas em confronto para a resolução do presente conflito, são as seguintes:artigo 14º C P Penal:nº. 1, compete ao tribunal colectivo, em matéria penal, julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal do júri, respeitarem a crimes previstos no título III e no capítulo I do título V do livro II do C Penal;nº. 2, compete ainda ao tribunal colectivo julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitarem a crimes:alínea a) dolosos ou agravados pelo resultado, quando for elemento do tipo a morte de uma pessoa , ou,alínea b) cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a 5 anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime.Artigo 16º C P Penal:nº 1, compete ao tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que por lei não couberem na competência dos tribunais de outra espécie;nº. 2, compete também a tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que respeitarem a crimes:alínea a) previstos no capítulo II do título V do livro II do C Penal;alínea b) cuja pena máxima, abstractamente aplicável, seja igual ou inferior a 5 anos de prisão;nº. 3, compete ainda ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos no artigo 14º/2 alínea b), mesmo em caso de concurso de infracções, quando o MP, na acusação, ou em requerimento, quando seja superveniente o conhecimento do concurso, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 5 anos.Pela sistematização contida no C P Penal, que não será inocente, podemos concluir que, em termos de competência em matéria penal, o regime legal vigente, estruturou a sua atribuição, pelas várias hipóteses, definindo-as, no artigo 13º, quanto ao tribunal de júri, que ao caso não interessa, no artigo 14º, quanto ao tribunal colectivo e no artigo 16º, quanto ao tribunal singular.Compete, então, ao tribunal colectivo julgar:os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal de júri, respeitarem a crimes previstos no Título III e no capítulo V do Livro II do C Penal, nº.1;os processos que não devendo ser julgados em tribunal singular, respeitarem a crimes,dolosos ou agravados pelo resultado, quando for elemento do tipo a morte de uma pessoa, ou,cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a 5 anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime.No que se reporta à competência do tribunal singular, resulta, então, que lhe compete julgar:os processos que por lei não couberem na competência dos tribunais de outra espécie, júri ou colectivo;os processos que respeitarem a crimes previstos no capítulo II do Título V do Livro II do C Penal;os processos cuja pena máxima, abstractamente aplicável, seja igual ou inferior a 5 anos de prisão;os processos por crimes previstos no artigo 14º/2 alínea b) C Penal, mesmo em caso de concurso de infracções, quando o MP. entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 5 anos.Por sua vez, o artigo 15º dispõe que para o efeito do disposto nos artigos 13º e 14º que definem a competência dos tribunais de júri e colectivo, na determinação da pena abstractamente aplicável são levadas em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo. Donde se tem que levar em consideração, no caso, a circunstância modificativa agravante, que constitui o concurso de crimes, artigo 77º/1 C Penal.Assim, nos termos do referido artigo 15º, não há que atender apenas ao máximo legal da pena a aplicar ao crime, mas ao máximo legal da pena que pode ser aplicada ao arguido no processo. Pois que o mesmo processo pode ter por objecto vários crimes e do concurso de crimes resulta que a pena a aplicar há-de ter como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas a cada um dos crimes, em concurso, artigo 77º/2 C Penal.A competência do tribunal singular surge, então definida, de forma residual. Compete ao tribunal singular julgar todos os processos que não couberem na competência dos tribunais de outra espécie, de júri ou colectivo.As regras sobre a competência, digamos funcional, dos tribunais judiciais, em matéria penal, está definida, em regra, para o caso de unidade criminosa, seja de um único crime, a ser julgado em cada processo. Para o caso de concurso de crimes, regem apenas as regras contidas nos artigos 14º/2 alínea b), 15º e 16º/3, únicas daquele universo, onde a situação está prevista.Assim, da interpretação conjugada destas 3 normas resulta que compete, em caso de concurso, ao tribunal colectivo julgar os processos que respeitem a crimes cuja pena máxima abstractamente aplicável for superior a 5 anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime, salvo se o MP entender que, no caso concreto, não deve ser aplicada pena superior aquela.Isto será assim, o que, de resto, constitui o cerne do suscitado conflito, independentemente de do concurso fazerem parte crimes que, se julgados sozinhos, pelo critério definido no artigo 16º, fossem da competência do tribunal singular, por força do critério qualitativo.Critério este, definido pela espécie do crime, que está na origem do entendimento de que crimes, como o de resistência e coacção a funcionário, inserido no capítulo II do Título V do Livro II do C Penal, dado que a apreensão da prova, neste caso, em regra, não oferece grande dificuldade, devam ser julgados pelo tribunal singular.Ademais diga-se que este crime de resistência, em caso de ser julgado sozinho num processo, em caso de unidade criminosa, portanto, seria da competência do tribunal singular, quer por força do critério qualitativo contido na alínea a) do nº. 2 do artigo 16º, quer por força do critério quantitativo contido na alínea b) da mesma norma.Isto resulta assim, desde sempre, dado que a alínea b), na versão inicial C P Penal, se reportava a processos que respeitassem a crime cuja pena máxima, abstractamente aplicável, fosse igual ou inferior a 3 anos de prisão, o que acontecia no caso, do então denominado crime de coacção de funcionários e de desobediência, cfr. artigos 384º, 385º e 388º C Penal de 1982 e, assim, continuou, depois da alteração introduzida pelo Decreto Lei 317/95 de 28.11, através da qual se estendeu a competência do tribunal singular para o julgamento de crimes puníveis com prisão até 5 anos. Limite que continuou a conter a moldura penal abstracta do crime de resistência e coacção sobre funcionário, que entretanto, passou a estar previsto, por força da Reforma do C Penal operada através do Decreto Lei 48/95 de 15.3, no artigo 347º. Uma vez que o arguido vem acusado pela prática de 2 crimes, em concurso real, de resistência e coacção a funcionário, tipo legal, incluído no capítulo dos crimes contra a autoridade pública, contido no capítulo II do Título V do Livro II do C Penal, correspondendo a cada um, em abstracto, moldura penal, que no seu limite máximo, não ultrapassa os 5 anos de prisão, não tem sentido, não tem qualquer utilidade prática, a invocação do normativo contido na apontada alínea a), pois que mesmo sem a sua existência, por força da alínea b), qualquer deles, de per si, seria conhecido em processo singular.A previsão da alínea a), para os crimes de resistência e de desobediência, é absorvida pela previsão da alínea b) do nº. 2 do artigo 16º.Assim temos que, por força do exposto, em caso de concurso de crimes, no que ao caso interessa, de resistência e coacção a funcionário, o critério para a determinação da competência do tribunal, é apenas e sempre estritamente, quantitativo, por força do estatuído nos artigos 14º/2 alínea b) e 16º/2 alínea b) C P Penal.Constitui regra básica da interpretação, que onde o legislador não distingue não deve o intérprete distinguir. Nenhum fundamento válido, nenhuma razão de ser relevante, nenhum suporte, se perscruta, no texto ou na mente do legislador, para que, como pretende o Sr. Juiz da Vara Criminal, se exclua da previsão contida no artigo 14º/2 alínea b), a situação de concurso real de 2 crimes dos elencados na alínea 16º/2 alínea a).Esta interpretação restritiva desvirtua o sentido da norma e a indicação dada pelo legislador.molduras abstractas correspondentes aos crimes de resistência e de desobediência, para que não sejam tidas em conta, no critério da determinação da competência do tribunal, por decorrência, necessária, Se os crimes da alínea a) do nº. 2 do artigo 16º, estão em relação de concurso real e por isso, são as respectivas molduras individuais, que contribuem para a determinação da pena máxima aplicável, sendo esta que, em última e decisiva análise, determina a competência funcional do tribunal, então estamos caídos no campo de previsão do artigo 14º/2 alínea b) desde que a moldura penal abstracta, do concurso, seja superior a 5 anos de prisão, o que acontece no caso.Isto é, se as molduras penais valem, naturalmente, para a determinação da pena máxima aplicável e se esta é que determina a competência do Tribunal, então aquelas têm, necessariamente, relevância, nesta sede.Assim se dará prevalência ao critério quantitativo, que atende à gravidade da pena aplicável.E no caso o que temos, é que, no actual estado do processo, por força do concurso real de crimes, a moldura penal abstracta tem como limite máximo prisão até 10 anos, sendo certo que o MP não lançou mão do expediente contido no artigo 16º/2 C P Penal, para requerer o julgamento pelo tribunal singular.Por outro lado, a prevalecer a tese do Sr. Juiz do tribunal colectivo, teríamos que no caso, de realização do julgamento pelo tribunal singular, este tribunal que nunca poderia aplicar pena superior a 5 anos de prisão, pois que para tanto lhe falta competência funcional, uma vez que estava já decidida a questão da atribuição da competência, na sequência do suscitado e decidido conflito negativo de competência, que não poderia ser renovado, poderia ser colocado perante a hipótese de ver limitada, excluída mesmo, a aplicação do princípio legal da determinação da pena em função da culpa, se concluísse que a medida da pena ajustada e adequada seria superior a 5 anos de prisão e ver-se-ia, então, na impossibilidade de a fazer aplicar, forçado a aplicar pena inferior, dentro do limite da sua competência funcional.Situação, que ao contrário, com a competência do tribunal colectivo, o que se pode vir a colocar é uma situação de excesso de competência funcional, como de resto, em muitas outras situações.No entanto, segundo a velha regra de que quem pode o mais, pode o menos, quem pode aplicar pena superior a 5 anos, também, pode aplicar pena inferior. Presume-se que quanto mais solene é o tribunal, maiores são as garantias de defesa, donde não haveria prejuízo para o arguido, por ser julgado em tribunal com maior solenidade, cfr. Prof. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, vol. I, 148. Em resumo:na sequência de o MP ter deduzido acusação em processo comum com a intervenção do Tribunal colectivo, imputando ao arguido a prática, em concurso real, de factos, susceptíveis de integrar a previsão do tipo legal de crime de resistência e coacção a funcionário, p. e p. pelo artigo 347º do C Penal, em número de 2, o julgamento não pode deixar de ter lugar pelo tribunal colectivo.Nem se diga, questão de resto, aflorada pelo Sr. Juiz da vara Criminal que o MP não atentou no facto de que sendo o bem jurídico protegido pela incriminação, o da autonomia intencional do Estado, o da liberdade de actuação do Estado contra ataques que a impeçam ou dificultem, não releva o nº. de agentes que no caso são confrontados directamente com a actuação do agente.Com efeito, se é certo que esta actuação das forças de autoridade de reposição da ordem e da legalidade, por norma, não é levada acabo por agentes isolados, antes em conjunto, brigada ou patrulha, por razões óbvias de eficácia e prestígio da autoridade, nada impede, que em determinadas situações possa ocorrer que o visado pela actuação impeditiva do agente seja um agente sozinho, sendo no entanto indiferente para a incriminação, o número de agentes visados em concreto.Existe sempre unidade criminosa, apesar da pluralidade de agentes de autoridade, “desautorizados” pelo agente, cfr. entre muitos outros, AC,s. RE de 19.2.2002, in CJ, I, 278 e STJ de 18.2.2004, in CJ, S, I, 205.Se assim é, inequivocamente, com efeito, o certo é que na acusação pública se entendeu de forma diversa e como refere o Sr. Juiz do Tribunal Criminal, não foi alterada, rectificada a qualificação jurídica constante da acusação, pelo que sendo esta a que subsiste, sendo esta, de resto, única qualificação jurídica feita nos autos, enquanto outra, consolidada não exista, é a ela que nos temos que reportar para decidir sobre os trâmites normais do processo e designadamente sobre a competência do tribunal.
III. Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar incompetente o .º Juízo Criminal da Comarca do Porto, para julgamento do processo em epígrafe identificado, deferindo a competência à .ª Vara Criminal do Porto.
Sem custas.
Comunique e notifique, artigo 36º/5 C P Penal.
Elaborado em computador. Revisto pelo Relator, o 1º signatário.
Porto, 2007.Dezembro.05
Ernesto de Jesus de Deus Nascimento
Olga Maria dos Santos Maurício
Jorge Manuel Miranda Natividade Jacob