terça-feira, 8 de abril de 2008

Acusação – Crime ( sexual ) Continuado


Inquérito n.º


O Ministério Público acusa em processo comum e para julgamento por tribunal de estrutura singular, ao abrigo do disposto no artigo 16.º, n.º 3, do Código de Processo Penal:

J …, residente …


porquanto:

No dia 11 de Novembro de 2007, em hora não concretamente apurada, de noite, na festa de S. Martinho, em …, o arguido conheceu a menor Berta …, à data com treze anos de idade (nasceu no dia 6 de Outubro de 1994) e trocaram números de telemóvel.

No dia 24 de Novembro de 2007, perto da praia, em …, o arguido encontrou a menor Berta…, ficaram a conversar cerca de 30 minutos e combinaram um novo encontro no dia seguinte.

No dia 25 de Novembro de 2007, na sequência do acordado no dia anterior, o arguido e a menor Berta... passearam junto à beira-mar, em Buarcos, Figueira da Foz, e beijaram-se na boca, com introdução da língua na boca um do outro.

No dia 1 de Dezembro de 2007, o arguido e a menor Berta… encontraram-se em …, passearam juntos, acariciaram-se, beijaram-se na boca, com introdução da língua na boca um do outro, e conversaram sobre a possibilidade de virem a ter relações sexuais.

No dia 2 de Dezembro de 2007, o arguido, no seguimento da conversa mantida no dia anterior com a menor Berta …, aguardou que a sua mãe se deslocasse ao cabeleireiro, pediu-lhe as chaves do seu apartamento, sito na rua …, em …, e ali se encontrou com a menor, por volta das 14 horas.

Depois de ter mostrado o apartamento à menor, de ter colocado música e de ter passeado na varanda, o arguido beijou a menor na boca, com introdução da língua na boca um do outro, deitou-a num sofá da sala, acariciou-lhe os seios e despiu-lhe as calças e as cuecas.

De seguida, o arguido despiu as suas calças e cuecas e, posicionado por cima da menor, introduziu o pénis erecto na vagina da menor, mantendo com ela relações sexuais de cópula, sem ejaculação e sem utilização de preservativo.

No mesmo dia 2 de Dezembro de 2007, pelas 21 horas, o arguido enviou uma mensagem para o telemóvel da menor Berta … na qual escreveu "já dormes não gostaste eu adorei amo-te".

Até àquela data, a menor nunca tinha mantido relações sexuais com nenhum homem e apresentava, em 18 Dezembro de 2007, hímen complacente, com ostíolo himeneal permeável aos dedos indicador e médio justapostos.

Em Dezembro de 2007, a menor Berta … tinha uma idade aparente de harmonia com a idade civil.

O arguido tem uma filha menor, que tinha oito anos à data dos factos, pelo que é conhecedor da desenvoltura feminina das mulheres pré-adolescentes.

Sabia, portanto, o arguido que a Berta... era menor e que tinha a idade de treze anos.

As condutas do arguido acima descritas, praticadas nos dias 24 e 25 de Novembro e 1 e 2 de Dezembro de 2007, são idênticas, pese embora com graus de intensidade diferentes, designadamente a manutenção de um relacionamento amoroso com a menor Berta …, que se inicia com troca de beijos e termina com uma relação sexual de cópula.

A menor Berta … mostrou-se interessada e colaborante com o arguido e mostrou disponibilidade para beijar o arguido na boca, com introdução da língua na boca um do outro, ser por ele acariciada nos seios e com ele manter relações sexuais de cópula.

O arguido actuou, então, de forma homogénea e no contexto de uma mesma solicitação exterior.

O arguido agiu sempre de forma livre e com o propósito concretizado de praticar actos sexuais de relevo, incluindo um acto sexual de cópula, com uma menor de treze anos de idade, bem sabendo ainda que punha em causa o livre desenvolvimento da personalidade da menor na esfera sexual.

O arguido sabia também serem as suas condutas proibidas e punidas por lei penal.

Cometeu, pelo exposto, em autoria material, sob a forma consumada:


- um crime de abuso sexual de crianças, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 171.º, nºs 1 e 2, com referência ao artigo 30.º, nºs 2 e 3, do Código Penal.

*


Artigo 16.º, n.º 3, do Código de Processo Penal

O arguido J… é acusado da prática de uma crime continuado de abuso sexual de crianças, punível com pena de prisão de três a dez anos.

Porém, pese embora a moldura penal aplicável ao crime praticado pelo arguido, que demandaria, por força do disposto no artigo 14°, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal, a competência do Tribunal Colectivo, estamos em crer que não lhe será, em concreto, de aplicar pena de prisão superior a cinco anos.

Com efeito, a menor Berta … já tinha 13 anos à data dos factos e mostrou disponibilidade para o relacionamento com o arguido, colaborando nos beijos, carícias e relações sexuais.

Acresce que do certificado do registo criminal do arguido (fls. 68), nada consta e apenas há notícia que terá sido condenado pela prática de um crime de furto, portanto pela prática de um crime cujo bem jurídico protegido não se assemelha aquele que o legislador visou proteger com o ilícito criminal previsto e punido pelo artigo 171º, nºs 1 e 2, do Código Penal, pelo qual vai acusado.

Não se olvidará, por outro lado, que o arguido se encontra familiar e profissionalmente inserido, residindo com a sua mãe e irmã e exercendo a profissão de ...

O circunstancialismo referido permite considerar que a pena a aplicar ao arguido não deverá exceder o limite de cinco anos de prisão.

Fica, pois, condicionada a moldura abstracta aplicável ao ilícito criminal imputado ao arguido, razão pela qual se decide lançar mão da faculdade prevista no artigo 16°, n.º 3, do Código de Processo Penal e introduzir os factos em juízo para serem julgados perante o Tribunal Singular.

*


Prova:

  1. Documental:
    1. Certidão de nascimento de Berta … (fls. 33);

  2. Pericial:
    1. Relatório de perícia de natureza sexual em direito penal (fls. 37 a 40); e
    2. Auto de exame directo (fls. 41 a 43);

  3. Testemunhal

    - …

  4. Declarações para memória futura de Berta…, a fls. 84, 85 e 103 a 153

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Medidas de coacção:

(…)

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Como defensor oficioso do arguido J… mantém-se o Dr. …, nomeado a fls. 51.

Comunique a nomeação ao Conselho Distrital da Ordem dos Advogados (artigo 3.º, n.º 3, da Portaria n.º 10/2008, de 3 de Janeiro).

*

Notifique o arguido da acusação pública ora deduzida, através de via postal simples (artigos 277.º, n.º 3, ex vi do 283º, nºs 5 e 6 do Código de Processo Penal, com referência ao artigo 113.º, nºs 1, al. c) e 3, do mesmo diploma).

Informe o arguido que, querendo, poderá requerer a abertura da instrução, no prazo de 20 dias, nos termos do disposto no artigo 287.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Penal.

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Notifique o Ilustre Defensor nomeado da acusação pública ora deduzida, através de via postal registada (artigos 277.º, n.º 3, ex vi do 283º, nºs 5 e 6 do Código de Processo Penal, com referência ao artigo 113.º, nºs 1, al. b) e 2, do mesmo diploma).

*

Notifique Maria … (id. a fls. 3), em representação de Berta …, da acusação pública ora deduzida, nos termos dos artigos 277º, n.º 3 ex vi do 283º, n.º 5, do Código de Processo Penal

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Comunique ao Exmo. Sr. Procurador da República, de acordo com a Directiva n.º 1/2002, publicada no DR de 04.04.2002 (Circular n.º 6/2002 PGR), Ponto VI, n.º 3, a aplicação do artigo 16º, n.º 3, do Código de Processo Penal nos presentes autos.


Processei, imprimi, revi e assinei o texto, seguindo os versos em branco (artigo 94.º, n.º 2, Código de Processo Penal)


Local/Data

O Procurador-Adjunto




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