sábado, 28 de março de 2009

Acusação Particular: prescrição do procedimento criminal

Tribunal da Relação de Lisboa, Acórdão 6 Fevereiro 2009
Relator: Carlos Manuel Rodrigues de Almeida
Processo: 2748/05-4

Sumário:

Não interrompe a contagem do prazo de prescrição do crime de calúnia a notificação ao arguido da acusação particular desacompanhada pelo Ministério Público, não traduzindo essa notificação a vontade do Estado, como intérprete das exigências comunitária. Se desde a data da eventual prática de cada um dos crimes já decorreram três anos, encontra-se extinto, por prescrição, o procedimento criminal. Texto

DECISÃO SUMÁRIA

I - RELATÓRIO

1 - O assistente B, no termo da fase de inquérito, depois de para tanto ter sido notificado, deduziu acusação contra o arguido A na qual imputou a este a prática, no dia 3 de Agosto de 2005 (ou, eventualmente, também no dia 8 desse mesmo mês e ano), de um crime ou de crimes de calúnia(1), conduta p. e p. pelo artigo 180.º, n.º 1, e 183.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal (fls. 89 a 92).

O Ministério Público não acompanhou essa acusação (fls. 94 a 96).

Tendo o processo sido distribuído ao 2.º Juízo Criminal de Sintra, o sr. juiz proferiu, no dia 27 de Julho de 2007, um despacho em que rejeitou a acusação deduzida (fls. 110 a 113).

2 - No dia 20 de Fevereiro de 2008, o assistente interpôs recurso desse despacho (fls. 132 a 141).

3 - No dia 8 de Julho de 2008, o Ministério Público respondeu à motivação apresentada defendendo a improcedência do recurso (fls. 147).

4 - Esse recurso foi admitido no dia 15 de Julho de 2008 (fls. 148), tendo sido remetido a este tribunal no dia 23 de Janeiro de 2009.

5 - A Sr.ª procuradora-geral-adjunta teve vista nos autos.

II - FUNDAMENTAÇÃO

6 - Uma vez que, ao serem analisados os autos, se verificou que existia uma causa de extinção do procedimento criminal que impedia a apreciação do recurso interposto, há que proferir, nos termos da alínea c) do n.º 6 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, decisão sumária.

7 - O assistente, como se disse, imputou ao arguido a prática, no dia 3 e, eventualmente, no dia 8 de Agosto de 2005, de factos que, de acordo com a acusação particular, integrariam, no máximo, tendo em conta as normas transcritas, dois crimes de calúnia.

Se essas calúnias representassem a agravação de crimes de difamação, a pena máxima aplicável a cada um desses crimes seria a de 40 dias a 8 meses de prisão ou a de 13 a 320 dias de multa (artigos 180.º, n.º 1, e 183.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal).

Tendo em conta a medida abstracta das penas referidas, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de 2 anos [alínea d) do n.º 1 do artigo 118.º do Código Penal].

Tal prazo, uma vez que o assistente se encontrava presente na data da prática dos factos, conta-se desde cada um desses dias (artigo 119.º, n.º 1).

Apenas interrompeu a contagem desse prazo a constituição de arguido [alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º], que ocorreu no dia 23 de Fevereiro de 2007 (fls. 57).

Não se verificou qualquer outra causa de interrupção, nem existe qualquer causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal.

Não tem, nomeadamente, essa relevância e esses efeitos a notificação ao arguido da acusação particular uma vez que o Ministério Público decidiu não a acompanhar, não traduzindo essa notificação a vontade do «Estado, como intérprete das exigências comunitárias», de «efectivar, no caso, o seu jus puniendi»(2).

Uma vez que desde a data da prática de cada um dos eventuais crimes já decorreu o prazo da prescrição acrescido de metade (n.º 3 do artigo 121.º), ou seja, já decorreram 3 anos, encontra-se extinto, por prescrição, o procedimento criminal.

Por isso, não pode este tribunal apreciar o objecto do recurso interposto pelo assistente.


 


 

III - DISPOSITIVO

Face ao exposto, atento o disposto no artigo 417.º, n.º 6, do Código de Processo Penal revisto, decido não apreciar o recurso interposto pelo assistente B por se encontrar extinto, por prescrição, o procedimento criminal pela prática dos crimes por ele imputados ao arguido.

Sem custas.

²

Lisboa, 6 de Fevereiro de 2009(Carlos Rodrigues de Almeida)

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(1) Qualificação que, ao certo, se desconhece porquanto o assistente se limitou a transcrever alguns dos números dos artigos 180.º, 181.º e 183.º do Código Penal, sem precisar quantos crimes imputava ao arguido e qual a sua qualificação jurídica. voltar ao texto


 


 

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(2) DIAS, Jorge de Figueiredo, in «Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime», Aequitas, Lisboa, 1993, p. 708 e 709. voltar ao texto