sexta-feira, 18 de julho de 2008

CONTRA-ORDENAÇÃO/APREENSÃO/IMPUGNAÇÃO

Acórdãos TRP Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo: 0813407
Nº Convencional: JTRP00041546
Relator: LUÍS TEIXEIRA
Nº do Documento: RP200807140813407
Data do Acordão: 14-07-2008

Sumário:
A impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa que determina a apreensão de objectos só deve ser apreciada com a impugnação da decisão final.

Decisão Texto Integral: Recurso nº 3407/08-1.1ª Secção Criminal.Processo nº ../08.5TPPRT.
I
Arguida: B………., Ldª., melhor id. nos autos.Recorrente: Ministério Público.
1. No decurso do processo de contra-ordenação nº ../08.5TPPRT, procedeu-se à apreensão de vários objectos conforme teor do auto de apreensão de fls. 8 e seguintes, datado de 29 de Janeiro de 2008.
2. Em 18 de Fevereiro deste ano, a arguida impugnou judicialmente esta apreensão através do seu requerimento de fls. 19 e ss., requerendo a final, que seja ordenada a restituição de todo o material apreendido e declarada a sua apreensão ilegal e insubsistente.
3. Por despacho judicial de fls. 73 e 74, foi o recurso admitido mas com subida apenas a final.
4. Deste não conhecimento imediato do recurso recorreu o Ministério Público - v. fls. 79 a 83 -, formulando as seguintes conclusões:
4.1. A situação dos autos cai no âmbito específico dos artigos 48º-A, 83º e 85º, todos do RGCO.
4.2. Este processo de impugnação judicial deverá correr em separado e nos termos do artigo 59º do RGCO, entendimento que resulta da 2ª parte do artigo 85º daquele diploma bem como dos artigos 178º, nºs 6 e 7 e 68º, nº 5, estes do Código de Processo Penal.
4.3. Não se descortinam argumentos válidos para deixar de apreciar de imediato e em separado quer a suscitada questão da legalidade da apreensão quer o pedido de restituição dos objectos apreendidos.
4.4. Pelo que deve ser revogada a decisão de não apreciação do recurso e substituída por outra que conclua pela oportunidade da sua apreciação imediata.
5. Este recurso foi admitido.
6. Nesta instância, o Exmº Sr. Procurador-geral Adjunto emitiu douto parecer no qual defende que o recurso não deve proceder, não pelos fundamentos do despacho recorrido, ou seja, por se tratar de recurso interlocutório que só deve subir a final, mas sim por se estar perante um recurso inadmissível.
7. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II
1. Conforme resulta da exposição sucinta feita sobre os elementos processuais, são três as posições sobre a problemática da impugnação da apreensão dos objectos pela arguida.
a. Não admissibilidade da mesma - posição do Exmº Sr. Procurador-geral Adjunto.
b. Admissão da impugnação mas com apreciação só a final, se for caso disso - posição do Sr. Juiz a quo.
c. Admissão da impugnação e conhecimento imediato da mesma, em separado - posição do Ministério Público em 1ª instância e que determinou o presente recurso.
2. Vejamos:
Pegando no teor do DL nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), afigura-se-nos ser de concluir o seguinte, em matéria de impugnação judicial e recursos:
2.1. Temos, por um lado, decisões, despachos e demais medidas tomadas no decurso do processo pela autoridade competente para o dirigir e que são susceptíveis de impugnação nos termos do artigo 55º, do RGCO[1].A competência para apreciar esta impugnação é do tribunal de comarca onde se tiver consumado a infracção, que decide em última instância - nº 3 do citado artigo 55º e 61º, nº 1, do mesmo diploma.
2.2. E temos, por outro lado, a impugnação da decisão que aplicar uma coima/ sanção acessória - artigos 58º e 59º, nº 1, do RGCO.A competência para apreciar este recurso de impugnação continua a ser do tribunal de comarca - 61º, nº 1, do RGCO -.Contudo, agora este tribunal não decide em última instância.Esta decisão do tribunal de 1ª instância, é susceptível de recurso para o Tribunal da Relação, nos termos do disposto no artigo 73º, do RGCO.O recurso será admissível se a coima aplicada for superior a 249,40 euros ou se a condenação abranger sanção acessória - alíneas a) e b), do nº 1, daquele preceito.
3. A questão suscitada nos autos não se integra em nenhuma destas situações.Tratando-se de uma apreensão de objectos ou bens, a mesma cai no âmbito do artigo 83º do RGCO.Prevê o artigo 48º-A deste diploma, a possibilidade de, durante o processo de contra-ordenação, serem apreendidos objectos pela autoridade administrativa que serviram ou estavam destinados a servir para a prática do ilícito contra-ordenacional ou que por esta foram produzidos bem como os que forem susceptíveis de servir de prova.Ainda nos termos desta disposição, nº 2, os objectos são restituídos logo que se tornar desnecessário manter a apreensão para efeitos de prova, a menos que a autoridade administrativa pretenda declará-los perdidos. E, na verdade, esta perda é possível desde que se verifiquem os necessários pressupostos determinantes da perda[2] - artigos 21º, nº 1, alínea a) e 21º-A, nº 1, do RGCO -, a qual reveste a natureza de sanção acessória.
3.1. E como sanção acessória que é, desde que haja declaração de perda, deve a mesma constar da decisão final - artigo 58º, nº 1, alínea d), do RGCO -, que poderá ser impugnada nos termos dos artigo 59º, nº 1, 61º e 73º, nº 1, alíneas a) e b), do mesmo diploma.O que significa que esta impugnação é feita em simultâneo com a decisão de aplicação de coima.
3.2. Mandando o artigo 85º do RGCO aplicar à impugnação da apreensão de objectos o mesmo regime ou regras da impugnação da sua perda, significa que a impugnação da arguida B………., Ldª só deve ser apreciada com a decisão final.Decisão que pode ser quer de condenação em coima com perda de objectos, quer de condenação em coima sem perda de objectos. Situação em que, se entretanto estes tiverem sido apreendidos durante a instrução, serão restituídos logo que a decisão se torne definitiva - artigo 48º-A, nº 3, do RGCO.E mesmo nesta situação[3], a impugnação tanto pode abranger só a aplicação da coima, como a aplicação desta e a apreensão dos objectos, ainda que não declarados perdidos. É que pode justificar-se um interesse da recorrente na impugnação, nomeadamente para efeitos de avaliar potenciais prejuízos emergentes da apreensão e consequente indemnização.
4. Nos presentes autos de contra-ordenação, tendo já havido apreensão de objectos e impugnação desta apreensão, esta apenas deverá ser apreciada com a eventual impugnação que vier a ser deduzida da decisão final da autoridade administrativa.
III
Decisão
Por todo o exposto, nega-se provimento ao recurso.Sem custas.
Porto, 14/07/2008
Luís Augusto Teixeira
José Alberto Vaz Carreto
_______________________
[1] V. nomeadamente a medida cautelar de suspensão do exercício da actividade de estabelecimento, a que se reportam os acs. deste Tribunal da Relação do Porto de 9.4.2008 e 23.4.2008, proferidos nos processos 0811019 e 0840657, respectivamente, podendo ser consultados em http://www.dgsi.pt.jtrp/.
[2] Quando os objectos serviram ou estavam destinados a servir para a prática de uma contra-ordenação ou por esta via foram produzidos - nº 1, do artigo 21º-A, do RGCO.
[3] Condenação em coima sem que haja perda de objectos entretanto já apreendidos.