segunda-feira, 6 de outubro de 2008

ABERTURA DE INSTRUÇÃO

Acórdão da Relação do Porto, de 24-09-2008
Processo: 0813559
JTRP00041653
Relator: ANDRÉ DA SILVA
RP200809240813559

Sumário:
Não é de admitir a abertura de instrução, a requerimento do arguido, apenas para este discutir a qualificação jurídica dos factos que lhe são imputados, uma vez que o mesmo tem ao seu dispor um meio adequado e eficaz para o conseguir: a contestação, regulada no art. 315º do C. P. Penal.


TEXTO PARCIAL:

“…Diz o art.º 286º do CPP: “1 – A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.2 – A instrução tem carácter facultativo. 3 – Não há lugar a instrução nas formas de processo especiais”.

Como ficou referido inicialmente o M.ºP.º acusou o arguido por um crime de roubo. O recorrente requereu à abertura da instrução porque entende que os factos descritos na acusação consubstanciam a prática de um crime de ofensa à integridade física e o Tribunal indeferiu com o fundamento de que a pretensão não está abrangida nesta fase processual considerando o requerimento legalmente inadmissível e rejeitou a instrução.

Como é sabido a instrução visa uma comprovação judicial de uma decisão (acusação ou arquivamento). O arguido com o requerimento para a abertura de instrução pretende apenas discutir a qualificação jurídica dos factos, factos que aceita.

Aceita-se que o arguido possa requerer a abertura da instrução com o objectivo de ver alterada a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação mas tal não justifica a admissibilidade da instrução no caso em apreço pois apenas é admissível a abertura de instrução para debate exclusivo de questões de direito quando o arguido pretenda obter uma decisão de não pronúncia.

Assim acontece por exemplo quando o arguido põe em causa a legitimidade processual do M.ºP.º para abrir inquérito ou proferir acusação ou quando entenda que a acusação está ferida de nulidade ou é manifestamente infundada mas não quando apenas pretende que os factos de que foi acusado sejam subsumidos a um tipo de ilícito criminal diferente.

E como refere o Exm.º Magistrado do M.ºP.º fls. 23 destes autos “a decisão que pronuncia o arguido não visa fixar a qualificação jurídica dos factos, mas sim definir o objecto do julgamento – a diferente qualificação jurídica dos factos que eventualmente viesse a ser perfilhada na decisão instrutória a proferi no presente processo seria transitória, na medida em que o juiz competente para o julgamento não estaria vinculado a tal qualificação – com efeito, uma nova alteração do enquadramento normativo da factualidade provada tem apenas como consequência permitir ao arguido requerer mais tempo para preparar a sua defesa, conforme resulta da conjugação dos n.ºs 1 e 3 do artigo 358º do Código de Processo Penal; A discussão do enquadramento normativo dos factos de que o arguido é acusado, em sede de instrução, significaria um debate antecipado daquilo que é o cerne do conhecimento do mérito da causa e que é a função do julgador; A pretensão do arguido pode ser alcançada durante a fase de julgamento e este dispõe de um meio adequado e eficaz para a conseguir – a contestação, regulada no artigo 315º do Código de Processo Penal”.

Resumindo e concluindo: a abertura de instrução para discutir exclusivamente questões de direito apenas é admissível quando o arguido pretenda uma decisão de não pronúncia; ora, no caso concreto o arguido não questiona os factos descritos na acusação, até os aceita, pretendendo apenas uma subsunção jurídico-penal diferente. Tal e como se diz no despacho recorrido é inadmissível ao abrigo do disposto no art.º 287º, n.º 3 do CPP.

III
Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao recurso mantendo o despacho recorrido.
Condena-se o recorrente em 4 UC de taxa de justiça.
Porto, 24 de Setembro de 2008

Luís Dias André da Silva
Francisco Marcolino de Jesus”