quinta-feira, 3 de março de 2011

Crime de Tráfico de Produtos Vitivinícolas

Nota prévia:

Não se imputa um crime de falsificação, pois do que se trata, nesta acusação, no que respeita às declarações de colheita e de produção (cf. Manifesto), é de uso falso de documentos verdadeiros, utilização pelo arguido como seus de documentos que não lhe pertencem, mas que são verdadeiros.

O Código Penal só pune a utilização falsa de documento de identificação (verdadeiro) alheio, designadamente no art. 261º do Código Penal.

Nesta acusação optou-se por indicar o concurso aparente, mas existe jurisprudência a sustentar o concurso efectivo.

Agradecia comentários…

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NUIPC

O Ministério Público acusa em processo comum e para julgamento por tribunal de estrutura singular:

. Luís...,

Porquanto:

No dia 26 de Setembro de 2009, pelas 00h30m, Armando J e João D, Agentes de Fiscalização do Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, I.P. (IVDP) detectaram em circulação, na Estrada Nacional n.º 313, uma viatura pesada de mercadorias, marca “Scania”, matrícula “...-...-MR”, propriedade do arguido e por este conduzida, o qual se encontrava a sair da freguesia de Valdigem, concelho de Lamego, no interior da Região Demarcada dos Vinhos do Douro.

Com efeito, o arguido saiu de Valdigem, entrou no nó de acesso da A24, com direcção a Vila Real, mantendo-se naquela via de circulação até ao nó com o IP4, onde entrou e prosseguiu em direcção a Porto/Amarante.

Aquele transporte de produtos vitivinícolas acabou, desse modo, por entrar na Região Demarcada dos Vinhos Verdes, proveniente da Região Demarcada do Douro.

Após ter circulado sempre no IP4, a viatura ...-...-MR saiu dessa via principal na saída “Amarante Oeste” dirigindo-se para as instalações da Adega Cooperativa de Amarante, onde entrou por volta das 03:00 horas de dia 26.

A viatura do arguido transportava 10 tinas de uvas, sendo que nove acondicionavam uvas tintas e a restante acondicionava uvas brancas, num total de 9.720 Kg de uvas tintas e 720 Kg de uvas brancas.

As uvas transportadas, pertencentes ao arguido, eram destinadas a serem vendidas na Adega Cooperativa de Amarante, como uvas aptas a dar origem a vinho verde.

O transporte daqueles produtos vitícolas não se encontrava titulado pelo obrigatório documento de acompanhamento.

O arguido apenas exibiu uma guia de transporte que, não se encontrando preenchida no campo do local de carga, fazia constar o local de descarga “Amarante”.

O arguido exibiu duas Declarações de Colheita e Produção (DCP), vulgarmente designadas por “Manifesto”, referentes à campanha de 2008/2009 dos produtores Jacinto P e Abel T, com o intuito de convencer os referidos agentes de que tais uvas eram provenientes desses produtores.

Do competente exame pericial efectuado para aferir do tipo de uvas produzidas nos terrenos àqueles pertencentes, qual o potencial de produção existente nessas vinhas e qual o numero de pés de videiras existentes, resulta que:

“- Relativamente ao produtor Abel T, o potencial de produção total deste cifra-se entre 3.250kg e 3.900Kg de uvas brancas e entre 650Kg e 800Kg de uvas tintas. Faz-se notar que os 300Kg de potencial de produção das videiras cujo tipo de produção não foi possível separar, foram inseridos em ambos os tipos de uvas acima referidos.

- No que concerne ao produtor Jacinto P, o potencial de produção total deste cifra-se entre 2000kg e 2500Kg de uvas brancas e entre 400Kg e 500Kg de uvas tintas.” (cf. Relatório Pericial de fls…).

As uvas aptas para dar origem a vinho verde são tituladas no trânsito comercial pelas declarações de colheita e produção relativas a cada um dos produtores, onde são estipuladas as produções máximas autorizadas de uvas aptas para vinho verde.

Os vinhos com direito a denominação de origem, apenas podem ser elaborados com uvas oriundas de vinhas regularmente inscritas na CVRVV pelo que esses produtos de produção primária beneficiam dessa denominação de origem, o que lhes confere um aumento de valor em relação às uvas não certificadas.

As vinhas destinadas à produção de vinho verde carecem de prévia certificação, realizada através da sua inscrição no cadastro da CVRW, requisito sem o qual deixam de possuir a aptidão para dar origem a vinho verde.

O arguido agiu de forma livre e com o propósito concretizado de introduzir na região demarcada dos vinhos verdes produtos vitivinícolas, não certificados, provenientes da região dos vinhos do Douro, com intenção de os vender como se fossem originários da região que não da sua proveniência, com o que pretendia, assim, aproveitar-se desse modo da mais-valia de que os produtos dessa natureza e proveniência beneficiam em termos económicos.

Bem sabia o arguido que a comercialização de uvas aptas para dar origem a vinhos de região demarcada, sendo titulada pelas respectivas declarações de colheita e produção, não é possível sem a apresentação nas respectivas adegas desses documentos.

Ao actuar da forma supra descrita, agiu ainda o arguido com a intenção de fazer crer a outrem que os produtos vitivinícolas referidos - os quais se destinavam a ser vendidos e postos em circulação no mercado – possuíam natureza e qualidade diferente da que afirmava possuir, fazendo-os passar por autênticos, utilizando para o efeito tais declarações, o que bem sabia, representou.

Agiu o arguido de forma livre ao utilizar tais declarações de colheita e de produção, verdadeiras, como se fossem respeitantes às uvas que transportava, bem sabendo que assim criava a falsa convicção a respeito da proveniência de tais uvas.

Sabia ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

Cometeu assim o arguido, em autoria material:

. Um crime de tráfico de produtos vitivinícolas, sob a forma tentada, p. e p. pelos arts. 22º, 23º, n.º 1, ambos do Código Penal, e art. 9.º, n.ºs 1, 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 213/2004, de 23 de Agosto, punido ainda com a pena acessória prevista no artigo 10º, al. b) do mesmo diploma legal; e, em concurso aparente com este último crime,

. Um crime de fraude sobre mercadorias, sob a forma consumada, p. e p. pelo art. 23º, n.º 1, al. b), e 3, ambos do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, na redacção do Decreto-Lei n.º 20/99, de 28.01.

Requer-se a declaração de perdimento a favor do Estado da mercadoria apreendida, nos termos do art. 9º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 213/2004, de 23 de Agosto, e 109º, n.º 1, do Código Penal, porquanto se trata de mercadoria sem os requisitos legais.

Requer-se ainda a declaração de perdimento a favor do Estado do veículo apreendido, nos termos do referido dispositivo legal, porquanto só a sua utilização permitiu o transporte de daquela mercadoria e existe manifesto perigo de que volte a ser utilizado para tal tipo de transporte, atenta a quantidade em causa, a adequação do veículo a tal tipo de carga, e o conhecimento pelo arguido dos mecanismos e trajectos necessários à prática de tal actividade.

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Prova:

- Documental:

(...)

- Pericial:

(...)

- Testemunhal:

(...)

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Medidas de coacção:

(...)

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Defensor:

(...)

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Notificações:

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Local/ data

O Procurador-Adjunto